sexta-feira, 22 de abril de 2016

Bump ahead

A estrada recomeçou a ser construída, depois de uma mudança geral de equipa. Planeadores, projetistas, engenheiros, chefes de obra. Gente nova ou gente de outros projetos. Com mais ou menos currículo. O traçado segue quase a mesma linha, talvez um pouco mais à esquerda, dependendo do ponto de vista. Efeito de paralaxe que vai permitindo um acordo, consentido, sobre o desenho do novo traçado. Os trabalhadores são os mesmos, tanto quanto é possível dizer que nos mantemos os mesmos, ano após ano. O próximo ponto de passagem também não mudou. Chama-se 2017, e será mais curto que o ano em curso. Menos mal, já se poupa um dia.

A estrada que recomeçou a ser construída ganha novos cartazes, que anunciam as paisagens do futuro, quando a reflorestação estiver concluída, quando tiver trânsito, quando as cidades forem outras, mais reabilitadas, quando as mesmas pessoas forem outras, mais qualificadas, quando o futuro chegar e passar, como todos os futuros.

A estrada em construção tem já alguns sinais, prevenindo quem a calcorreia. Proibido virar à direita. Curva perigosa à esquerda. Curva e contra curva. Contra curva e curva. Precipício. Não olhar para baixo. Subida íngreme. Descida acentuada. Escapatória de contingência. Ponte para a Europa, ainda incompleta. Salto no escuro.

E dísticos celebrando os planos do futuro-presente para o País. Plano A. Plano B. Este afinal não existe. É o não-plano. Uma miragem. Plano de Estabilidade. De estabilidade estável. Planos com siglas. PO de Programa Orçamental. 10 de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. E número, alguns números. Não de quilómetros construídos, mas de milhões gastos. Em euros. Na estrada em construção, 1.397. Na estrada a construir, depois de entrar em 2017, 1.400. Número mais redondo. Mais 3 milhões de euros. Mas os trabalhadores do 2017 por vir ganham já mais do que os trabalhadores do 2016. Muitos mais do que estes 3 milhões de euros. Em algum lado se fará o equilíbrio. São contas de somar e de sumir, ensinadas no Ensino com todo o rigor da Ciência.

Caution! Bump ahead!

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Divergente

Podia ser título de filme. E é. Daqueles que costumam surgir em trilogias. Livros que dão filmes ou Filmes que dão livros. Divergente. Insurgente . Convergente. Mas é também a situação em que título e conteúdo não se encontram. Não só em filmes. Em artigos científicos. Em documentos políticos. Em produtos de retalho. Por estratégia de marketing. Por vassalagem ao politicamente correto. Ou por falta de capacidade para fazer melhor. Divergente. Como no já esquecido guião para a reforma do Estado. Divergente. Como no Plano Nacional de Reformas.

A secção que se inicia na página 16 do Plano Nacional de Reformas (na versão acessível em http://cdn.impresa.pt/e20/01e/8925624/20160421-pnr.pdf) intitula-se "Autonomia institucional do ensino superior, com ciência aberta e melhores níveis de qualificação superior da população".

E nela se afirma que "é necessário estimular um quadro de efetiva autonomia institucional e responsabilização reforçada das instituições de ensino superior, facilitando a diversificação das suas receitas, o aumento dos seus padrões de qualidade e um maior sucesso dos seus processos de internacionalização."

Parecia ser esta a reforma do Plano. Efetiva autonomia. Responsabilização reforçada onde o anterior Governo dizia autonomia reforçada. Diversificação das receitas. Mas não. Teremos afinal um Programa de Modernização e Valorização dos Institutos Politécnicos, promovido pelo Governo. O reforço do emprego científico, promovido pelo Governo. O reforço da formação avançada, pelo Governo.

Fim da secção. A autonomia institucional é divergente. Não se compagina com medidas, metas e investimentos do Governo. Com um programa de reformas que não é nacional, mas governamental. E como tal figura apenas no título e numa referência genérica. Sem relação com o conteúdo e o comando e controlo do Governo. Divergente.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Cativações, Avanços, Recuos ou Disparates?

O Expresso, entre outros órgãos de comunicação social, dá nota do "recuo" do Governo na cativação de verbas das universidades e politécnicos (http://expresso.sapo.pt/sociedade/2016-04-08-Governo-recua-na-cativacao-de-verbas-das-universidades-e-politecnicos).

O que estava em causa era a cativação de receitas várias, que apenas poderiam ser utilizadas mediante autorização do Ministro das Finanças.

O que diz a notícia é que o Secretário de Estado do Orçamento exarou um despacho em que autoriza  "a utilização das dotações sujeitas a utilização condicionada (...) sempre que se trate de despesa financiada por receitas próprias, no caso de instituições de ensino superior, nelas se incluindo as transferências de receitas gerais da Fundação para a Ciência e Tecnologia inscritas nos orçamentos destas entidades". O que se justifica por ser necessário "salvaguardar a gestão corrente das instituições de ensino superior".

A notícia está mal colocada! Os jornalistas correram atrás de declarações, mas sem fazer o trabalho de casa. A verdadeira notícia não é um recuo do Governo, mas sim um avanço, uma verdadeira investida. Porque as instituições de ensino superior, no que se refere a receitas próprias e verbas da FCT, estavam já excecionadas, isentadas, das cativações. Pelo menos de acordo com o Orçamento de Estado para 2016. Que é uma Lei da Assembleia da República. Onde se pode ler "2 — Excetuam -se da cativação prevista no número anterior: a) As despesas financiadas com receitas próprias, nelas se incluindo as transferências da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P. (FCT, I. P.), inscritas nos orçamentos dos serviços e fundos autónomos das áreas da educação e ciência e nos orçamentos dos laboratórios do Estado e nos de outras instituições públicas de investigação". Afinal o mesmo que o Secretário de Estado quer autorizar.

Nem o Governo podia cativar essas verbas, nem agora autorizar o seu uso (mantendo assim o pressuposto de que foram cativadas e que, portanto, o uso carece de autorização). Nem colhe o argumento invocado da salvaguarda da gestão. Para isso não tinha proposto um orçamento com cativações, que interferem sempre na gestão corrente. Ou tinha, antes de cativar, se para tal tivesse competência, feito o dito despacho.

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Dúvida radical

"From the perspective of complex responsive processes of relating, leading leadership development involves encouraging radical doubt, enquiry and reflexivity as a way of developing the capacity of leaders to manage in circumstances of high uncertainty and ideological and political contestation. 

However, radical doubt does not mean throwing everything up in the air at once. It means learning how to navigate between the poles of absolute certainty and absolute doubt, while persisting in seeing the world as more complex than it is portrayed in the dominant discourse." (Finn and Mowles, 2014).

Such an approach, whilst challenging and potentially threatening to those in positions of authority, is well suited to contexts of uncertainty and ambiguity that increasingly typify the higher education sector, where individuals and organisations face ‘wicked’, intractable problems that cannot be resolved through the application of proven management practices (Grint, 2005)."

Bolden et al. (2015), Developing and Sustaining Shared Leadership in Higher Education, Stimulus Paper, Leadership Foundation for Higher Education.