domingo, 10 de outubro de 2010

Transparência, translucidez ou opacidade?

Sobre a racionalização (leia-se redução do número de instituições) da rede e a projecção internacional das universidades portuguesas, disse recentemente o Reitor da U. Lisboa, António Nóvoa: "Não há hipótese de ter uma universidade de referência nos rankings internacionais se não se fizer esta reforma. Sobretudo em Lisboa", Expresso, 09/10/2010.

Para proceder a uma racionalização é preciso, previamente: a) compreender a situação actual; b) definir o objectivo a alcançar.

Fui ver um ranking recente, o do THES. Nos 50 primeiros lugares figuram 5 universidades do Reino-Unido: Cambridge, Oxford, Imperial College London, University College London e Edimburgo. Fui ver o seu orçamento. Todas estão no top 6 do que seria um ranking orçamental britânico. O seu orçamento conjunto, em 2008/2009, ascendia a cerca de 4.000 milhões de libras, o que representa quase 16% do orçamento de todas as instituições do Reino-Unido, com destaque para Cambridge, com mais de 1.100 milhões de libras. Edimburgo, com o menor valor das cinco, tinha um orçamento de perto de 590 milhões de libras. Fui ver os efectivos de pessoal académico a tempo inteiro. Conclusão análoga: mantém-se no top 6. Coincidência, causa ou consequência?

Refira-se que o orçamento de funcionamento atribuído anualmente pelo estado português a todas as instituições de Ensino Superior, universidades e politécnicos, ronda 1.000 milhões de euros (não libras). A este valor haverá ainda que adicionar verbas específicas para a acção social, receitas próprias e financiamento para investimento, mas permite ter uma ideia da diferença entre ambas as realidades.

Não pretendo embarcar em comparações simplistas, e muito menos estimar o montante necessário para construir uma universidade capaz de entrar no top 50 de um qualquer ranking. Estes dados são apenas um pretexto para considerações de outra natureza. Os números que referi para as universidades britânicas estão disponíveis na internet, à distância de alguns cliques. De igual forma poderia ter referido o número de estudantes, os países de proveniência, o pessoal académico e não académico, a inclusão de minorias, o número de abandonos, etc. etc. A Higher Education Statistics Agency encarrega-se disso (http://www.hesa.ac.uk/).

Não conseguiria dizer o mesmo das universidades portugueses. Por cá escasseiam os dados de acesso público, sobretudo em matéria financeira. Vagas, inscritos, diplomados e docentes permitem apenas traçar uma imagem muito parcial do sistema de ensino superior, revelando pouco sobre o seu desempenho e não constituindo uma base para qualquer discussão séria sobre a racionalidade ou irracionalidade do sistema, e sobre os caminhos a seguir. Pretende-se reduzir o número de instituições? Para reduzir custos? Para aumentar a dimensão? Para fomentar um melhor desempenho? Para atrair investimento? Para reordenar o território? E quais as consequências?

Esta reflexão, a propósito do Ensino Superior, aplica-se a muitos mais domínios do nosso quotidiano. Fala-se muito da sociedade do conhecimento mas estou convencido que ainda não chegamos sequer à sociedade da informação. Temos os meios tecnológicos mas parece faltar a vontade. Enquanto assim for o poder continuará a residir na posse privilegiada de informação, ou até na sua ausência, permitindo jogos e manipulações que de outra forma não seriam possíveis.

Sem comentários: