sábado, 16 de maio de 2020

Conformidades













Folheando leituras de há uns anos.

Um livro de 2011, editado pela Bertrand no ano seguinte, adquirido e lido em 2017. Duas entradas nas Notas, nesse mesmo ano.

A primeira, "Capítulo 1", então ainda em início de leitura, num momento em que a escrita de um tempo passado parecia irromper bruscamente pela realidade, através das notícias de última hora. O dito capítulo intitula-se "A onda mexicana e o bombista suicida". Na Grã-Bretanha do autor tinha acabado de acontecer o atentado na Manchester Arena.

O livro regressou às Notas, um par de meses depois, com alguns excertos e parafraseando o autor, "Eu sei, porque o fiz". Reflexões pessoais sobre sistemas de poder e os indivíduos, sobre os outros, sobre nós, sobre governos. Como poderia ser sobre outras instituições. Aqui fica mais um, nesta mesma linha.

"De início pensei que pudesse ajudar a alargar este espaço de decisão possível e a empurrar os seus limites. No entanto, com o passar do tempo, tornou-se mais fácil brincar nesse pequeno aglomerado de árvores, enquanto fazia de conta que se tratava da floresta inteira. Os limites do politicamente disponível passaram a definir os limites do meu pensamento. Tendo em consideração que não valia a pena pensar naquilo que não me seria permitido, fui lentamente aprendendo a não me preocupar. A minha visão do mundo começou cada vez mais a parecer-se com a visão de todos os outros funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros. As minhas cartas, telegramas e discursos - fui durante um tempo o redator de discursos do ministro dos Negócios Estrangeiros - tornaram-se iguais aos de todos os outros. Articulados, bem concebidos, até mesmo impressionantes, mas absolutamente convencionais. Estranhamente, à medida que fui subindo na hierarquia, não passei a gozar de mais espaço para expressar os meus pontos de vista; na realidade, até passei a ter menos. Quanto mais elevado o meu grau hierárquico, mais importante se tornava que as minhas opiniões pessoais não se afastassem da linha oficial. Olhava para o meu embaixador em busca de um exemplo: nada do que dizia, em privado ou em público, se afastava da linha política seguida pela Grã-Bretanha. Era consistente, o diplomata completo. Era profissional e nunca questionava nada."

Carne Ross, A revolução sem líder, Bertrand Editora.

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