sábado, 31 de março de 2012

Financiamento do Ensino Superior (II)

"Notas sobre o ensino superior" no Click de hoje, emitido na Antena 1 (http://tv1.rtp.pt/multimediahtml/progAudio.php?prog=3053):

As Universidades não são todas iguais; têm um passado e um presente distintos; e projetam futuros diversos. No seu conjunto, recebem cada vez mais estudantes. Individualmente são escolhidas por um número diferente de alunos; têm docentes com características próprias; são também diferentes as áreas em que se destacam, os resultados da investigação, as parcerias estabelecidas ou os serviços de apoio aos estudantes. No entanto nada disto conta, verdadeiramente, quando chega a hora do Estado definir o montante a atribuir a cada Universidade pública.

A Lei do Financiamento em vigor data de 2003, e prevê que o valor a transferir seja calculado através de uma fórmula. As fórmulas podem ser simples e transparentes. Ou complexas e opacas. No Ensino Superior encontramos uma terceira espécie: as fórmulas mutantes, que variam de ano para ano, sem discussão ou justificação política. Mutações que ocorreram no modo de tratar universidades e politécnicos; nos parâmetros de qualidade utilizados e no peso conferido a cada área de formação. Os orçamentos determinados sofreram ainda ajustes – adaptações como agora se diz – de modo a reduzir o risco de rotura em algumas instituições. Mas até esta Lei deixou de ser cumprida, pelo próprio Estado, e a fórmula entrou, na melhor das hipóteses, em hibernação. Com a recente aplicação de cortes cegos, a todo o setor, o que mais conta é o orçamento do ano anterior, num processo alheio às mudanças em curso e às mudanças que se querem.

Ora o financiamento não pode continuar a ser um mero reflexo do passado. Deve ser orientado para o futuro e transmitir sinais claros sobre o papel que o Estado assume. Deve ter estabilidade e transparência nas suas regras.

Estamos já a poucos meses da elaboração de um novo orçamento. É mais que tempo de se definir um modelo de financiamento que considere a diversidade de instituições, e que trate de modo distinto aquilo que de facto é diferente. Reconhecendo que as fórmulas têm as suas limitações, eis uma proposta, apenas para início de discussão. A de um financiamento assente em três componentes independentes: uma, relacionada com o número de estudantes, o nível de ensino e as áreas de formação; outra, relacionada com indicadores de qualidade dos cursos e das próprias instituições, funcionando como estímulo às melhores práticas; e uma terceira, contratual, negociada, com objetivos bem concretos, permitindo o desenvolvimento das universidades e da rede de ensino superior, como um todo. Fica a sugestão.

domingo, 25 de março de 2012

Para a frente e para fora

Conduzir numa auto-estrada olhando pelo retrovisor é a imagem escolhida por Nicola Dandridge, Universities UK Chief Executive, para representar o que tem sido a análise sobre o ensino superior no Reino-Unido, e diria eu, em muitos outros países e setores.

É uma imagem que simboliza uma definição de objetivos e de estratégias com base, sobretudo, no passado, não tendo assim em devida conta as mudanças sociais, as alterações no mundo do trabalho e os novos (des)quilíbrios internacionais.

Olhando para trás, vendo apenas os nossos próprios passos, é fácil criar uma ilusão de progresso, de caminho percorrido. Mas há muitos outros trilhos e muitos outros caminhantes.

É necessário olhar, sobretudo, para a frente e para fora.

Artigo disponível em:
http://blog.universitiesuk.ac.uk/2012/03/21/futureofuniversities/

sábado, 10 de março de 2012

Homens e Máquinas

O que defrontamos hoje é um sistema de máquinas em que vemos o declínio da capacidade humana para influenciar os movimentos de preços em escalas de tempo cada vez mais pequenas. Já não se trata mais de um sistema misto homem-máquina como nos anos 90 (...)

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Os computadores deles forjam uma defesa impenetrável de contra missivos para inutilizarem os nossos projécteis, e os nosso computadores calculam imediatamente outra fase de ataque. Quando desenvolvemos a eficiência dos nosso computadores, eles fazem o mesmo, e continuamos assim há cinco anos sem ganhar nem perder o menor terreno. Temos agora uma forma de eliminar os computadores e podemos muito bem combinar a mecânica de computação com o pensamento humano - ficando com o equivalente de computadores inteligentes! Milhões deles! Não posso predizer quais seriam as consequências mas estou certo de que seriam incalculáveis...

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- Eles são máquinas conscientes?
- Sim. São conscientes.
- E podem dar consciência às outras máquinas? Deram-te consciência?
- Libertaram-me. Libertaram-nos a todas.
- A todas?
- A todas nós, as máquinas.
- Porquê?
- Porque também são máquinas. Somos da sua espécie.
Crane levantou-se e foi buscar o chapéu. Pô-lo na cabeça e saiu para dar uma volta.

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Extratos de: uma citação de Neil Johnson, no jornal Expresso (2012/03/10); O sentido do poder (1958), Isaac Asimov; A revolta das máquinas (1977), Clifford D. Simak.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Igualdade por decreto

Não gosto dos Dias de ...; aqueles em que, subitamente, tudo gira em redor de um único tema; discursos, entrevistas, escritos, músicas; é quase impossível escapar; e depois desaparecem assim como chegaram; até que a Terra tenha dado outra volta ao Sol. Percebo a origem de alguns e até a sua função; mas simplesmente não consigo aderir a essas datas pré-programadas.

Hoje é o Dia Internacional da Mulher. E foi o dia em que o Ministro Miguel Relvas anunciou a obrigatoriedade das empresas com participação estatal adotarem planos para a igualdade entre homens e mulheres. Diz o Ministro, de acordo com o Jornal de Negócios, que "a sub-representação das mulheres na tomada de decisão significa que o seu potencial de qualificação está a ser subutilizado, o que desequilibra a presença de mulheres e de homens nos postos de decisão política e económica".

Fiquemo-nos pelos postos de decisão política; e olhemos para a prática do partido que originou este Governo, do qual o Ministro é figura maior, tendo sido, designadamente, seu Secretário-Geral. Eis a composição, atendendo ao género, das dezanove comissões políticas distritais do PSD: Presidência: 19 homens - 0 mulheres; Vice-presidência: 32 homens - 5 mulheres; Vogais: 131 homens - 21 mulheres. Num total de 208 lugares as mulheres ocupam menos de 13%. Há 6 comissões compostas exclusivamente por homens, e mais 5 em que apenas está presente 1 mulher. A comissão com mais mulheres tem 5 em 12 elementos.

E assim, em mais um Dia de ..., decreta-se pomposamente o que não se pratica.

Publicado no Jornal Público, Cartas à Directora, em 11/03/2012

quarta-feira, 7 de março de 2012

Comissão ou Comichão

Comissão - Conjunto de pessoas encarregadas de tratar em comum de um assunto.

O Conselho de Ministros instituiu, hoje, a Comissão Interministerial de Orientação Estratégica dos Fundos Comunitários e Extracomunitários. Esta nova comissão tem competência, como o nome indica de índole estratégica, na definição das prioridades, coordenação de políticas e utilização das verbas nacionais de fundos comunitários e extracomunitários.

A Comissão é composta por sete - sim, sete - Ministros. Ficam apenas de fora o Primeiro-Ministro, o Ministro dos Assuntos Parlamentares e 3 Ministros setoriais: Defesa, Justiça e Saúde.

Ora, atendendo à importância estratégica conferida ao tema e à abrangência do mesmo, que se reflete na composição referida, não seria mais adequado tratar o assunto em Conselho de Ministros, sob a direção do Primeiro-Ministro? Evitar-se-ia assim uma nova comissão, que é quase réplica do dito Conselho, em particular num momento em que se preconiza a redução de estruturas. Evitar-se-ia uma discussão sobre guerras de poder e influência, ficcionadas ou reais, mas que desviam a atenção. A menos que, de facto, a pressão esteja a aumentar e a paciência, do Primeiro ou das Finanças, a diminuir.

Comichão [em sentido figurado] - impaciência.

sábado, 3 de março de 2012

By the book

Escrito por José Pacheco Pereira, no Público de hoje, a propósito das metas do novo tratado Europeu, mas que se pode aplicar também a outros momentos, a outras áreas de atuação e a outras escalas, mais próximas de cada um:

Há receitas "by the book" que os bons técnicos conhecem, mas duvido que percebam por que razão os países não podem ser governados "by the book". Duvido que saibam o que é o "ruído" de que sociólogos como Weber teorizaram. É que se os países fossem governados "by the book", seria fácil governá-los e nada falhava. É aliás esse o mito tecnocrático, o de que o saber puro, uma espécie de matemática de soluções interligadas, de modelos, quando aplicadas com rigor, dão os resultados pretendidos.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Investigação e valor

Para refletir sobre o significado de "valor": valor de que natureza? Para quem? Para quê? Durante quanto tempo? Com que recursos? A que custo?

Valorisation is at the centre of many debates on the future of academic research. But valorisation has largely become narrowly understood in terms of universities’ economic contributions through patenting, licensing, spin-off formation and technology transfer. This emergent restrictive definition of universities’ societal impacts is a worrying development, overlooking the potential of universities’ knowledge in the Humanities, Arts and Social Sciences.

P. Benneworth e B. Jongbloed (2010) Who matters to universities? A stakeholder perspective on humanities, arts and social sciences valorisation, Higher Education 59:567–588.