quarta-feira, 6 de julho de 2011

O outsourcing do risco

Os investidores, financiadores e outros operadores dos mercados recorrem a empresas externas, as agora tão famosas agências de rating, para fazer a análise do risco, designadamente nas acções de concessão de crédito a terceiros. Ou seja, fizeram o outsourcing de uma área já de si crítica, que encerra grandes incertezas, especialmente num clima turbulento como o que se vive há alguns anos, que movimenta somas astronómicas, prestando-se aos mais variados jogos de poder, e da qual depende a viabilidade não só de empresas como de países e, portanto, de milhões de pessoas.

Pior é que algumas entidades, como o próprio Banco Central Europeu, conferiram às notações de rating um carácter vinculativo e automático para determinadas decisões. Em lugar de utilizar, criticamente, as análises disponibilizadas a par com outros elementos, fizeram um verdadeiro outsourcing da própria tomada de decisão, desresponsabilizando-se irresponsavelmente!

Pior ainda, os operadores continuaram a confiar nas agências, não investindo em mecanismos próprios de avaliação (provavelmente caros, é certo, mas o barato sai caro) mesmo após o colapso da AIG, há cerca de 3 anos, as falhas detectadas nos sistemas financeiros, nos sistemas de regulação e no papel das agências de rating, que então avaliaram com níveis máximos de confiança empresas que já só o eram virtualmente.

E para piorar ainda mais a situação mantém-se o grosso deste mercado do risco entregue a 3 agências, conferindo-lhes um enorme poder.

Um poder que lhes poderia ter sido retirado pelos seus clientes, mas não foi! Um poder que lhes poderia ter sido retirado, ou pelo menos reduzido, pelos estados e operadores europeus, mas não foi! Com certeza que haverá conflitos de interesse, manipulações, corrupção. Com certeza que são interesses privados que ditam a sua actuação. Assim como com toda a certeza os mesmos problemas existem nos estados, e estão também na origem da situação em que nos encontramos, promovendo negócios ruinosos ou duvidosos, escondendo factos, esquecendo o interesse público em prol de interesses privados.

Estranho, por tudo isto, o ar ofendido e de superior moralidade de muitos líderes, que nada fizeram para alterar este estado de coisas mas a quem deixou de convir a interferência das agências.

O processo de notação da Moody's é, no dizer da própria, orientado para o longo termo. Uma vez mais, no clima de instabilidade actual, o grau de incerteza associado a este tipo de apreciações será enorme. Mas é com estas incertezas que lida quem solicita e concede empréstimos a 10 anos. A notação agora atribuída a Portugal, Ba2, significa que, no entender da Moody's, existe um risco suficientemente elevado de incumprimento para entrar na categoria "especulativo".

Ora temos entre nós políticos, economistas e comentadores, de vários quadrantes, que são da mesma opinião e que falam, aparentemente com menos controvérsia, da incapacidade de pagar a dívida em virtude do nível de (de)crescimento económico, da inevitabilidade de reestruturação da dívida (pelo menos a prazo), da impossibilidade de regressar aos mercados em 2013 e conequente necessidade de novos apoios especiais, da saída do Euro como alternativa, etc., etc.

Nada de substancialmente diferente, portanto!

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