domingo, 16 de dezembro de 2012

Viagem

Nuvens. Chuva. Estrada deserta.
O mundo que existe para lá do vidro, para lá das gotas, é um mundo desfocado, de formas indistintas, de cores atenuadas e tons sombrios. Mundo que se vê, mas que se não sente. Não se sente o toque do vento que abana as árvores. Não se sente o frio da água que escorre pelas encostas. Não se ouve o embate da chuva com as folhas, com as pedras, com a terra.
Nuvens. Chuva. Estrada.
Para o mundo somos nós que estamos desfocados, para lá do vidro, para lá das gotas. Num casulo morno, em que parados deslizamos. Envoltos em sons que se misturam: o crepitar da chuva, o fremir longínquo do motor, as rodas pisando a água, o rádio de onde chegam vozes e sons de outros tempos, deste tempo. Toca chuva vermelha, com cores que esta não tem. Realidade irreal.
Estrada. Carros.
Pessoas que não se vêem. Cruzam-se, ultrapassam, são ultrapassadas. Pensamentos e vidas; no mesmo mundo mas em muitos mundos. Em que os outros estão desfocados, e em que nós somos os outros.
Nevoeiro. Estrada. O mundo encolhe. As encostas, as árvores e os muros partiram. Fica a estrada. Só. Sem início e sem fim. Estrada sem destino. Sem antes e depois. Sem tempo.
Estrada. Rua. Cidade. A chave roda. A porta abre-se. Os mundos tocam-se. Mais portas. Outros mundos.

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