domingo, 5 de março de 2017

ROCK and the Elephant














Rock the Casbah, nos anos 80, com o Punk dos Clash? Cage the Elephant, já depois do milénio? Um elefante que se evapora, no conto de Murakami? Sons, imagens, palavras. Em associação. Divago. Tudo começou com o acrónimo ROCK, e cenários sugestivos, à boa maneira anglo-saxónica, neste caso com sotaque australiano, que incuem elefantes. Sim, elefantes e não cangurus, porque os primeiros ocupam, notoriamente, mais espaço. Vamos então ensaiar uma adaptação livre desta leitura. Adaptação no que se refere à substância e aos exemplos; reprodução dos conceitos e dos acrónimos; e mais uns pós para compor a história.

Imagine uma organização. Não importa qual, pois a história aplica-se a muitas. A sua, onde trabalha; a dos seus amigos; alguma conhecida; uma com que contacte como utilizador. De preferência com uma estrutura hierarquizada, como é normal, com camadas, secções, departamentos. Com os correspondentes líderes, liderados e aspirantes a apanhar o elevador na direção certa, a que vai para cima, claro. Continue a imaginar. Uma sala, dessas que existem nas organizações, com uma grande mesa no centro e cadeiras em redor. Com o líder e outras figuras proeminentes, de diferentes níveis. Agora vem o momento em que é preciso um golpe de asa, salvo seja: imagine um elefante dentro da sala. Assim mesmo, grande e presente como os elefantes sabem ser, sobretudo se forem cinzentos. A cena está preparada.

Diz o líder enganador "Não há nenhum elefante na sala.", enquanto pensa agastado "Ninguém me disse que havia um elefante na sala!". Os presentes estão relutantes em falar sobre o elefante, grande, cinzento e notório. Mais ainda, estão também relutantes em discutir, ainda que apenas entre eles, o próprio facto de não falarem. ROCK é o portador das más notícias: "Há um elefante na sala". Conversas e desconversas. Desculpas. Escapatórias. Bodes expiatórios. ROCK deve ser afastado, isolado.

Vamos então ao acrónimo. Quem é o ROCK? É aquele líder que mostra Respeito (R de Respect), assume a sua parte de responsabilidades nos erros (O de Ownership), atribui louros a quem faz bom trabalho (C de Credit people) e mantem os compromissos (K de Keep commitments). E, por isso, é por vezes considerado como não jogando em equipa, como sendo um elemento perturbador, como um denunciante a apontar falhas. Por vezes é mantido, eventualmente a contragosto, porque confere maior credibilidade à organização. Outras é colocado em quarentena, para evitar o incómodo e o contágio.

Mas há mais acrónimos nesta história, fazendo contraponto. Os que se aplicam aos líderes enganadores, em que as necessidades e objetivos reais do seu "eu", ou do seu grupo, prevalecem sobre a missão da organização, ainda que não na aparência. Enganadores, por isso. Tendem a ser mais FIBS, comportamento em que pontua a bajulação de quem é percebido como importante (F de Flatter), a inflação da sua própria contribuição para os bons resultados (I de Inflate), a quebra de compromissos com quem é menos importante (B de Break commitments) e a procura de bodes expiatórios para alijar responsabilidades (S de Scapegoat).

A preponderância de uns ou de outros confere à organização um caráter mais saudável, ROCK style, ou mais tóxico, com dominância FIBS. Um líder FIBS estimula a propagação deste comportamento. Que se dissemina tanto mais rápida e eficazmente quanto mais as pessoas medirem o seu sucesso em termos da sua posição, e não em termos da sua contribuição efetiva. O medo da perda de posição e de estatuto conduz a uma conformação com o que é esperado, e reforçado, de forma mais explícita ou mais indireta, pelo topo da hierarquia: "You are either with us or agains us". Status e controlo. Na esperança de subir ou, pelo menos, de não descer. A caminho de entranhar o FIBS na cultura organizacional,  perdendo diversidade, perdendo contributos, perdendo vontades.

Não há estruturas perfeitas. Todas têm defeitos. E são heterogéneas, um mosaico de unidades boas, médias, pobres, refletindo a estrutura, liderança, cultura, recursos e nível de desenvolvimento das pessoas em cada uma. É este o contexto. E é neste contexto que os efeitos da posição, e de quem ocupa posições, são decisivos. Para evitar que as falhas de estrutura se transformem em desastres tóxicos, dos quais é difícil sair, é preciso reconhecê-las. E é preciso agir, sistematicamente, promovendo e valorizando lideranças saudáveis, mantendo a coerência entre discurso, ação e missão, disseminando a "boa" cultura. Agindo onde é possível agir. Atuando onde tem mais impacto atuar. Encorajar a manifestação e o uso da inteligência e criatividade das pessoas é uma definição possível de boa liderança.

Texto elaborado a partir de "How to change organizations from the outside", de Peter Reenie (2010), disponível em https://primaryconnections.org.au/materials/leading-change-materials/rennie-p-c-how-to-change-organizations-from-the-outside.pdf.

É tempo de terminar. E parece-me apropriado voltar aos sons, imagens e palavras. Agora com os AC/DC, banda que veio também de down under como o autor do artigo, e com um tema que ganha aqui uma nova expressão: "For those about to Rock, we salute you".

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