Os Partidos esforçaram-se por nos fazer acreditar que estávamos a escolher um Governo e um Primeiro-Ministro. Muitos acreditaram ou queriam, ardentemente, acreditar. Não estávamos. Elegemos 230 deputados e a capacidade de formar Governo depende do número de deputados em cada bancada, e do que estes, na prática, fizerem, Se os Partidos forem coerentes alterarão em breve a Constituição, e passaremos a votar, diretamente, em candidatos a Primeiro-Ministro. E facilitarão a criação de maiorias absolutas. Mas não creio que tal vá acontecer. A coerência nem sempre convém.
Desta vez, e nem sequer será a primeira, será mais notória a diferença entre Governo e Assembleia, que terá, certamente, capacidade para legislar em algumas matérias sem o acordo dos partidos que apoiam o Governo.
Ouvem-se agora muitas interpretações sobre "a vontade do povo", como se ela fosse una, cada qual tentando legitimar a sua maneira de ver o mundo, ou, simplesmente, o seu desejo. Interpretações que ignoram, deliberadamente, os muitos significados por detrás dos votos: a favor, contra, porque sim, porque não, tanto me faz, para pior já basta assim, mudar custe o que custar, experimentar algo de novo, recusar qualquer mudança, clubes, modas, interesses e desinteresses,
Discordo de muitas das teses que circulam. Entendo que algumas são meros elementos da teoria de jogos, ou de meros jogos sem teoria.
Há quem ache natural a existência de coligações pré-eleitorais, mas não admita coligações pós-eleitorais. Há quem concorde com acordos parlamentares viabilizadores, mas não com os que possam ser opositores.
Há quem entenda que maioria relativa é igual a maioria absoluta e que, em consequência, quem perdeu tem de fazer de morto. Pessoas que repetiram que nós não somos a Grécia, mas que gostavam de ter o bónus de 50 deputados que lá se atribui a quem tem mais votos. Pessoas que talvez achassem que Sócrates devia ter governado até 2013, com um governo minoritário. Pessoas que deviam ouvir o que disse Paulo Rangel no último Expresso da Meia-Noite, lembrando, com naturalidade, os múltiplos exemplos que existem na Europa, de partidos que ganharam eleições mas não com margem ou capacidade política suficiente para governar.
Há quem ache que o mundo é a preto e branco, ou melhor à direita e à esquerda, sendo que um destes dois lados terá sempre maioria. Esquecem-se ou querem fazer-nos esquecer que há direitas, esquerdas e, imagine-se, até, centros. Ou são por nós ou contra nós. Não há compromissos através da linha divisória, invisível, talvez tracejada, mas haverá compromissos dentro de cada lado. Regressando às fronteiras e querendo acreditar que todos têm mais em comum do que diferente.
Há quem tacteie, talvez às cegas, procurando adivinhar o resultado no fim do jogo, antes de optar. Princípios políticos, preferências pessoais, estados de espírito, vontades. Puxando numa ou noutra direção. Pensamento externo. Pressões externas. Pensamento interno. Pressões internas. Partidos que se partem,
Há um Presidente em fim de mandato, mas que terá de decidir, mais tarde ou mais cedo, após negociações e audições. Haverá um Presidente em início de mandato.
Os recentes Governos de maioria absoluta, de Sócrates e Passos Coelho, contribuíram para um sentimento de que governar dispensa negociar. Maioria absoluta, poder absoluto. E, por isso, os principais partidos sempre apelam a uma maioria absoluta. Decidir sem concessões. Decidir sem negociação. Decidir sem ouvir. Suspeito que os outros partidos só não o fazem também porque estão mais longe da vitória.
O que sempre leva a uma estratégia de terra queimada, agudizada em períodos eleitorais, e que torna mais difícil o diálogo quando ele não só é necessário, como essencial.
Sai um Governo para o País no canto da Europa.
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