quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Políticas para o Ensino Superior e Ciência - AD

Imagem do jogo Alma Mater, Eggert Spieler

 






Retomando um hábito antigo, ainda que com algum custo, decidi ler as propostas para o Ensino Superior e a Ciência, apresentadas nos programas eleitorais das forças atualmente representadas na Assembleia da República.
Aviso aos leitores: a análise de programas políticos pode ser causa de sintomatologia adversa!
Começando por quem defende que o caminho necessário só se faz "invertendo a trajetória de desinvestimento, combatendo a desvalorização das carreiras e revertendo a degradação das infraestruturas.". PCP? BE? Livre? Não! A frase consta do programa da AD. E, assim, até parece fácil conseguir uma convergência parlamentar nestas matérias, independentemente de qual for a geometria governativa. A acompanhar de perto!
Mas adiante. Metas. Algumas. E, de facto, com números. Um investimento público e privado de 3% do PIB em ciência e inovação até 2030. Um número mágico que paira por aí há décadas, ainda e sempre como miragem. Partindo-se agora de 1,73% em 2022, segundo o documento em análise. 2030. Ambição para lá da legislatura. Ou talvez não. É que a meta é precedida pelo verbo "aproximar" e não pelo verbo "alcançar", o que dá para quase tudo.
Uma outra meta, esta sim inequívoca, duplicar no prazo da legislatura a "oferta de camas em residências estudantis", em articulação com o privado. Não portanto a simples oferta de camas disponíveis, em geral e abstrato, mas especificamente em residências.
De seguida as medidas. Numerosas. Mas imbuídas de uma doença grave, estrutural, e infelizmente demasiado comum em esferas decisórias. É que não são, de facto, medidas. São, isso sim, anseios, desejos, intenções, e objetivos, quando muito. Não concretizando as políticas. Não apontando pistas. Por estratégica, confusão, ou incapacidade. 
Alguns exemplos.
Fortalecer a autonomia das instituições de Ensino Superior. Sim? Como? O que se entende por autonomia? Face a quê? Fomentar a atratividade das instituições de ensino superior para os estudantes internacionais e estudantes em mobilidade de curta duração. Reforçar as condições de bom desempenho de toda a comunidade que desempenha funções nas Instituições de Ensino Superior. Potenciar o regime de mecenato às instituições de ensino superior públicas. Desenvolver estímulos conducentes à contratação transparente e sustentável de docentes e investigadores por parte das instituições públicas. Fomentar, reforçar, potenciar... Noutros pontos alavancar, desburocratizar, expandir, apostar, estimular. Verbos que não indiciam operações concretas. Palavras que ficam palavrosas.
Mais críptico, porque não desenvolvido, "Organizar a rede de instituições de Ensino Superior para garantir a cobertura nacional". 
Mais ao lado e mais surpreendente "Encorajar a participação de representantes do tecido empresarial nos conselhos consultivos das instituições de Ensino Superior". Ao lado, porque tais órgão não são generalizados. Mais surpreendente, porque parte do pressuposto de que os empresários precisam de encorajamento para tal, o que quer que isso signifique.
Algumas ausências notadas: a política de propinas e a política de vagas.
Fica pouco, muito pouco. Algo surpreendente para a coligação que conta com um dos dois maiores partidos, com grande implantação, e, certamente, um grande número de pessoas capazes de contribuir a este propósito.
Um já está. Faltam sete.