segunda-feira, 8 de dezembro de 2025

RJIES Parte 6 - Do Conselho Científico

 





Contributo submetido à Assembleia da República no âmbito da consulta pública da Proposta de Lei n.º 30/XVII/1.ª, apresentada pelo Governo, que altera, entre outros, o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior.
Do Conselho Científico
64. O Artigo 80.º da Proposta dispõe que as instituições que ministrem simultaneamente ensino universitário e politécnico e que não estejam organizadas em faculdades, institutos ou escolas, devem dispor de um conselho científico e de um conselho pedagógico da própria instituição.
65. No entanto, no Artigo 102.º da Proposta, sobre a Composição do Conselho Científico, apenas são detalhadas as composições de instituições de ensino superior de natureza universitária e de instituições de ensino superior de natureza politécnica, que apresentam algumas diferenças.
66. Deste modo, a Composição do Conselho Científico das instituições híbridas que não se organizem de acordo com o modelo tradicional de faculdades e escolas, não se encontra coberta pela Proposta.

domingo, 7 de dezembro de 2025

RJIES Parte 5 - Dos Planos

 






Contributo submetido à Assembleia da República no âmbito da consulta pública da Proposta de Lei n.º 30/XVII/1.ª, apresentada pelo Governo, que altera, entre outros, o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior.
Dos Planos
61. O processo de eleição do reitor implica a apresentação de um programa de ação.
62. Nos termos do Artigo 82.º da Proposta, compete ao Conselho Geral, sob proposta do Reitor, aprovar os planos estratégicos de médio prazo e o plano de ação para o quadriénio do mandato do Reitor, que devem ser sustentados por projeções financeiras.
63. É assim possível que o Reitor, eleito com um programa de ação sufragado pela comunidade de forma alargada, veja os seus planos estratégicos e programa não serem aprovados pelo Conselho Geral, órgão muito menos representativo e com elementos externos à comunidade.

sábado, 6 de dezembro de 2025

RJIES Parte 4 - Do Reitor e da Equipa Reitoral

Contributo submetido à Assembleia da República no âmbito da consulta pública da Proposta de Lei n.º 30/XVII/1.ª, apresentada pelo Governo, que altera, entre outros, o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior.
Do Reitor e da Equipa Reitoral
53. No Artigo 86.º da Proposta propõe-se que o Reitor possa ser eleito em nome individual ou como líder da equipa, acrescentando esta última possibilidade à redação da Lei em vigor.
54. Discorda-se, em absoluto, desta nova formulação: o órgão de Governo consagrado na Lei, e na Proposta, é o Reitor e, por conseguinte, é o Reitor e apenas o Reitor que é objeto de eleição.
55. Naturalmente, nada impede os candidatos a Reitor de apresentarem uma equipa, em conjunto com o seu programa, e que tal equipa, ou a sua ausência, seja objeto de avaliação pelos eleitores.
56. Não se concedendo quanto à questão de princípio, coloca-se também o problema da recomposição da equipa Reitoral.
57. Por um lado, a exoneração de vice-reitores continua a poder ser efetuada a todo o tempo pelo Reitor, conforme o Artigo 88.º da Proposta.
58. No entanto, o mesmo Artigo dispõe que um Reitor eleito em nome individual pode nomear livremente os Vice-Reitores, o que parece indicar, a contrario, que não terá tal faculdade quando eleito com uma equipa.
59. Será que se pretende, neste caso, que qualquer nova nomeação careça de novo sufrágio, o que seria absurdo. Ou que um Reitor eleito em equipa não possa nomear novos Vice-Reitores?
60. A Proposta, neste domínio, é desprovida de coerência quanto ao objeto da eleição e suscetível de comprometer as dinâmicas de governação e o funcionamento institucional.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

RJIES Parte 3 - Da eleição do Reitor

 
Contributo submetido à Assembleia da República no âmbito da consulta pública da Proposta de Lei n.º 30/XVII/1.ª, apresentada pelo Governo, que altera, entre outros, o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior.
Da Eleição do Reitor 
29. Como já referido, e em "prol da representatividade", a Proposta propõe, no Artigo 86.º, um modelo de eleição do Reitor por plebiscito ponderado a efetuar no seio da respetiva comunidade. 
30. A Proposta abandona, assim, o modelo executivo de eleição por um Conselho Geral reduzido e com participação de membros externos, e o paralelismo, feito à data da Lei ainda em vigor, entre modelos de gestão empresarial e de instituições de ensino superior. 
31. A Proposta não retoma a eleição do Reitor por uma Assembleia alargada, como a consagrada na Lei da Autonomia de 1988, nem por qualquer outro órgão, já existente ou a criar, e também não prevê a participação de entidades ou personalidades externas neste processo, como uma representação de partes da sociedade interessadas na instituição. 
32. É sobejamente reconhecido e documentado que o modelo atual de eleição do Reitor pelo Conselho Geral conduziu e continua a conduzir, em muitas instituições, à instrumentalização e ao enfraquecimento dos Conselhos Gerais por candidatos a Reitor, sempre que, eles próprios, dinamizam listas para esse órgão, com o intuito de assegurar a sua eleição.
33. Esta situação não ocorre porque o quadro legal a isso obrigue, mas porque os principais atores deliberadamente o procuram, e as respetivas comunidades, quanto mais não seja por omissão, o permitem.
34. Não estranha, assim, que o processo de eleição do Reitor seja um tema permanente de debate e, consequentemente, que a Proposta vise a sua alteração.
35. De acordo com a Proposta, a eleição do Reitor é efetuada pelos docentes e investigadores de carreira da instituição, pelos estudantes, pelo pessoal técnico, especialista e de gestão e pelos antigos estudantes com direito a voto.
36. Esta enumeração encerra diversos cambiantes, como o facto de, no caso dos docentes e investigadores, apenas se considerarem os de carreira; no caso dos estudantes ou do restante do pessoal, parece não haver qualquer restrição; e, no caso dos antigos estudantes, o direito a voto estar sujeito a diversas condicionantes.
37. Como já referido na secção sobre a Comunidade, discorda-se da inclusão dos antigos estudantes no processo de eleição do Reitor.
38. Sem conceder, neste aspeto de princípio, a Proposta apresenta profundas incoerências, aspetos de difícil justificação e problemas de operacionalização.
39. Assim, nos termos da Proposta, têm direito de voto “os antigos estudantes que tenham obtido, há mais de cinco anos, pelo menos um grau académico nessa instituição de ensino superior e que nela não estejam matriculados e inscritos nem detenham relação contratual com a mesma.”
40. Daqui resulta que, afinal, o direito de voto não será detido pelos antigos estudantes, no seu todo, como induz a Exposição de Motivos, mas apenas por alguns e, por conseguinte, usando os termos da mesma exposição, uns farão parte da comunidade, outros não.
41. Em primeiro lugar, o eventual direito de voto está condicionado aos cursos que frequentaram, sendo concedido apenas a estudantes que frequentaram cursos conferentes de grau académico.
42. Em segundo lugar, o direito de voto está condicionado a uma condição de sucesso, requerendo a obtenção do grau académico, e não apenas a frequência de um curso conferente de grau, independentemente da duração da relação com a instituição.
43. Em terceiro lugar, o direito de voto está limitado por um período de nojo arbitrário, sendo concedido apenas cinco anos após a obtenção do grau, exigindo, afinal, um afastamento da comunidade para que seja reconhecido como membro eleitor nessa mesma comunidade!
44. Numa quarta nota, ao invés do que sucede com os restantes corpos, os antigos estudantes que tenham direito de voto, têm-no vitaliciamente, tendo por conseguinte maior direito de participação na vida institucional, ainda que só tenham tido uma relação de dois anos para a obtenção do grau de mestre, do que qualquer trabalhador da instituição, até dos que nela trabalham durante décadas.
45. Vejam-se alguns exemplos propiciados pela redação da Proposta.
46. Como referido, um estudante que obteve o grau de mestre ao fim de dois anos, pode votar vitaliciamente na eleição para Reitor, exceto nos primeiros cinco anos após a obtenção do grau.
47. Um estudante que frequentou uma universidade por quatro anos, mas abandonou os estudos e foi trabalhar, não pode votar. 
48. Um estudante com licenciatura por uma universidade, mestrado por outra e doutoramento por uma terceira poderá participar nos atos eleitorais em três situações distintas.
49. Situação semelhante, imagino, para um estudante que tenha obtido um grau conjunto, concedido por várias instituições.
50. Licenciei-me em 1987. Supondo que nunca mais tivesse tido qualquer relação com a instituição onde obtive o grau, ainda assim teria direito a votar, hoje e para o resto da minha vida.
51. Tudo isto parece desprovido de sentido, e fica por sustentar a razão de fundo que sustenta tal proposta.
52. Poderia ainda adicionar um outro nível de complexidade, a organização de um processo eleitoral que, em várias instituições abrangerá certamente centenas de milhares de estudantes, desde o próximo de localização e recenseamento de todos os antigos estudantes, bem como da organização de todos os passos do processo eleitoral que garantam uma efetiva participação e votação, a partir de qualquer ponto do globo.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

RJIES Parte 2 - Do sistema binário

 
Contributo submetido à Assembleia da República no âmbito da consulta pública da Proposta de Lei n.º 30/XVII/1.ª, apresentada pelo Governo, que altera, entre outros, o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior.
Do sistema binário
10. A Proposta define, no n.º 2 do Artigo 2.º, a missão das instituições de ensino superior de forma unitária, sem introduzir qualquer diferença entre a missão das instituições do subsistema universitário e as do subsistema politécnico.
11. No Artigo 3.º, a Proposta estabelece o caráter binário do sistema de ensino superior, definido ao nível institucional: um sistema com dois tipos de instituições, umas de natureza universitária, outras de natureza politécnica.
12. Mantém-se assim a retórica em favor de um sistema dito binário, frequentemente alvo de elogio pela generalidade dos atores do sistema, embora se reclame, simultaneamente, o seu aprofundamento ou aperfeiçoamento, a diversificação das missões e a diferenciação institucional. 
13. A verdade é que a evolução do sistema esbateu já, há muito, as diferenças próprias de um sistema que fosse, de facto, binário, retirando sentido a esta qualificação, num processo que se tem acentuado.
14. Observe-se o sistema de ensino superior público em Portugal.
15. Ao nível da formação de primeiro ciclo, há inúmeros programas de estudo com a mesma designação no ensino universitário e no ensino politécnico, nos mais variados domínios: Administração Pública, Agronomia, Animação Sociocultural, Artes Plásticas, Bioengenharia, Biotecnologia, Ciências e Tecnologias do Ambiente, Conservação e Restauro, Contabilidade, Design. E isto só até à letra D! Todo o contrário de uma verdadeira diferenciação e da correspondente legibilidade, para estudantes, empregadores e para a sociedade em geral, daquilo que se convencionou designar por ensino universitário e ensino politécnico.
16. A Lei 16/2003, de 10 de abril, estabeleceu a possibilidade de conferir o grau de doutor no ensino politécnico, em igualdade de condições com o ensino universitário, eliminando uma das marcas distintivas, até então, das instituições de natureza universitária.
17. A maior parte das universidades integra escolas de ensino politécnico e, consequentemente, este ensino é ministrado quer em instituições de natureza politécnica, quer em instituições de natureza universitária, ainda que em unidades orgânicas de ensino politécnico.
18. Muitas universidades são, de facto, instituições híbridas, ainda que com diferentes níveis de intensidade, como é demonstrado pelo facto de quase metade dos alunos da Universidade do Algarve estudarem em cursos de natureza politécnica (46%), ou quase um quarto nas Universidades de Aveiro e da Madeira (23%). 
19. Estas aproximações, ao nível do ensino e da organização, não deixarão de ter repercussões também ao nível da carreira docente, sendo de esperar uma crescente convergência, senão mesmo fusão, entre as carreiras docentes do ensino universitário e politécnico, e entre carreiras docentes e de investigação. 
20. A realidade do ensino superior não é binária, sendo a situação atual resultante de uma deriva politécnica das universidades e de uma deriva universitária dos politécnicos.
21. A própria Proposta encerra contradições a esse respeito, procurando, por um lado, reafirmar o quadro binário, enquanto, por outro, reconhece a existência de um contínuo de estados.
22. Assim, a Proposta introduz, no artigo 3.º, a noção de predominância de missão como fundamento para a distinção entre as instituições de natureza universitária e politécnica, numa aparente tentativa de sanar esta contradição conceptual.
23. Uma noção de predomínio associada a várias vertentes da missão, abrangendo o âmbito do ensino (estudos gerais vs. formação técnica avançada), a investigação (básica vs. aplicada) e a natureza dos ciclos de estudos (mestrado e doutoramento vs. ciclos curtos e licenciatura).
24. A operacionalização do conceito de predomínio, abrangendo várias vertentes, afigura-se potencialmente problemática, não se explicitando o quadro qualitativo ou quantitativo em que se baseará.
25. Adicionalmente, a própria terminologia empregada para a identificação da diferenciação institucional parece desfasada em relação à realidade, uma vez mais recorrendo a uma perspetiva binária, como nos casos do ensino ou da investigação acima referidos.
26. Estranha-se, ainda, que a menção ao desenvolvimento tecnológico, à inovação e à ligação ao tecido económico e social figure apenas na descrição das instituições de natureza politécnica, numa perspetiva muito distante do papel reclamado, desde há muito, pelas universidades, no que é normalmente designado pelo 3.º pilar da sua missão.
27. A aproximação das designações de ambas as instituições, consagrada no Artigo 5.º da Proposta, universidades e universidades politécnicas, é a contradição última da ficção binária, sendo que, de facto, todas estas instituições passarão a ser universidades, umas de nome próprio, outras com apelido.
28. Regista-se que, com a inclusão do Artigo 31.º-A, a Proposta parece conter, implicitamente, uma noção de hierarquia entre os dois tipos de instituições, considerando a possibilidade de conversão de universidades politécnicas em universidades, mas não o inverso.