terça-feira, 15 de setembro de 2015

Programas Eleitorais - Ensino Superior (4)

É a vez do Bloco de Esquerda.

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Ensino Superior e Ciência

A democracia no acesso ao conhecimento continua a ser um desafio central por resolver. A expansão do ensino superior e a diversificação das áreas científicas foram objetivos políticos importantes nas últimas três décadas. Mas na questão do financiamento das instituições, da democracia no acesso ao ensino superior e da sua gestão, na distribuição geográfica, na consolidação de massa crítica e na renovação de um corpo de docentes e investigadores com direitos e com estabilidade, há lacunas e há retrocessos muito preocupantes. Corrigi-los é essencial para o país.

O financiamento da educação está hoje, em termos de valores absolutos, ao nível de 2004. O investimento na educação continua em Portugal abaixo da média europeia e da OCDE. No ensino superior, o investimento médio por aluno é de menos 30%. As instituições têm sido subfinanciadas e estão na maioria dos casos privadas de financiamento plurianual. As propinas, que foram sempre apresentadas como não se destinando a financiar despesas correntes, ganham peso no orçamento das instituições de Ensino Superior: rondam os 40%, em média, e nalguma instituições ultrapassam os 50% do seu orçamento. A lógica de que as instituições devem “ir ao mercado” para se financiar, disputando entre si financiamento competitivo, tem contribuindo para uma dualização crescente das instituições e para uma desresponsabilização pública pelo seu funcionamento.

O modelo de governo instituído pelo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) eliminou os espaços de exercício da democracia e da participação. Limitando a participação dos estudantes e não docentes, e inclusive dos docentes, o RJIES introduziu uma lógica mercantil no funcionamento do sistema, patente na entrada para os Conselhos Gerais dos representantes dos principais grupos económicos (enquanto representantes da “comunidade”). Além disso, o RJIES estabeleceu uma hierarquia inaceitável entre universidades do mesmo sistema, introduzindo incentivos financeiros em função das escolhas de modelo de gestão e condicionando, por essa via, a autonomia das instituições. O Bloco de Esquerda rejeita o modelo fundacional e defende a autonomia e democracia nas universidades.

Os estudantes portugueses contam-se entre os que mais pagam para estudar. Já em 2011, as famílias usavam 22% do seu rendimento para pagar os custos diretos de educação universitária. A maior parte do custo de um estudante do Ensino Superior é assim financiado pela família diretamente, ao contrário do que acontece por exemplo na Alemanha, em França, na Suécia ou na Letónia.

A instabilidade do corpo docente e dos investigadores tem sido crescente em Portugal. Estranguladas financeiramente, com regras que limitam a abertura de novas vagas nos quadros, muitas instituições recorrem ao trabalho não pago, ao trabalho precário e aos contratos a tempo parcial para preencherem necessidades permanentes (42% dos docentes do ensino superior são precários). No campo da ciência, o regime das bolsas de investigação perpetuou um modelo de desenvolvimento científico assente na precariedade dos seus agentes, que não beneficiam de segurança nem de proteção social nem de oportunidades de carreira. O próprio valor das bolsas está congelado há mais de uma década.

A política científica foi das que mais sofreu com o governo da direita. O corte abrupto nas bolsas de investigação (as bolsas de doutoramento foram reduzidas a metade) e o processo de avaliação dos centros de investigação - atabalhoado, opaco e profundamente contestado - traduziram-se numa rutura de linhas de investigação e no encerramento de instituições científicas insubstituíveis. A retórica da “excelência” foi pretexto para o recuo a visões unidimensionais da pratica científica, para o corte no financiamento e para o desaparecimento competitivo de vastas áreas do conhecimento.

Caminhos

- Financiamento adequado e plurianual das instituições de ensino superior, contratualizado para cobrir despesas de funcionamento e programas de investimento. O Bloco opõe-se à existência de propinas como método de financiamento do Ensino Superior.

- Revisão do modelo de gestão das universidade e politécnicos, recuperando a paridade entre estudantes e professores na composição dos órgãos, repondo a participação do pessoal não docente, pela sua integração obrigatória nos Conselhos Gerais, consagrando a existência de um Senado em cada instituição, garantindo que a eleição do reitor passe a ser feita por um colégio eleitoral alargado e representativo e instituindo a paridade de género nas listas para os órgãos de gestão.

- Revisão do regulamento de bolsas, de modo a alargar o universo de beneficiários da ação social escolar direta, reformulando-se a fórmula de cálculo e definindo um calendário certo e regular para a transferência das bolsas . Além disso, o Bloco propõe a isenção imediata de propinas para os estudantes bolseiros, para os desempregados e para os estudantes cujo rendimento seja inferior ao salário mínimo nacional, e o alargamento da rede de residências universitárias e o reconhecimento dos direitos dos estudantes-trabalhadores.

- A estabilização e renovação do corpo docente do Ensino Superior, aplicando-se a Diretiva 1999/70/CE, relativa à efetivação dos contratos de trabalho a termo, abrindo novos concursos que permitam renovar o corpo docente das instituições e evitar a emigração de muitos dos quadros mais qualificados, que não encontram oportunidade de carreira em Portugal.

- O investimento em ciência e investigação deve atingir 3% do PIB, tal como definido em compromissos europeus. O financiamento da ciência deve não apenas ser retomado, sob um processo de avaliação de unidades que seja transparente e claro nos critérios e nas regras, com painéis de avaliação sólidos, participação e autorregulação dos cientistas, considerando investigação fundamental e compromisso social.

- Novo estatuto do investigador científico, com contrato de trabalho e proteção social, em lugar de um sistema assente em bolsas de investigação para situações que extravasam a condição e os momentos de formação, e que atualize os atuais valores das bolsas, congelados há quase década e meia. O recrutamento de novos cientistas para o sistema de ensino superior e investigação, pela abertura de vagas na carreira de investigação e por contratos de Investigação para projetos de médio e longo termo, é condição imprescindível de um compromisso sério com a ciência.
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