segunda-feira, 3 de dezembro de 2018
Subidas para baixo
No Observador de hoje:
"Portugal tem quatro escolas de negócios entre as 95 melhores da Europa: Católica-Lisbon, Nova SBE, Porto Business School e ISCTE. Esta última foi a portuguesa que mais subiu em relação ao ano passado."
Sinal "+", escolas a subir
Umas mais que as outras, como é normal.
Continuo a ler.
"(...) a Católica cai duas posições em relação ao ano anterior (...)"
Mau ...
Já sabemos que o ISCTE foi a que subiu mais.
A Católica desceu.
Restam duas.
"(...) movimento em que é acompanhada por todas as universidades portuguesas presentes nesta lista, exceto pela ISCTE Business School."
Ah!
Afinal, não.
O ISCTE foi de facto a que mais subiu.
E, em bom português, foi a única que subiu.
As outras subiram ..., como dizer ..., subiram para baixo.
A laia do jargão económico, estamos perante crescimentos negativos.
Mas cada título tem o seu impacto, implícito e explícito, com agrados e desagrados diversos:
(...) a escola portuguesa que mais subiu
(...) a única que subiu
(...) a única que não desceu
(...) a única descida negativa (também se deve poder dizer!)
domingo, 2 de dezembro de 2018
Discriminar exaustivamente
Texto, certamente em crescimento ao longo dos próximos tempos, que figura em muitos anúncios de emprego:
"O/a trabalhador/a ou candidato/a a emprego do setor privado ou público tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, não podendo ser privilegiado/a, beneficiado/a, prejudicado/a, privado/a de qualquer direito ou isento/a de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, devendo o Estado promover a igualdade de acesso a tais direitos."
Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego
Texto alternativo: "Nesta casa não se efetua qualquer tipo de discriminação".
sábado, 27 de outubro de 2018
É fazer as contas!
Em artigo de opinião publicado no Expresso, no dia 20 de outubro, na sua coluna semanal Confusion de Confusiones, João Duque, professor do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa, estimou o custo da redução da propina máxima no ensino superior público, inscrita na proposta de Orçamento de Estado para 2019, em 60 milhões de euros.
A conta é simples: cerca de 200€ a menos por cada um dos 300 000 estudantes inscritos.
Certo? Errado!
Primeiro, porque a medida não se aplica a todos os estudantes; retiremos os doutoramentos, os segundos ciclos não exigidos para exercer uma profissão, os estudantes em mobilidade internacional, a Universidade Aberta e o ensino policial e militar; em conjunto serão menos 65000 alunos (ou 13 milhões de euros).
Segundo, porque a perda não é de 200€ por cabeça, pelo simples facto de que muitas instituições não cobram a propina máxima; feitas as contas aos cursos técnicos superiores profissionais e ao diferencial real da propina em apenas três politécnicos e duas universidades, e temos 5,3 milhões a deduzir.
Já vamos em 18 milhões a menos, ou seja, 30% em relação ao estimado por João Duque. E fica ainda por fazer a conta às restantes instituições e aos alunos que, por beneficiarem da ação social, não pagam propinas. É obra, tamanho erro!
Confusiones, certamente.
quarta-feira, 10 de outubro de 2018
Espelho meu
Espelhos de refletir. Para ver o reflexo. Ou para o reflexo nos ver a nós. Para aumentar, encolher ou distorcer. Tudo imagens virtuais. Tudo imagens reais. Prefiro espelhos para refletir. E às vezes devolvem imagens surpreendentes. Para além da superfície. Como estas notas tentam.
Tudo isto para chegar aos rankings e ao modo como são tratados. Conhecimento e desconhecimento. Uso e abuso. Tema boomerang que volta ocasionalmente, por norma nas épocas próprias dos ditos. Quando são divulgados com estrondo. Rankings. Hierarquias. O primeiro e os outros. Orgulho. Aspiração. Meta. Comparar dentro de portas quando se diz que o desafio está lá fora. Décimas que fazem a diferença, como se a diferença fosse maior do que décimas. Comparando o que é comparável? Querendo, afinal, os que se proclamam únicos, quererem ser uns entre iguais, numa mesma régua, num mesmo fato, definido para todo o mundo, por alguém?
Desta vez foi o anúncio do Times Higher Education World University Rankings 2019. Que folheei com curiosidade morna, de quem já viu isto várias vezes, e o que se segue: as análises dos autores do dito, dos comentadores, dos jornais ou até das instituições.
Mas, desta vez, algo me chamou a atenção. Um dos indicadores não encaixa no discurso dominante. Talvez já fosse assim noutros anos, não verifiquei. Vamos a ele, ao indicador de "influência da investigação": as citações.
Aqui fica um extrato da metodologia utilizada e do significado atribuído;
Our research influence indicator looks at universities’ role in spreading new knowledge and ideas. We examine research influence by capturing the average number of times a university’s published work is cited by scholars globally. This year, our bibliometric data supplier Elsevier examined 67.9 million citations to 14.1 million journal articles, article reviews, conference proceedings, books and book chapters published over five years. (...) Citations to these publications made in the six years from 2013 to 2018 are also collected. The citations help to show us how much each university is contributing to the sum of human knowledge: they tell us whose research has stood out, has been picked up and built on by other scholars and, most importantly, has been shared around the global scholarly community to expand the boundaries of our understanding, irrespective of discipline.Mas vamos ao que a todos interessa.
Os resultados da liga.
Aceitam-se apostas!
Duvidam que muitos acertem no top 5!
Ou até no top 3!!!
Faça um esforço: pare; escreva ou pense no seu pódio e depois verifique.
Bem, aqui fica o panorama das instituições nacionais.
Por ordem decrescente.
Numa escala de 0 a 100.
Alto! Primeiro uns alertas!
Da praxe (não dessas outras praxes...).
a) Só figuram as instituições que "aderiram".
b) O ranking não é um "estudo" de todas as instituições.
c) As áreas de investigação em cada instituição, pese embora as normalizações que se possam fazer, afetam o resultado.
d) Também o tamanho e a heterogeneidade afetam o resultado de conjunto da instituição.
e) Nem toda a atividade de criação e impacto se mede, ou se mede melhor, por citações.
f) Mas como a tabela é só uma ...
Vamos lá então:
64,9 Politécnico do Porto
64,3 Universidade Católica
55,7 Universidade do Porto
52,4 Universidade de Lisboa
50,7 Universidade da Beira Interior
46,3 Universidade de Coimbra
45,6 Universidade Nova de Lisboa
43,4 Universidade de Aveiro
41,1 Universidade do Algarve
39,4 Universidade do Minho
34,1 Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
32,2 Universidade de Évora
25,0 ISCTE
Já agora, 300 das instituições participantes na edição de 2019 têm valores iguais ou superiores a 75.
sábado, 22 de setembro de 2018
Nos cabeçalhos
News. Apenas 7 pontos no scrabble, se não conseguir atingir as casas que dão bónus. Palavra de pouco impacto, portanto. E, hoje, fico-me mesmo só pelo cabeçalho e pela introdução de notícias, sem ir mais além. Duas notícias, uma no Público e outra no Expresso.
"Investigadores criticam concurso da FCT que negou contrato a 3500 candidatos", lê-se no Público. Um concurso que negou contratos. Aos milhares. Contratos de investigadores. Independentemente das críticas, porventura justas, ao processo, às avaliações e, portanto aos resultados, há aqui um ... torcicolo. Com mais ou menos intenção. Por convicção do que devia, ou podia, ser, mas que não é. O concurso não se destinava a selecionar todos os que atingissem determinado patamar. O concurso não se destinava a avaliar o mérito absoluto. Destinava-se, como foi anunciado desde início, a celebrar 500 contratos. O número de contratos "negados" ficava assim apenas dependente do número de candidatos. Se foram 4000 os candidatos, 3500 não obtiveram contrato.
“Não podemos punir nem temos qualquer quadro jurídico normativo exterior ao próprio espaço da universidade”, diz ao Expresso o Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e Reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Está a falar de praxes. De praxes más ou de excessos. Fruta da época. Em que muita será boa e alguma não o será de todo. Também aqui não está em causa o que as Universidades podem, poderiam ou deviam. O que está em causa é a contradição deste discurso com as normas das próprias instituições, de algumas delas, pelo menos. Por desconhecimento ou à procura de conforto. Duvido que tenha havido grandes alterações desde um tempo recente, em que o Presidente do CRUP era outro e de outra universidade, mas o discurso era o mesmo, e o jornal também. Não fui verificar. Mas reproduzo o que aqui escrevi em 21 de maio de 2017, há portanto pouco mais de um ano. Curiosamente, uma das instituições que referi era a ... UTAD.
"Os regulamentos disciplinares são elaborados e aprovados pelas próprias instituições, no exercício da autonomia disciplinar que lhes é conferida. E não são todos iguais. Sem ter feito uma pesquisa exaustiva, encontrei três que abrangem, de forma explícita, condutas dos estudantes "ainda que fora das instalações". Os das Universidades do Algarve, de Aveiro e de Trás-os-Montes e Alto Douro. E também com diferenças entre elas. O braço disciplinar das Universidades, pelo menos o de algumas, é mais longo, alcançando território exterior."
https://notasdasuperficie.blogspot.com/2017/05/o-mais-ou-menos-longo-braco-das.html
quinta-feira, 16 de agosto de 2018
Com as mãos na massa
Escolhendo. A forma. O tempo. O modo. De intervir. Procurando que faça sentido. Procurando que tenha efeito. Escolhendo. Neste caso a massa de que as leis se fazem. As leis que tantas vezes criticamos. Depois. Quando já estão feitas. Por outros. Escolhendo. O tempo. O tempo em que as leis são feitas. Quando ainda podem sem moldadas. Quando ainda é possível fazer críticas. Ou sugestões. Argumentando. Escolhendo. Apenas um ponto. Um ponto pequeno que pode ser grande. Focando a atenção. Passando por vários pontos. De interrogação. Ou interrogações. Várias. Porquê assim? Para quê? De exclamação. À medida das contradições! De reticências. Pontos em fila. Procurando adivinhar o que não lá está. Ponto final. Acabado o trabalho. Entregue o contributo.
O Governo colocou, há alguns meses, em consulta pública, a proposta de alteração ao Regime Jurídico dos Graus e Diplomas do Ensino Superior. Algumas das alterações propostas foram notícia. Politécnicos a atribuírem o grau de Doutor. O fim dos mestrados integrados nas engenharias. Mais exigência na composição do conjunto de docentes. Outras nem tanto. Como o modelo de curso para atribuição do grau de doutor. Apenas um número no meio de muitos números. E de muitos artigos. Alteração ao número 3 do artigo Artigo 31.º. Escolhendo. Focando. Procurando compreender. Analisando. Comparando. E, finalmente, propondo.
A proposta do Governo preconizava, na essência, o regresso, por norma, ao anterior modelo de doutoramento individual, sendo a componente curricular a exceção, justificada no processo de acreditação, e confinada à formação para a investigação:
"O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de investigação e desenvolvimento de alto nível, podendo, excecionalmente e quando devidamente justificado no âmbito do processo de acreditação, integrar a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação.”A proposta de alteração que apresentei no âmbito da consulta pública:
"O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de investigação e desenvolvimento de alto nível, podendo, excecionalmente e quando devidamente justificado no âmbito do processo de acreditação, integrar a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação e ou ao desenvolvimento de competências complementares."
"O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de I&D de alto nível, podendo, eventualmente, integrar, quando as respetivas normas regulamentares justificadamente o prevejam, a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação e/ou o desenvolvimento de competências complementares, cujo conjunto se denomina curso de doutoramento, fixando-se, nesse caso, as condições em que deve ser dispensada a frequência desse curso."
Foi removido a "excecionalidade" das unidades curriculares.
Foi removida a ligação específica ao processo de acreditação.
Foi alargado o âmbito das unidades curriculares ao desenvolvimento de competências complementares.
Ponto de exclamação e Ponto final.
Aqui fica também, em modo público e integral, a análise da proposta do Governo e a fundamentação da proposta que apresentei no processo de Consulta Pública:
1. O projeto em análise altera o n.º 3 do artigo 31.º, propondo a seguinte redação: “O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de investigação e desenvolvimento de alto nível, podendo, excecionalmente e quando devidamente justificado no âmbito do processo de acreditação, integrar a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação.”.
2. Esta será a segunda alteração que incide sobre a realização de unidades curriculares no âmbito de um ciclo de estudos conducente ao grau de doutor.
3. O Regime Jurídico dos Graus e Diplomas do Ensino Superior, na versão original, determinava que “O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor integra: a) A elaboração de uma tese original e especialmente elaborada para este fim, adequada à natureza do ramo de conhecimento ou da especialidade; b) A eventual realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação, cujo conjunto se denomina curso de doutoramento, sempre que as respectivas normas regulamentares o prevejam.”. [1]
4. A inclusão de unidades curriculares num ciclo de estudos desta natureza era, pois, considerada de caráter eventual e carecendo de enquadramento regulamentar.
5. Esta disposição foi objeto, em 2009, de alteração significativa, autonomizando em número próprio a anterior alínea a), introduzindo a possibilidade de obtenção do grau de doutor com base em compilação de trabalhos de investigação ou, no domínio das artes, por obra realizada, e, ainda, alterando a anterior alínea b), referente à realização de unidades curriculares. [2]
6. Assim, foi introduzido um número três com a seguinte redação: “O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de investigação de alto nível, podendo, eventualmente, integrar, quando as respectivas normas regulamentares justificadamente o prevejam, a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação, cujo conjunto se denomina curso de doutoramento, fixando-se, nesse caso, as condições em que deve ser dispensada a frequência desse curso.”.
7. Reforçado, deste modo, o caráter eventual da realização de unidades curriculares com uma acrescida necessidade de justificação.
8. A proposta agora em análise confere um cariz de excecionalidade à realização de unidades curriculares, impõe a necessidade de justificação no âmbito do processo de acreditação e mantém uma orientação de tais unidades para a “formação para a investigação”.
9. Como é expresso no ponto seis da nota introdutória do Projeto, “É reforçado o caráter excecional da existência de unidades curriculares nos ciclos de estudos conducentes ao grau de doutor, considerando que este deve ser especialmente orientado para a realização d[e] atividades de I&D devendo deve ter uma componente letiva apenas quando devidamente justificado;”.
10. Não é apresentada qualquer argumentação que indicie a inadequação, existência de problemas ou menor valia de doutoramentos baseados em programas doutorais, os quais incluem, frequentemente, um conjunto de unidades curriculares, obrigatórias e ou opcionais.
11. Não é apresentada qualquer argumentação que suporte a atribuição de um caráter de excecionalidade às unidades curriculares.
12. Não é apresentada qualquer argumentação que suporte a necessidade de promover uma uniformização da organização dos ciclos de estudo conducentes ao grau de doutor.
13. A proposta em análise restringe a autonomia pedagógica científica e pedagógica das instituições de ensino superior e reduz a diversidade de organização dos ciclos de estudo conducentes ao grau de doutor.
14. Na falta de justificação mais detalhada para esta alteração, poderá subentender-se que se pretende privilegiar um modelo de doutoramento baseado, por norma e de forma quase exclusiva, na realização de atividades de investigação, naquilo que poderá ser designado por modelo de doutoramento individual.
15. E que o referido modelo é (será) imposto por via legislativa.
Sobre autonomia e regulação
16. As instituições de ensino superior dispõem de autonomia científica e pedagógica, nos termos estabelecidos no Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES)[3].
17. “A autonomia científica confere às instituições de ensino superior públicas a capacidade de definir, programar e executar a investigação e demais actividades científicas, sem prejuízo dos critérios e procedimentos de financiamento público da investigação.”, conforme artigo 73.º do RJIES.
18. “A autonomia pedagógica confere às instituições de ensino superior públicas a capacidade para elaborar os planos de estudos, definir o objecto das unidades curriculares, definir os métodos de ensino, afectar os recursos e escolher os processos de avaliação de conhecimentos, gozando os professores e estudantes de liberdade intelectual nos processos de ensino e de aprendizagem.”, conforme artigo 74.º.
19. Adicionalmente, a entrada em funcionamento de um ciclo de estudo carece de acreditação prévia por uma entidade independente, a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), conforme disposto no artigo 54.º do DL 74/2006.
20. Situação diversa verifica-se, por exemplo, num número significativo de países do Norte da Europa, em que a introdução de novos ciclos de estudo se insere na esfera de autonomia das instituições de ensino superior.
21. Este é, aliás, um dos aspetos que contribui para que as instituições nacionais sejam consideradas como tendo “média-baixa” autonomia académica, num estudo comparativo conduzido pela European University Association[4].
22. Os procedimentos de avaliação conduzidos pela A3ES têm por objeto, designadamente, a aferição “Da qualidade dos ciclos de estudos conducentes aos graus de licenciado, mestre e doutor, para efeitos da respetiva acreditação.”.
23. E incidem sobre aspetos como “Ambiente de ensino e aprendizagem”, “Objetivos de aprendizagem, estrutura curricular e plano de estudos”, “Organização das unidades curriculares”, “Metodologias de ensino e aprendizagem”. [5]
24. A análise de relatórios elaborados pelas Comissões de Avaliação Externa (CAE) de ciclos de estudos conducentes ao grau de doutor, disponíveis no sítio da A3ES[6] permite evidenciar a diversidade de abordagem institucional e o modo como a respetiva (in)adequação é avaliada em sede de acreditação prévia.
25. Veja-se, a título de exemplo, os seguintes excertos.
26. “O curso compreende apenas o desenvolvimento de trabalho de investigação, o que é admissível para um curso de 3º ciclo. (…) Poderia fazer sentido introduzir no currículo do curso uma unidade curricular de introdução aos métodos de investigação científica e desenvolvimento de competências transversais.”.[7]
27. “O programa de doutoramento consiste num curso com a duração de dois semestres, uma fase de preparação de tese de trabalho autónomo do aluno e uma última fase de desenvolvimento da tese. É na fase inicial (curso) que funcionam as unidades curriculares que se organizam como seminários onde são definidas as competências a desenvolver e as metodologias assentam na participação e diálogo colectivo para aprofundamento de métodos e conteúdos que interessam aos processos de investigação. Em cada semestre o estudante frequenta unidades curriculares obrigatórias e duas por escolha opcional, perfazendo 30 créditos ECTS. Compete ao estudante estabelecer a coordenação entre os conteúdos dos seminários obrigatórios e facultativos para garantir a coerência com os seus próprios objectivos. 6.2.7. Pontos Fortes. A organização em regime de seminários e o elevado grau de opcionalidade com diversidade de conteúdos oferecidos. Em particular, a possibilidade de optar por frequência parcial em universidades nacionais ou estrangeiras com as quais existam acordos de cooperação. 6.2.8. Recomendações de melhoria. A componente de unidades curriculares obrigatórias facilitaria a focagem do ciclo de estudos em campo mais restrito em conformidade com os objectivos de referência."[8]
28. O conteúdo expresso das avaliações e das recomendações, para além da mera conformidade com o quadro legal, permite concluir que há uma efetiva valorização, em determinados contextos, mas não apenas em contextos excecionais, da existência de determinadas componentes curriculares.
29. Uma valorização efetuada pelas CAE, pelas instituições e pelos próprios doutorandos.
30. É possível afirmar que a modalidade de doutoramento baseado exclusivamente, ou quase exclusivamente, em atividades de investigação é igualmente acolhido em sede de acreditação.
31. É de notar que várias das decisões de não acreditação de ciclos de estudos conducentes ao grau de doutor, provavelmente a maioria, se baseiam, fundamentalmente, em atividade de investigação, e ou corpo docente, considerados insuficientes na área do ciclo de estudos proposto.
32. O modelo em vigor de ciclos de estudo e o modelo de avaliação e acreditação parecem estar a funcionar efetivamente, avaliando objetivos, estrutura e meios, considerando práticas internacionais e conduzindo a decisões de acreditação e de não acreditação de propostas de novos ciclos de estudo.
33. E permite a existência de abordagens diversificadas.
Uma perspetiva internacional
34. O documento síntese da recente avaliação da OCDE[9], solicitada pelo Governo, inclui uma secção dedicada à formação doutoral, que contém, entre outros, os seguintes excertos.
35. “Doctoral training in Portugal is structured in doctoral programmes, which must receive prior accreditation from the Agency for Assessment and Accreditation of Higher Education (A3ES). This provides a basic guarantee of quality.” [parágrafo 85, pág. 35].
36. “Training had traditionally focused almost exclusively on individual research and research-specific skills, with limited focus on helping candidates to develop their other skills sets (communication, teaching, management etc.) for work inside or outside academia.” [parágrafo 85, pág. 36].
37. Sobre a ligação a carreiras fora do sector estritamente académico e científico “(…) there is in many cases limited direct alignment between the thematic focus of PhDs and possible applications of this knowledge, and associated skills acquired by PhD holders in the wider economy.” [parágrafo 90, pág. 37].
38. E como recomendação “[Funded programmes should have certain shared characteristics]: (…) A set of relevant common training components, including a focus on transferable skills relevant to careers outside academia.” [pág. 39].
39. Realça-se a importância atribuída ao desenvolvimento de competências que promovam a integração posterior dos doutorandos em carreiras diversas, bem como a recomendação expressa sobre a existência de um conjunto de componentes comuns.
40. Semelhantes preocupações encontram-se expressas noutros documentos internacionais de referência sobre formação doutoral.
41. É o caso dos designados princípios de Salzburg[10]: “Demands on today’s researchers are therefore wider and this has to be reflected in the structure and organisation of doctoral programmes. Training in transferable, “generic” skills and competences should become an integral part of all doctoral programmes in order to meet challenges and needs of the global labour market. (…) Although there may be a disagreement among university representatives whether courses in transferable skills should be mandatory or voluntary, all agree that it is very important to offer these courses to all doctoral candidates. Training in transferable skills should, however, form only a small part of doctoral training and should not be overemphasised with respect to original research”.
42. De documentos da Comissão Europeia[11]: “It is essential to ensure that enough researchers have the skills demanded by the knowledge based economy. Examples include communication, teamwork, entrepreneurship, project management, IPR, ethics, standardisation etc.”.
43. Da Associação Europeia de Universidades[12]: “Transferable skills development should be an integral part of first, second and third cycle programmes. The main goal at the level of the third cycle should be to raise awareness among doctoral candidates of the importance of both recognising and enhancing the skills that they develop and acquire through research, as a means of improving their employment prospects both in academia and on the wider labour market. Courses should be offered in the context of whatever overarching institutional support structures are in place at doctoral level. Training can be organised in different ways ranging from traditional courses and lectures to more student-centered methods, especially through learning by doing at institutional, interinstitutional and international summer schools or through specialised institutional or inter-institutional support and personal development centres.”
44. Ou ainda da League of European Research Universities[13]: “The second level involves the quality of each doctoral research training programme, which may be either an individual or a structured programme within a cohort.”.
45. Os documentos referidos não são prescritivos quanto às abordagens a adotar, antes admitindo que determinados aspetos podem ser desenvolvidos no contexto direto das atividades de investigação, enquanto outros beneficiam de programas estruturados, sessões organizadas e atividades em grupo.
46. Uma breve pesquisa em universidades de referência de diversos países, permite sublinhar a coexistência de diversos modelos de programas conducentes ao grau de doutor.
47. Veja-se, a título exemplificativo, a informação disponível na Interdisciplinary Graduate School da Nanyang Technological University, Singapura[14], no PhD Program in Science & Policy, da Universidade de Zurique, ETH de Zurique e Universidade de Basileia[15], no PhD in Plant Sciences da Universidade de Cambridge[16], no Doctoral Programme in Economics da Universidade de Helsínquia[17], ou na Humboldt Graduate School[18].
48. Ou ainda os requisitos definidos para a obtenção do grau de Ph.D. na Universidade de Harvard[19]: “The Ph.D. requires a minimum full-time academic residency of two years beyond the bachelor’s degree. Programs are individually tailored and approved by a committee on higher degrees. Normally, students spend one-and-one-half to two years on oursework. 10 semester-long courses, including at least 8 disciplinary, are required. Depth and breadth of knowledge are important guiding principles in the Ph.D. program. The first year is ordinarily spent principally on coursework, although some students may begin research. The second year is usually divided between coursework and research, with coursework completed during the third year if necessary. As soon as coursework is completed, students conduct research full time. Original research culminating in the dissertation is usually completed in the fourth or fifth year.”
49. Verifica-se que existe uma grande diversidade quanto à organização de programas de estudo conducente ao grau de doutor, onde se inclui atividade exclusiva de investigação de base individual, atividade predominante de investigação eventualmente complementada com sessões de grupo e seminários, programas flexíveis estruturados com base em opções individuais de cada doutorando, programas estruturados com componentes curriculares obrigatórias e opcionais, programas estruturados com componentes curriculares obrigatórias.
50. Considera-se esta diversidade benéfica, desde que adequadamente comunicada aos potenciais estudantes e avaliada em termos da adequação aos objetivos e à qualidade do ciclo de estudos, permitindo uma escolha mais condizente com a experiência académica e profissional de cada candidato, os seus interesses de investigação e perspetivas de desenvolvimento de carreira.
Em síntese
51. A concessão do grau de doutor requer a elaboração de uma tese original (ou uma das modalidades alternativas já legalmente consagradas), aspeto central do ciclo de estudos que não é alterado pelo Projeto do DL 38/2018 nem pela proposta alternativa formulada neste documento.
Foi removida a ligação específica ao processo de acreditação.
Foi alargado o âmbito das unidades curriculares ao desenvolvimento de competências complementares.
Ponto de exclamação e Ponto final.
Aqui fica também, em modo público e integral, a análise da proposta do Governo e a fundamentação da proposta que apresentei no processo de Consulta Pública:
Sobre a proposta do Governo
1. O projeto em análise altera o n.º 3 do artigo 31.º, propondo a seguinte redação: “O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de investigação e desenvolvimento de alto nível, podendo, excecionalmente e quando devidamente justificado no âmbito do processo de acreditação, integrar a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação.”.
2. Esta será a segunda alteração que incide sobre a realização de unidades curriculares no âmbito de um ciclo de estudos conducente ao grau de doutor.
3. O Regime Jurídico dos Graus e Diplomas do Ensino Superior, na versão original, determinava que “O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor integra: a) A elaboração de uma tese original e especialmente elaborada para este fim, adequada à natureza do ramo de conhecimento ou da especialidade; b) A eventual realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação, cujo conjunto se denomina curso de doutoramento, sempre que as respectivas normas regulamentares o prevejam.”. [1]
4. A inclusão de unidades curriculares num ciclo de estudos desta natureza era, pois, considerada de caráter eventual e carecendo de enquadramento regulamentar.
5. Esta disposição foi objeto, em 2009, de alteração significativa, autonomizando em número próprio a anterior alínea a), introduzindo a possibilidade de obtenção do grau de doutor com base em compilação de trabalhos de investigação ou, no domínio das artes, por obra realizada, e, ainda, alterando a anterior alínea b), referente à realização de unidades curriculares. [2]
6. Assim, foi introduzido um número três com a seguinte redação: “O ciclo de estudos conducente ao grau de doutor deve visar essencialmente a aprendizagem orientada da prática de investigação de alto nível, podendo, eventualmente, integrar, quando as respectivas normas regulamentares justificadamente o prevejam, a realização de unidades curriculares dirigidas à formação para a investigação, cujo conjunto se denomina curso de doutoramento, fixando-se, nesse caso, as condições em que deve ser dispensada a frequência desse curso.”.
7. Reforçado, deste modo, o caráter eventual da realização de unidades curriculares com uma acrescida necessidade de justificação.
8. A proposta agora em análise confere um cariz de excecionalidade à realização de unidades curriculares, impõe a necessidade de justificação no âmbito do processo de acreditação e mantém uma orientação de tais unidades para a “formação para a investigação”.
9. Como é expresso no ponto seis da nota introdutória do Projeto, “É reforçado o caráter excecional da existência de unidades curriculares nos ciclos de estudos conducentes ao grau de doutor, considerando que este deve ser especialmente orientado para a realização d[e] atividades de I&D devendo deve ter uma componente letiva apenas quando devidamente justificado;”.
10. Não é apresentada qualquer argumentação que indicie a inadequação, existência de problemas ou menor valia de doutoramentos baseados em programas doutorais, os quais incluem, frequentemente, um conjunto de unidades curriculares, obrigatórias e ou opcionais.
11. Não é apresentada qualquer argumentação que suporte a atribuição de um caráter de excecionalidade às unidades curriculares.
12. Não é apresentada qualquer argumentação que suporte a necessidade de promover uma uniformização da organização dos ciclos de estudo conducentes ao grau de doutor.
13. A proposta em análise restringe a autonomia pedagógica científica e pedagógica das instituições de ensino superior e reduz a diversidade de organização dos ciclos de estudo conducentes ao grau de doutor.
14. Na falta de justificação mais detalhada para esta alteração, poderá subentender-se que se pretende privilegiar um modelo de doutoramento baseado, por norma e de forma quase exclusiva, na realização de atividades de investigação, naquilo que poderá ser designado por modelo de doutoramento individual.
15. E que o referido modelo é (será) imposto por via legislativa.
Sobre autonomia e regulação
16. As instituições de ensino superior dispõem de autonomia científica e pedagógica, nos termos estabelecidos no Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES)[3].
17. “A autonomia científica confere às instituições de ensino superior públicas a capacidade de definir, programar e executar a investigação e demais actividades científicas, sem prejuízo dos critérios e procedimentos de financiamento público da investigação.”, conforme artigo 73.º do RJIES.
18. “A autonomia pedagógica confere às instituições de ensino superior públicas a capacidade para elaborar os planos de estudos, definir o objecto das unidades curriculares, definir os métodos de ensino, afectar os recursos e escolher os processos de avaliação de conhecimentos, gozando os professores e estudantes de liberdade intelectual nos processos de ensino e de aprendizagem.”, conforme artigo 74.º.
19. Adicionalmente, a entrada em funcionamento de um ciclo de estudo carece de acreditação prévia por uma entidade independente, a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), conforme disposto no artigo 54.º do DL 74/2006.
20. Situação diversa verifica-se, por exemplo, num número significativo de países do Norte da Europa, em que a introdução de novos ciclos de estudo se insere na esfera de autonomia das instituições de ensino superior.
21. Este é, aliás, um dos aspetos que contribui para que as instituições nacionais sejam consideradas como tendo “média-baixa” autonomia académica, num estudo comparativo conduzido pela European University Association[4].
22. Os procedimentos de avaliação conduzidos pela A3ES têm por objeto, designadamente, a aferição “Da qualidade dos ciclos de estudos conducentes aos graus de licenciado, mestre e doutor, para efeitos da respetiva acreditação.”.
23. E incidem sobre aspetos como “Ambiente de ensino e aprendizagem”, “Objetivos de aprendizagem, estrutura curricular e plano de estudos”, “Organização das unidades curriculares”, “Metodologias de ensino e aprendizagem”. [5]
24. A análise de relatórios elaborados pelas Comissões de Avaliação Externa (CAE) de ciclos de estudos conducentes ao grau de doutor, disponíveis no sítio da A3ES[6] permite evidenciar a diversidade de abordagem institucional e o modo como a respetiva (in)adequação é avaliada em sede de acreditação prévia.
25. Veja-se, a título de exemplo, os seguintes excertos.
26. “O curso compreende apenas o desenvolvimento de trabalho de investigação, o que é admissível para um curso de 3º ciclo. (…) Poderia fazer sentido introduzir no currículo do curso uma unidade curricular de introdução aos métodos de investigação científica e desenvolvimento de competências transversais.”.[7]
27. “O programa de doutoramento consiste num curso com a duração de dois semestres, uma fase de preparação de tese de trabalho autónomo do aluno e uma última fase de desenvolvimento da tese. É na fase inicial (curso) que funcionam as unidades curriculares que se organizam como seminários onde são definidas as competências a desenvolver e as metodologias assentam na participação e diálogo colectivo para aprofundamento de métodos e conteúdos que interessam aos processos de investigação. Em cada semestre o estudante frequenta unidades curriculares obrigatórias e duas por escolha opcional, perfazendo 30 créditos ECTS. Compete ao estudante estabelecer a coordenação entre os conteúdos dos seminários obrigatórios e facultativos para garantir a coerência com os seus próprios objectivos. 6.2.7. Pontos Fortes. A organização em regime de seminários e o elevado grau de opcionalidade com diversidade de conteúdos oferecidos. Em particular, a possibilidade de optar por frequência parcial em universidades nacionais ou estrangeiras com as quais existam acordos de cooperação. 6.2.8. Recomendações de melhoria. A componente de unidades curriculares obrigatórias facilitaria a focagem do ciclo de estudos em campo mais restrito em conformidade com os objectivos de referência."[8]
28. O conteúdo expresso das avaliações e das recomendações, para além da mera conformidade com o quadro legal, permite concluir que há uma efetiva valorização, em determinados contextos, mas não apenas em contextos excecionais, da existência de determinadas componentes curriculares.
29. Uma valorização efetuada pelas CAE, pelas instituições e pelos próprios doutorandos.
30. É possível afirmar que a modalidade de doutoramento baseado exclusivamente, ou quase exclusivamente, em atividades de investigação é igualmente acolhido em sede de acreditação.
31. É de notar que várias das decisões de não acreditação de ciclos de estudos conducentes ao grau de doutor, provavelmente a maioria, se baseiam, fundamentalmente, em atividade de investigação, e ou corpo docente, considerados insuficientes na área do ciclo de estudos proposto.
32. O modelo em vigor de ciclos de estudo e o modelo de avaliação e acreditação parecem estar a funcionar efetivamente, avaliando objetivos, estrutura e meios, considerando práticas internacionais e conduzindo a decisões de acreditação e de não acreditação de propostas de novos ciclos de estudo.
33. E permite a existência de abordagens diversificadas.
Uma perspetiva internacional
34. O documento síntese da recente avaliação da OCDE[9], solicitada pelo Governo, inclui uma secção dedicada à formação doutoral, que contém, entre outros, os seguintes excertos.
35. “Doctoral training in Portugal is structured in doctoral programmes, which must receive prior accreditation from the Agency for Assessment and Accreditation of Higher Education (A3ES). This provides a basic guarantee of quality.” [parágrafo 85, pág. 35].
36. “Training had traditionally focused almost exclusively on individual research and research-specific skills, with limited focus on helping candidates to develop their other skills sets (communication, teaching, management etc.) for work inside or outside academia.” [parágrafo 85, pág. 36].
37. Sobre a ligação a carreiras fora do sector estritamente académico e científico “(…) there is in many cases limited direct alignment between the thematic focus of PhDs and possible applications of this knowledge, and associated skills acquired by PhD holders in the wider economy.” [parágrafo 90, pág. 37].
38. E como recomendação “[Funded programmes should have certain shared characteristics]: (…) A set of relevant common training components, including a focus on transferable skills relevant to careers outside academia.” [pág. 39].
39. Realça-se a importância atribuída ao desenvolvimento de competências que promovam a integração posterior dos doutorandos em carreiras diversas, bem como a recomendação expressa sobre a existência de um conjunto de componentes comuns.
40. Semelhantes preocupações encontram-se expressas noutros documentos internacionais de referência sobre formação doutoral.
41. É o caso dos designados princípios de Salzburg[10]: “Demands on today’s researchers are therefore wider and this has to be reflected in the structure and organisation of doctoral programmes. Training in transferable, “generic” skills and competences should become an integral part of all doctoral programmes in order to meet challenges and needs of the global labour market. (…) Although there may be a disagreement among university representatives whether courses in transferable skills should be mandatory or voluntary, all agree that it is very important to offer these courses to all doctoral candidates. Training in transferable skills should, however, form only a small part of doctoral training and should not be overemphasised with respect to original research”.
42. De documentos da Comissão Europeia[11]: “It is essential to ensure that enough researchers have the skills demanded by the knowledge based economy. Examples include communication, teamwork, entrepreneurship, project management, IPR, ethics, standardisation etc.”.
43. Da Associação Europeia de Universidades[12]: “Transferable skills development should be an integral part of first, second and third cycle programmes. The main goal at the level of the third cycle should be to raise awareness among doctoral candidates of the importance of both recognising and enhancing the skills that they develop and acquire through research, as a means of improving their employment prospects both in academia and on the wider labour market. Courses should be offered in the context of whatever overarching institutional support structures are in place at doctoral level. Training can be organised in different ways ranging from traditional courses and lectures to more student-centered methods, especially through learning by doing at institutional, interinstitutional and international summer schools or through specialised institutional or inter-institutional support and personal development centres.”
44. Ou ainda da League of European Research Universities[13]: “The second level involves the quality of each doctoral research training programme, which may be either an individual or a structured programme within a cohort.”.
45. Os documentos referidos não são prescritivos quanto às abordagens a adotar, antes admitindo que determinados aspetos podem ser desenvolvidos no contexto direto das atividades de investigação, enquanto outros beneficiam de programas estruturados, sessões organizadas e atividades em grupo.
46. Uma breve pesquisa em universidades de referência de diversos países, permite sublinhar a coexistência de diversos modelos de programas conducentes ao grau de doutor.
47. Veja-se, a título exemplificativo, a informação disponível na Interdisciplinary Graduate School da Nanyang Technological University, Singapura[14], no PhD Program in Science & Policy, da Universidade de Zurique, ETH de Zurique e Universidade de Basileia[15], no PhD in Plant Sciences da Universidade de Cambridge[16], no Doctoral Programme in Economics da Universidade de Helsínquia[17], ou na Humboldt Graduate School[18].
48. Ou ainda os requisitos definidos para a obtenção do grau de Ph.D. na Universidade de Harvard[19]: “The Ph.D. requires a minimum full-time academic residency of two years beyond the bachelor’s degree. Programs are individually tailored and approved by a committee on higher degrees. Normally, students spend one-and-one-half to two years on oursework. 10 semester-long courses, including at least 8 disciplinary, are required. Depth and breadth of knowledge are important guiding principles in the Ph.D. program. The first year is ordinarily spent principally on coursework, although some students may begin research. The second year is usually divided between coursework and research, with coursework completed during the third year if necessary. As soon as coursework is completed, students conduct research full time. Original research culminating in the dissertation is usually completed in the fourth or fifth year.”
49. Verifica-se que existe uma grande diversidade quanto à organização de programas de estudo conducente ao grau de doutor, onde se inclui atividade exclusiva de investigação de base individual, atividade predominante de investigação eventualmente complementada com sessões de grupo e seminários, programas flexíveis estruturados com base em opções individuais de cada doutorando, programas estruturados com componentes curriculares obrigatórias e opcionais, programas estruturados com componentes curriculares obrigatórias.
50. Considera-se esta diversidade benéfica, desde que adequadamente comunicada aos potenciais estudantes e avaliada em termos da adequação aos objetivos e à qualidade do ciclo de estudos, permitindo uma escolha mais condizente com a experiência académica e profissional de cada candidato, os seus interesses de investigação e perspetivas de desenvolvimento de carreira.
Em síntese
51. A concessão do grau de doutor requer a elaboração de uma tese original (ou uma das modalidades alternativas já legalmente consagradas), aspeto central do ciclo de estudos que não é alterado pelo Projeto do DL 38/2018 nem pela proposta alternativa formulada neste documento.
52. A alteração ao artigo 31.º que consta do Projeto parece privilegiar um único modelo de formação doutoral, carece de fundamentação, restringe a autonomia institucional, a diversidade da oferta e, consequentemente, o grau de escolha dos doutorandos.
53. A referida alteração não está adequadamente justificada.
54. Considera-se possível, adequada e desejável a existência de diferentes estruturas de programas conducentes ao grau de doutor, designadamente através da introdução de componentes curriculares.
55. Considera-se que tais estruturas permitem uma resposta mais adequada à diversidade de públicos, quanto à sua formação académica e profissional, à crescente multidisciplinaridade e interdisciplinaridade presentes na investigação, à prossecução de diferentes percursos após o doutoramento e ao desenvolvimento complementar de outros aspetos de cada estudante de doutoramento.
56. A sede atual de avaliação da adequação do programa de estudos, em termos de objetivos, estrutura, recursos e perfil de admissão, é a acreditação prévia a cargo da A3ES e a subsequente reavaliação periódica.
57. E compete às instituições de ensino superior, no exercício da sua autonomia científica e pedagógica desenvolver e submeter propostas de ciclos de estudo.
58. Não se considera necessária uma restrição adicional por via legislativa nesta matéria, antes pelo contrário, considera-se positivo alargar o leque de valências complementares disponíveis.
Referências
53. A referida alteração não está adequadamente justificada.
54. Considera-se possível, adequada e desejável a existência de diferentes estruturas de programas conducentes ao grau de doutor, designadamente através da introdução de componentes curriculares.
55. Considera-se que tais estruturas permitem uma resposta mais adequada à diversidade de públicos, quanto à sua formação académica e profissional, à crescente multidisciplinaridade e interdisciplinaridade presentes na investigação, à prossecução de diferentes percursos após o doutoramento e ao desenvolvimento complementar de outros aspetos de cada estudante de doutoramento.
56. A sede atual de avaliação da adequação do programa de estudos, em termos de objetivos, estrutura, recursos e perfil de admissão, é a acreditação prévia a cargo da A3ES e a subsequente reavaliação periódica.
57. E compete às instituições de ensino superior, no exercício da sua autonomia científica e pedagógica desenvolver e submeter propostas de ciclos de estudo.
58. Não se considera necessária uma restrição adicional por via legislativa nesta matéria, antes pelo contrário, considera-se positivo alargar o leque de valências complementares disponíveis.
Referências
[1] Decreto-Lei 74/2006, de 24 de março, artigo 31.º, parágrafo único.
[2] Decreto-Lei 230/2009, de 14 de setembro, artigo 31.º, n.os 1 a 3.
[3] Lei 62/2007, de 10 de setembro.
[4] EUA Autonomy Scorecard, http://www.university-autonomy.eu/countries/portugal/.
[5] Regulamento nº 392/2013 - Aprova o regime dos procedimentos de avaliação e de acreditação das instituições de ensino superior e dos seus ciclos de estudos, 1 de outubro.
[6] http://www.a3es.pt/pt/acreditacao-e-auditoria/resultados-dos-processos-de-acreditacao/acreditacao-de-ciclos-de-estudos.
[7] ACEF/1314/04592 — Relatório preliminar da CAE, Ciência e Tecnologia do Ambiente, F. Ciências - U. Porto.
[8] ACEF/1213/06987 — Relatório preliminar da CAE, Engenharia do Território, IST-UL.
[9] OECD Review of the Tertiary Education, Research and Innovation System in Portugal – Summary document, for official use, 2018.
[10] Bologna Seminar Doctoral Programmes for the European Knowledge Society, Salzburg, 2005.
[11] Principles for Innovative Doctoral Training, European Commission, DG Research & Innovation, 2011.
[12] Doctoral Programmes in Europe’s Universities: Achievements and Challenges Report prepared for European Universities and Ministers of Higher Education, EUA, 2007.
[13] Maintaining a quality culture in doctoral education at research-intensive universities, LERU, 2016.
[14] http://igs.ntu.edu.sg/Programmes/Prospective%20Students/Pages/Programme-Highlights.aspx
[15] http://www.plantsciences.uzh.ch/en/teaching/phdsciencepolicy.html
[16] https://www.graduate.study.cam.ac.uk/courses/directory/blpspdpsc/study
[17]https://www.helsinki.fi/en/doctoral-programme-in-economics-4-years/1.2.246.562.17.17997976349
[18] https://www.humboldt-graduate-school.de/en/pr-en/academic-training
[19] https://www.seas.harvard.edu/academics/graduate/graduate-degree-requirements
[2] Decreto-Lei 230/2009, de 14 de setembro, artigo 31.º, n.os 1 a 3.
[3] Lei 62/2007, de 10 de setembro.
[4] EUA Autonomy Scorecard, http://www.university-autonomy.eu/countries/portugal/.
[5] Regulamento nº 392/2013 - Aprova o regime dos procedimentos de avaliação e de acreditação das instituições de ensino superior e dos seus ciclos de estudos, 1 de outubro.
[6] http://www.a3es.pt/pt/acreditacao-e-auditoria/resultados-dos-processos-de-acreditacao/acreditacao-de-ciclos-de-estudos.
[7] ACEF/1314/04592 — Relatório preliminar da CAE, Ciência e Tecnologia do Ambiente, F. Ciências - U. Porto.
[8] ACEF/1213/06987 — Relatório preliminar da CAE, Engenharia do Território, IST-UL.
[9] OECD Review of the Tertiary Education, Research and Innovation System in Portugal – Summary document, for official use, 2018.
[10] Bologna Seminar Doctoral Programmes for the European Knowledge Society, Salzburg, 2005.
[11] Principles for Innovative Doctoral Training, European Commission, DG Research & Innovation, 2011.
[12] Doctoral Programmes in Europe’s Universities: Achievements and Challenges Report prepared for European Universities and Ministers of Higher Education, EUA, 2007.
[13] Maintaining a quality culture in doctoral education at research-intensive universities, LERU, 2016.
[14] http://igs.ntu.edu.sg/Programmes/Prospective%20Students/Pages/Programme-Highlights.aspx
[15] http://www.plantsciences.uzh.ch/en/teaching/phdsciencepolicy.html
[16] https://www.graduate.study.cam.ac.uk/courses/directory/blpspdpsc/study
[17]https://www.helsinki.fi/en/doctoral-programme-in-economics-4-years/1.2.246.562.17.17997976349
[18] https://www.humboldt-graduate-school.de/en/pr-en/academic-training
[19] https://www.seas.harvard.edu/academics/graduate/graduate-degree-requirements
quinta-feira, 12 de julho de 2018
Distraídos
Público, 12 de julho de 2018.
Hoje.
"Ao que parece, a criação do Observatório de Emprego Científico terá sido uma ideia recente e que rapidamente foi colocada em marcha pelo Ministério da Ciência. “Fomos informados desta iniciativa pelo ministro [da Ciência] no início da semana. Difundi a informação que recebemos por todos os reitores, mas o assunto não foi discutido no plenário do CRUP [que foi ontem]”, referiu ao PÚBLICO António Fontainhas Fernandes, reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP)."
Ideia recente, diz o jornalista.
Colocada rapidamente em marcha, reforça.
Informação recente, afirma o Presidente dos Reitores.
A sério? - pergunto eu.
É olhar para trás.
Rebobinando.
Muito.
2018, julho, 12.
2018.
2017.
2016.
2016, novembro,11.
Jornal de Notícias, 11 de novembro de 2016.
Há seiscentos e oito dias.
"Observatório do emprego científico vai monitorizar contratação de investigadores
Um observatório do emprego científico vai monitorizar a contratação de investigadores e professores do ensino superior, e divulgar periodicamente dados sobre os processos, indicou hoje, no parlamento, o ministro da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior. Manuel Heitor disse que os dados serão divulgados duas vezes por ano e que o observatório, para começar a funcionar em janeiro, resultará de uma colaboração entre a Direção-Geral do Ensino Superior, a Direção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência e a Fundação para a Ciência e Tecnologia. O ministro falava no parlamento, na apreciação na especialidade da proposta de Orçamento do Estado de 2017 para a ciência e o ensino superior, onde foi interpelado sobre o emprego científico."
No tempo que, entretanto, passou, podemos encontrar mais afirmações do Ministro, no mesmo sentido; e perguntas dos deputados sobre quando o Observatório começaria, de facto, a observar; e afirmações do Ministro sobre a necessidade de corresponsabilizar as Universidades; e as Universidades a solicitar garantias de apoio financeiro; e os bolseiros a protestar por nada de substancial estar a acontecer; e as associações e sindicatos também; e o Parlamento a demorar quase um ano a alterar a Lei; e esclarecimentos disto e daquilo; contratos-programa que não eram precisos mas sim, para tranquilizar as instituições; listas que não era preciso mas validar, mas afinal já é; e ... e ... e ...
segunda-feira, 18 de junho de 2018
Prioridades
Presidente da República em Moscovo
O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa estará em Moscovo na próxima quarta-feira, 20 de junho, para acompanhar a Seleção Nacional de Futebol no jogo da Fase Final do Mundial com a Seleção de Marrocos. O Chefe de Estado terá também um encontro com o Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin.
Lido na página oficial da Presidência da República Portuguesa.
Lá terá de ser. Afnal de contas, não há jogos de bola grátis. E como este é a Leste, onde, de facto, não há nada de novo, pronto, implica uma ida ao Kremlin. Não que calhe mal de todo. Até porque quase a seguir o destino é Washington. E talvez seja preciso fazer de mediador. Ah ... não ... não é preciso? Têm a certeza? Não se perdia nada em tentar!
A Assembleia da República resolve (...) dar assentimento às seguintes deslocações de Sua Excelência o Presidente da República, durante o mês de junho:
Moscovo, Federação Russa, entre os dias 19 e 21, para acompanhar a seleção nacional, no âmbito do Mundial de Futebol 2018, no jogo Portugal-Marrocos;
Washington DC, Estados Unidos da América, entre os dias 25 e 28, em Visita Oficial.
Lido no Diário da República.
Uma deslocação para acompanhar a seleção, em que só falta dizer a hora do jogo, o estádio e o alinhamento inicial da equipa. Não que seja mesmo preciso, uma vez que o Presidente terá, certamente, inside information. E depois uma visita, apenas oficial. Mas com maiúsculas. Prenúncio de que será uma Grande Grande Visita. Há até quem descortine, nesta última visita, um sinal claro de recandidatura do Presidente. A pensar já no Mundial de Futebol de 2026, para fechar o 2.º mandato com mais um título mundial, desta vez conquistado no MetLife Stadium, em Nova Jérsia. E assim se tornando o primeiro Presidente-Tricampeão! Que más-línguas! E não, não foi um daqueles ex-políticos-analistas-comentadores-que-todas-as-semanas-anunciam-novidades.
Sempre a rolar! Ora ... Bolas!
quarta-feira, 23 de maio de 2018
Uma questão de identidade
O Professor Universitário decidiu subscrever o Manifesto. Por estar preocupado com os destinos da Ciência em Portugal. Porque acredita na importância que a ciência tem para o desenvolvimento do País. Porque acredita que o financiamento é insuficiente, e que o funcionamento é deficiente. Porque não quer que sejam estas as razões que conduzem muitos à procura de outras paragens para fazer ciência. Umas breves palavras tecladas, nome, instituição, país, e três cliques depois - talvez tenha tido uma breve hesitação a preencher a ocupação/cargo - juntou a voz à de muitos da sua comunidade.
O coro de vozes decidiu "alertar o Governo e a Assembleia da República para os graves problemas existentes e apontar direções para a sua solução". O Governo, como órgão de condução da política geral e órgão superior da administração pública, com uma pasta para a Ciência, emparelhada com a Tecnologia e o Ensino Superior. A Assembleia porque detém competência legislativa e de fiscalização dos atos do Governo e da Administração.
O coro de vozes decidiu pedir ao "Governo e à Assembleia da República que reconheçam urgentemente a necessidade de traçar um rumo de médio e longo prazo para a Ciência em Portugal que de forma sustentada nos permita ultrapassar estes estrangulamentos e fazer avançar o nosso país através da ciência e da tecnologia". Um rumo a traçar, tempo futuro, tornando claro que não existe no presente. Um rumo "que garanta os fundamentos essenciais de regularidade, estabilidade e respeito acima definidos, tornando estes princípios essenciais da sua política de ciência". Princípios que, claramente, carecem de ser assegurados e de ganhar presença nas políticas.
O Professor Universitário, preocupado, olhou para o seu reflexo, enquanto premia "submeter". E viu, do outro lado, o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, confiante, a fazer o mesmo gesto como só os reflexos sabem fazer, subscrevendo, também ele, o Manifesto.
O Professor-também-Ministro acabava de alertar a Assembleia que fiscaliza a atuação do Governo e, portanto, a atuação do Ministro-também-Professor, o qual, no seu gesto simétrico, parece recomendar à Assembleia que recomende ao Governo, e portanto, a ele próprio, uma atuação distinta.
O Professor-também-Ministro acabava de alertar o Governo para os problemas da política atual e da respetiva implementação, num recado destinado ao Ministro-também-Professor, o qual, no seu gesto simétrico, parece ter em mente outros destinatários, que não ele próprio. Recados talvez mais para cima, para o Primeiro de entre os Ministros; ou para o lado, para os colegas, com especial atenção ao Ministro das Finanças; ou para o público e para a comunicação social, procurando, num passe de mágica, transformar as críticas da comunidade a que sente pertencer numa validação das políticas e numa imagem de consonância.
O Manifesto Ciência Portugal 2018 foi subscrito, entre muitas outras pessoas, pelo Professor Universitário Manuel Heitor, também Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, e está disponível em http://cienciaportugal.org/manifesto2018/.
quinta-feira, 22 de março de 2018
As(simetrias) publicadas
Em versão sintética, publicada hoje, no jornal Público, nas Cartas ao Diretor.
https://www.publico.pt/2018/03/22/opiniao/opiniao/cartas-ao-director-1807550
Assimetrias em contexto
O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior defende que existe uma concentração excessiva de estudantes em Lisboa e Porto, onde estão quase metade dos que estudam no ensino superior público. O argumento é ilustrado com o exemplo da Áustria, apontado como o segundo país com maior concentração de estudantes em apenas duas cidades, Viena e Innsbruck, com 31%, e da vizinha Espanha, com 27% em Madrid e Catalunha. Concluindo, assim, pela singularidade de Portugal e consequente necessidade de rectificação. Sem mais.
Mas olhemos para o panorama mais global da distribuição populacional nestes três países. As províncias de Viena e Tirol, onde se situa Innsbruck, representam 30% da população austríaca. Valor semelhante se obtém para o peso da Comunidade de Madrid e da Catalunha, em Espanha. Em Portugal, as Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto acolhem cerca de 44% da população; e se somarmos ainda uma parte dos residentes nos distritos de Leiria e Santarém, que não contam com universidades públicas, não estaremos longe, ou talvez até mesmo para lá, dos 50%. Em todos estes casos, a concentração de estudantes assemelha-se à da população em geral. Sim, deste ponto de vista Portugal será o mais bipolar, em sentido literal e até figurado. Mas não me parece que a redistribuição de 1100 vagas, o valor em causa, tenha qualquer impacto neste estado de coisas.
Miguel Conceição, Aveiro
quarta-feira, 21 de março de 2018
Dissensos
"Colaborar na formulação das políticas nacionais de educação, ciência e cultura" e "Pronunciar-se sobre os projectos legislativos que digam directamente respeito ao ensino universitário público" são duas das competências do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.
http://www.crup.pt/crup/sitecrup/wp-content/uploads/2016/10/Estatutos_Juridicos.pdf
Decorre, até ao final de março, a consulta pública de um conjunto diversificado de propostas legislativas do Governo, que abrangem: regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior; Estatuto do Estudante Internacional; regime jurídico de reconhecimento de graus académicos e outras habilitações atribuídas por instituições de ensino superior estrangeiras; regime jurídico das instituições que se dedicam à investigação científica e desenvolvimento; regime jurídico dos centros académicos clínicos e dos projetos-piloto de hospitais universitários; regime de acesso e exercício de atividades espaciais.
https://www.portugal.gov.pt/pt/gc21/consulta-publica?i=237
Para além destas, foi enviada, às entidades do setor, a proposta de orientações para a fixação de vagas para o concurso nacional de acesso ao ensino superior, que inclui disposições visando reduzir vagas em Lisboa e Porto.
"Na reunião do CRUP desta terça-feira [6 de março] acabaram por não ser analisadas as alterações legislativas que o Governo estabeleceu na sequência do relatório da OCDE sobre o ensino superior português, incluindo a autorização dos doutoramentos em politécnicos e a redução de vagas em Lisboa e no Porto. Os reitores vão analisar o pacote legislativo numa reunião extraordinária a 20 de Março."
"E o que diz o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas? Bem, por agora nada. Irá ainda analisar a proposta em conjunto com outras medidas que se encontram em discussão. Irá, portanto, reagir apenas. Taticamente.". Especulava eu, há três dias, a propósito das orientações sobre vagas.
http://notasdasuperficie.blogspot.pt/2018/03/a-danca-das-cadeiras.html
"Terminou sem uma posição conjunta a reunião desta terça-feira [20 de março] entre os reitores das universidades portuguesas, que tinha sido marcada para avaliar as medidas para o sector propostas no último mês pelo Governo. (...) Em vez de uma posição conjunta, cada universidade vai enviar o seu próprio contributo sobre propostas como a autorização de doutoramentos nos politécnicos ou a redução do número de mestrados integrados, que foram aprovadas no Conselho de Ministros no mês passado."
https://www.publico.pt/2018/03/20/sociedade/noticia/propostas-do-governo-dividem-instituicoes-de-ensino-superior-1807415
Fala-se muito da necessidade de entendimento sobre estratégias nacionais.
De acordo para setores que requerem uma perspetiva de longo prazo.
Que são pilares de desenvolvimento: Saúde, Justiça, Educação.
Afinal, nem apreciação estratégica, nem reação tática.
Afinal, o Conselho não quer contribuir.
Restarão as reações individuais.
15 cabeças, 15 sentenças.
Dissensões.
http://notasdasuperficie.blogspot.pt/2018/03/a-danca-das-cadeiras.html
"Terminou sem uma posição conjunta a reunião desta terça-feira [20 de março] entre os reitores das universidades portuguesas, que tinha sido marcada para avaliar as medidas para o sector propostas no último mês pelo Governo. (...) Em vez de uma posição conjunta, cada universidade vai enviar o seu próprio contributo sobre propostas como a autorização de doutoramentos nos politécnicos ou a redução do número de mestrados integrados, que foram aprovadas no Conselho de Ministros no mês passado."
https://www.publico.pt/2018/03/20/sociedade/noticia/propostas-do-governo-dividem-instituicoes-de-ensino-superior-1807415
Fala-se muito da necessidade de entendimento sobre estratégias nacionais.
De acordo para setores que requerem uma perspetiva de longo prazo.
Que são pilares de desenvolvimento: Saúde, Justiça, Educação.
Afinal, nem apreciação estratégica, nem reação tática.
Afinal, o Conselho não quer contribuir.
Restarão as reações individuais.
15 cabeças, 15 sentenças.
Dissensões.
terça-feira, 20 de março de 2018
A dança das cadeiras - Simetrias em contexto
Notas e números, sobre a proposta de reduzir 5% das vagas em Lisboa e Porto (ver entrada anterior em http://notasdasuperficie.blogspot.pt/2018/03/a-danca-das-cadeiras.html) e sobre a sua fundamentação, exemplificada neste extrato da página do Governo (https://www.portugal.gov.pt/pt/gc21/comunicacao/noticia?i=e-preciso-atrair-mais-estudantes-estrangeiros-as-universidades-):
"Desconcentrar o ensino superior
Nas medidas legislativas em discussão pública inclui-se a reorganização da rede de ensino superior, que prevê a redução de vagas do 1.º ciclo nas instituições sitas em Lisboa e Porto, com o seu aumento no resto do País. Com instituições de ensino superior em 54 municípios, Portugal concentra mais de metade em Lisboa ou Porto.
«Não há nenhum país com tanta concentração de estudantes como Portugal», disse o Ministro. A título exemplificativo, em Espanha, Madrid e a região da Catalunha absorvem 27% dos alunos; na Áustria, o segundo país com maior concentração de estudantes em duas cidades, Viena e Innsbruck acolhem 31% por estudantes."
Colha alguns números.
De origens distintas.
Internacionais.
Recentes.
Frescos.
Misture bem.
Extraia.
Pese.
Deixe repousar.
Contemple.
E prove.
Áustria
Ano: 2017.
População total: 8 773 700.
Províncias de Viena e Tirol (onde se situa Innsbruck): 2 614 200.
Fonte: Câmara de Comércio Austríaca.
Ligação: http://wko.at/statistik/jahrbuch/2017_c3.pdf
Percentagem: 30%.
Compara com: 31% de estudantes.
Espanha
Ano: 2017.
População: 46 572 132.
Comunidade de Madrid e Catalunha: 14 063 014.
Fonte: Instituto Nacional de Estadística.
Ligação: http://www.ine.es/jaxiT3/Datos.htm?t=2915
Percentagem: 30%.
Compara com: 27% de estudantes.
Portugal
Ano: 2016.
População: 10 325 452.
Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto: 4 538 334.
Fonte: Pordata.
Ligação: https://www.pordata.pt/Municipios/Popula%C3%A7%C3%A3o+residente+total+e+por+grandes+grupos+et%C3%A1rios-390
Percentagem: 44%.
Compara com: mais de 50% de estudantes.
Se juntarmos ainda parte da população dos distritos de Leiria e Santarém, que não contam com Universidades públicas, e que terão como alternativa Coimbra ou Évora, se o único critério fosse o de proximidade geográfica, os 50% estão ali ao virar da esquina.
Tentando comparar o que é comparável.
Descobrindo simetrias.
Coincidências.
Ou consequências.
Concentração de estudantes.
Semelhante à concentração de gente.
E quanto pesa 5%, em termos de atração?
domingo, 18 de março de 2018
A dança das cadeiras
Cadeiras vazias, muitas, à espera. Ano após ano. E depois eles chegam. E ocupam-nas. Mais de meia centena de milhar no ano passado. 50838, para ser mais preciso. É assim como encher, encher mesmo, um pouco para além dos limites, o Estádio do Dragão ou o Estádio José Alvalade. É esta a dimensão das vagas, em instituições públicas, para o concurso nacional de acesso ao ensino superior.
Cadeiras vagas, que são distribuídas pelas instituições, universidades e politécnicos, com base em "orientações" fixadas todos os anos, tardiamente. Sempre iguais, no geral. Um número máximo por instituição semelhante ao do passado. Sempre diferentes, nos detalhes. Estímulo de cursos pós-laborais ou à distância, estímulo de algumas áreas, restrição de outras, fomento de consórcios, consideração da chamada empregabilidade, ou melhor, dos inscritos em centros de emprego, fecho de cursos com poucos alunos, exceções. Varia. Sempre. Dificultando o planeamento e a gestão. Das instituições e dos candidatos.
Este ano não será exceção. Será igual, mas diferente. Menos vagas nas instituições de Lisboa e Porto, mais vagas nas restantes. Uma variação de 5%. Cadeiras que mudam sítio, de instituições, de região. Esta será uma das orientações do Governo. E que está a provocar discussão, pública e publicada. Diz agora o Ministro que ainda não é uma decisão, e que pretendia provocar o debate. Estranho processo. Porque se discute, no espaço público, aquilo que apenas é do conhecimento de alguns: a proposta, na íntegra e a sua fundamentação. Por certo se fosse um caso de outra natureza, mais secreta ou reservada, já estaria aí acessível num sítio qualquer.
Ainda assim, o que é do domínio público já permite alguma reflexão. Comecemos pelos comentários. Aqueles que estão escritos em artigos de opinião, que terão sido bem refletidos, que não foram editados, que não se prestam a segundas interpretações.
Afirma José Ferreira Gomes, professor da U. Porto e anterior Secretário de Estado do Ensino Superior, no Público, de 1 de março:
"Como justificação, basta a ideia de que as instituições do interior irão ter mais estudantes, não sendo necessário justificar porquê."
"Os estudantes expulsos do Porto irão procurar lugar no Minho e em Aveiro, para além das instituições privadas".Passando da capital do Norte para a capital propriamente dita, leia-se João Duque, professor da U. Lisboa, no Expresso, a de 3 de março:
"O Governo decidiu reduzir 5% das vagas do ensino superior público, nas cidades de Lisboa e Porto, transferindo-as para as universidades do interior. Não tenho nada a opor à abertura de vagas no interior. Mas a forma de se fazer essa transferência é própria de quem não gosta de dar liberdade de escolha."
"Perguntem aos 5% que forem empurrados à bruta para fora de Lisboa e Porto onde pensam votar nas próximas eleições..."
"Imagine-se que o Governo reforçava significativamente o orçamento das universidades do interior e que estas conseguiam assim contratar um número significativo de investigadores e professores de renome internacional, alguns prémios Nobel e até lá conseguiam instalar alguns centros de referência? E que, em paralelo, aumentavam o número e reforçavam as bolsas de estudo para essas universidades?"E o que diz o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas? Bem, por agora nada. Irá ainda analisar a proposta em conjunto com outras medidas que se encontram em discussão. Irá, portanto, reagir apenas. Taticamente.
Entendo que as medidas devem ser escrutinadas, debatidas, criticadas, contraditadas. Bem como as posições de comentadores, académicos ou responsáveis institucionais. Mas não vale tudo! Não pode valer tudo! E quem é da área não pode sequer invocar precipitação ou desconhecimento. Por isso, até julguei estar a ler mal, em duplicado e em estéreo, com ecos a Norte e a Sul. "Estudantes expulsos do Porto"; "5% empurrados à bruta para fora de Lisboa e Porto"; "instituições do interior"; "universidades do interior". ?
Primeiro: a medida não se destina ao interior; neste caso é Lisboa-Porto face ao resto do País. Misturar os dois discursos é, obviamente, erróneo.
Segundo: não há estudantes expulsos nem empurrados à bruta. Esta terminologia, só por si, deve fazer refletir. As vagas de Lisboa e Porto não estão reservadas para os residentes nessas cidades. São ocupadas através de um concurso, nacional. São ocupadas em função das vagas disponibilizadas, das opções dos candidatos e das médias. São ocupadas por gente local que, sim, serão a maioria, mas também por gente de fora. Mas isso, os articulistas sabem-no.
Terceiro: esta medida não é um atentado à liberdade de escolha. Isto pela simples razão que a situação atual não é de completa liberdade de escolha. Há limites para as vagas em cada instituição, limites adicionais em algumas áreas e limites específicos para cada curso. Para além de, naturalmente, haver cursos que não existem em todas as instituições e, pasme-se até alguns que não existem em nenhum local do interior do País (http://notasdasuperficie.blogspot.pt/2017/11/nao-ha-direito.html).
Passemos então à substância, ou a algumas substâncias distintas, que aqui se podem misturar. O que se pretende atingir, porquê e como? Pretende-se, aparentemente, alunos de formação inicial mais espalhados pelo território nacional. Aparentemente, como arma de combate às assimetrias regionais. Aparentemente, usando o ensino superior como motor. No passado isto foi feito, mas criando instituições de raiz, novos pólos, as novas universidades e os institutos politécnicos. Mas qual é, então a distribuição ideal que o Governo preconiza, e porquê? Duvido que se tenha feito algum estudo.
Escrevi, em tempos, "(...) esta medida, configurada como está, parece ignorar o país real, as razões da escolha de um curso e os próprios dados; e sobrevaloriza o poder do dinheiro – de algum dinheiro - como motor da mudança demográfica.", a propósito do programa +Superior, que visava atrair mais estudantes para o interior E terminava dizendo que "Mudanças verdadeiramente estruturais poderiam ser alcançadas através de outras medidas: alterar a distribuição nacional de vagas; mobilizar pessoas e verbas para as zonas escolhidas; construir mais projetos que atraíssem pela qualidade e pela diferenciação. Mas talvez não seja isso que se pretende.". (http://notasdasuperficie.blogspot.pt/2014/09/mais-superior.html).
Então a questão era outra: era de facto o interior que estava em causa. Aquele interior que todos querem promover, mas à distância, a partir do litoral. Hoje, fala-se em redistribuir cerca de 1100 vagas de Lisboa e Porto por todo o território, numa proporção igual em cada instituição (+5%), seja ela a Universidade do Minho ou o Politécnico de Beja, e sendo certo que nem todas as vagas virão a ser ocupadas. O impacto final em termos de desenvolvimento será mínimo, estou convencido.
A alteração da distribuição de vagas é uma medida administrativa, fácil de tomar e de implementar, e que pode permitir mostrar números rapidamente. Mas sem dimensão suficiente não produzirá o pretendido efeito de arraste. Quando muito, conduzirá a pequenos ajustes e desajustes. As outras alternativas requerem uma abordagem mais integrada, recursos avultados e persistência ao longo do tempo. E não estou a falar de contratar prémios Nobel.
Numa altura em que tanto se apregoa a importância das competências transversais e das atitudes, da mobilidade internacional e do conhecimento do mundo, da bagagem de experiências diversas não seria antes de estimular o estudar e viver fora de casa? Ganhar vida e ganhar País? Fugir à endogamia regional? Sim, isso obrigaria, entre outras coisas, a repensar a rede de ensino e o modelo de apoio social existente. Mas vale a pena pensar nisso!
Digo eu, a partir de uma cidade média, situada no litoral.
quinta-feira, 8 de março de 2018
"Crime!" - disse ele.
Esta é uma história em atmosfera de policial negro, série B. Daquelas com um detetive, de meia-idade indefinida, barba por fazer, rosto sério, voz cava. Um escritório pequeno, em permanente penumbra, para onde a luz se esgueira, com esforço, através das estreitas frinchas da persiana. Luz cinza-amarelada do dia, isto quando não chove. Luz cinza-amarelada, mais esbatida, escorrendo do poste de iluminação, ligeiramente debruçado sobre a calçada estreita, vendo quem passa. O ar espesso, fumo em movimento, empurrado por uma ventoinha a um canto, sobre o soalho gasto. Um bengaleiro com uma gabardine escura, encimada por um chapéu de abas. Uma secretária coberta de papéis, um par de cadeiras, uma mesa redonda, um cesto de papéis, estantes com capas de cor indistinta. Uma garrafa e um copo, sempre mais meio vazio do que meio cheio.
Aviso a passar em rodapé, em letras apropriadamente mais pequenas: qualquer parecença com a realidade pode não ser apenas mera coincidência.
Era um fim de tarde. Mais um, pensei. Estava escuro. Chovia lá fora. O candeeiro desenhava um círculo de luz sobre a secretária. Um círculo de luz sobre as letras do jornal. Nada de especial. As notícias de sempre. A cabeça doía, a reclamar descanso. Meio copo e está na hora de fechar. E de trocar o escritório vazio pela casa, também ela vazia. De longe, de mais longe do que o habitual, chega o ruído da porta da rua, batendo com força. Ouço a escada de madeira a ranger, sob o peso de passos que se aproximam, rapidamente. A sombra assoma, por detrás do vidro fosco. A porta abre-se de supetão. O silêncio é bruscamente interrompido. Logo agora que ia sair.
- Chefe! Chefe! Encontraram-na!
- Hã...?
- Encontraram-na!
- Hmmm ...? O quê ...? Quem ...?
Resmungo entre dentes. A dor de cabeça parece tornar-se mais intensa. O nevoeiro que não se dissipa. Logo agora que ia sair, penso novamente.
- Encontraram-na: a mais procurada no País, a mais difícil de alcançar!
- Quem ...?
- A licenciatura mais procurada do País!!
- Sim ...? E então ...?
Nada que não pudesse, certamente, esperar por amanhã. Nada que não pudesse esperar pela luz de um novo dia. Mesmo de um novo dia de chuva. Nada que me possa causar surpresa, penso. A mente continua a vaguear, perdida. É só esperar mais uns segundos. Depois a notícia. E depois posso ir para casa.
- Encontraram-na: é a Criminologia!
As palavras atravessaram o ar espesso, como se este tivesse, subitamente, parado. Entraram na minha cabeça. Começaram a formar um turbilhão. Agitaram-me, de dentro para fora. Pressenti o que vinha a seguir. Conheço demasiado bem os sintomas. Voltam sempre que algo está desalinhado na ordem das coisas. Sempre que surge um novo caso.
- Tens a certeza? A Criminologia ... Por essa não esperava.
Digo, tentando ainda fazer parar o turbilhão, que começara a rodar. Em vão.
- Está em todos os jornais!
- Em todos?
- Bem, pelo menos em alguns ... diários, aqueles de economia, e até ... até ... em semanários!
- Hmmmm ....
- Parece sólido, Chefe. Há testemunhos. Todos no mesmo sentido.
- ...
O turbilhão roda cada vez mais depressa. Não era nenhum dos suspeitos habituais que me vinham à cabeça: medicina, engenharia especial ou espacial, biotecs ou techies, direitos ou tortos, gestão. Estranho. Algo não fazia sentido.
- Está muito calado, Chefe. Acha que pode não ser ela?
- Não sei ... ainda.
- Mas fazemos alguma coisa?
- Recolhe os jornais. Todos. E deixa-os na minha secretária. Para amanhã. Preciso pensar.
- Ok, Chefe. Até amanhã.
Visto a gabardina. Coloco o chapéu, enquanto desço as escadas de madeira, em direção à rua. Entro na chuva fria. Criminologia ... sim ... uma licenciatura jovem, sexy, com um certo ar, com uma certa pose, assim de estrela de cinema, ou de televisão por cabo. Não tenho dúvida de que sabe suscitar o interesse. Ainda assim ... criminologia, a mais procurada, não me parece. Suspiro. Amanhã veremos.
...
Foi uma noite difícil, como sempre quando me embrenho num novo caso. O turbilhão que gira. E voltou o pesadelo. Quase sempre o mesmo, com pequenas variações. Casos abertos. Ou melhor, "o" caso nunca fechado. Quando me defrontei com um bando de equações, que se multiplicavam, membros por todos os lados. Um sistema de resolução impossível. A angústia de não encontrar solução. Sucumbindo.
...
Entro no escritório. Sirvo-me de café, sem reparar se é de ontem ou do dia. Em cima da secretária os jornais, como combinado. Já marcados. Círculos vermelhos à volta dos indícios. "A licenciatura de Criminologia e Justiça Criminal da Universidade do Minho foi a de mais difícil entrada no ano letivo 2017/2018 no ensino superior público português", "o mais procurado em todo o país", "o que mais alunos deixou à porta", "a de mais difícil acesso". Todos apontam no mesmo sentido. Todos referem uma mesma testemunha: a Satisfação. Satisfação da Procura, de seu nome completo. Teremos de a ouvir, sem dúvida. Um Indicador ...
- Bom dia, Chefe. Deixei os jornais em cima da sua secretária.
- ... dia ... sim ... já vi ...
- E então? Que lhe parece? Temos caso?
- Vamos ter de os ouvir.
- A quem?
- Números e Indicadores. Números e Indicadores. Quem mais poderia ser? Desde logo a Satisfação.
- Essa parece ser a fonte de todos os jornalistas.
- Pois ... por agora é a ligação mais óbvia à Criminologia. Mas quero ouvir os outros. Não podemos deixar pontas soltas.
- Vou procurá-los?
- Sim. Sabes como é. Conheces a rotina. Nestas ocasiões costumam andar por aquele bairro ... a DGES. Andam por lá, tenho a certeza. Escondidos nos Estudos, nos Relatórios ou nas Bases. Mudando de sítio. Ou de aspeto. Ou de nome. Tens de ter cuidado. Às vezes andam em grupo. Mas sempre os encontrámos, no passado. E não costumam ser difíceis de convencer a falar. De certa forma gosta de atenção.
- Certo, Chefe! Voltarei o mais depressa possível!
Números e indicadores. Outra vez. Difíceis de ler. Problemáticos. Perigosos mesmo. Mas no fim ... são apenas mais uns. Número e Indicadores. Não me posso ligar a eles. E esta chuva, sempre. Entranhando-se. Tornando o ar mais pesado. Bafiento. Número e Indicadores. E se também eu não for mais do que isso? Números e Indicadores. Pareço o Blade Runner, pensei, abanando a cabeça para afastar estes pensamentos.
Volto ao café, ainda mais frio se tal for possível. Volto às notícias dos jornais, em busca de outros indícios. Há mais, de facto. Pequenas subtilezas perdidas, longe dos cabeçalhos, que gritam "Criminologia". Apontando noutras direções. "estes cursos [direito] são dos que mais procura reúnem", os dois cursos que exigiram as médias de entrada mais alta - Engenharia aerosespacial e Engenharia Física e Tecnológica". Mas depois voltam à tónica. À Criminologia. E à Satisfação como prova provada.
- Chefe, já estão aqui, todos os que encontrei.
- Muito bem! Vamos a isto!
Números e indicadores. Mais diretos os primeiros. Mais propensos a incendiar discussões, os segundos. Personalidades mais complexas. Comecemos então pela Satisfação. Satisfação da Procura. Senhora do seu nariz. Provocadora de conversas alheias.
- Portanto é a Satisfação da Procura?
- Sim, sou.
- Um Indicador ...
- Que mal tem ser um Indicador? É proibido, Sr. Detetive? Faz-me suspeita? A mim?
- Não, não é proibido. Mas se andar a enganar as pessoas ...
- Euuuuu? A enganar ...? Vê-se que não me conhece! Sou séria!
- Bem, vamos por partes. O que faz?
- Olhe, é assim. Conhece o Candidatos, não conhece? Não precisa responder. É uma pergunta ... como se diz ... teórica.
- Retórica. Pergunta retórica.
- Ou isso. Não importa. Onde é que eu ia? Ah, pois, o Candidatos. Sempre a contar, a contar, a contar. A arrumar tudo, muito direitinho, em tabelas. Parece uma vida aborrecida, pouco interessante, pouco útil ... Vida dos Números, está a ver?
- E ...?
- E ... e ...., pronto, gosto de o juntar com as Vagas. É muito mais divertido!
- Não estou a perceber.
- Então Sr. Detetive? Olhe, é assim. Vagas sobre Candidatos. Candidatos sobre Vagas. É como quiserem. Não acha divertido? Veja. Temos 20 Vagas. Faça de conta que há 100 candidatos. Pronto, só satisfaz 1 em cada 5, poucochinho não acha, só 0,2. Os outros 4 não ficam nada satisfeitos. Ficam Insatisfeitos.
- Mas é satisfação ou insatisfação, aquilo com que estamos a lidar?
- Se for comigo é Satisfação. Insatisfação é com a minha irmã gémea! Não a quer entrevistar também?
- Não, não quero. Pelo menos por agora. Só me faltava ter que lidar com gémeas... Então e Criminologia?
- Ah ... Criminologia ... Isso é mais com a minha irmã.
- Como?
- Tem pouca Satisfação da Procura. Portanto, tem muita Insatisfação, está a ver?!
- Sim, sim, já percebi o esquema! Então mantém que Criminologia é o curso com maior procura?
- Mantenho? Mas eu nunca disse isso, Detetive! Comigo é uma questão de Satisfação, compreende do que estou a falar, não é verdade?
- Mas é o que vem nos jornais. Em vários. Todos a apontam como testemunha. A testemunha que mostra que Criminologia é a Licenciatura mais procurada!
- Nunca disse tal coisa! Não me podem meter nesta embrulhada. Era o que faltava!
- Mas então o que foi que disse, mesmo, sobre ela?
- Oh! Coitadita. Só disse que a Satisfação era muito baixa. Muito baixa mesmo. A menor. E pronto, já contei tudo. Agora quero voltar para a DGES!
Registei: Criminologia. A menor Satisfação da Procura.
- Ainda não acabei. Mas isso não é o mesmo que dizer que é a mais procurada, jogando com as palavras?
- Não, Sr. Detetive. Procura e Satisfação de Procura não é a mesma coisa.
- Mas sabe que também a chamam Procura?
- Não me importo que me chamem. Não é por mal. Mas o meu nome próprio é Satisfação. Faz toda a diferença, não acha? Agora quero mesmo ir embora.
- Só mais uma pergunta.
- Sim?
- Quantos Candidatos ficam à porta?
- Como quer que eu saiba? Eu divido. Vagas e Candidatos. Não subtraio. Candidatos e vagas. Isso não é comigo. Gosto de os juntar, às Vagas e Candidatos. Mas com a operação certa. Percebe?
- Obrigado. Não se afaste muito. Posso precisar de voltar a interrogá-la.
- Nome?
- Candidatos.
- O que faz?
- Conto quem procura uma licenciatura.
- Conta? Apenas?
- Sim. Só conto. Sabe como é: tantos para aqui ... tantos para ali.
- Conta ... Sempre da mesma maneira?
- Pois, com certeza. Temos que ser rigorosos. Não podemos falhar. Agora o que me pedem mais são os candidatos em 1ª opção. Mas às vezes querem outras coisas. Contar por fases, primeira, segunda, terceira. Ou por região. Coisas assim.
- O que me pode dizer sobre a Criminologia?
- Criminologia? Essa é nova na zona. Só anda por aqui há um par de anos.
- E então?
- Então ... Já deu nas vistas, isso é certo, mas não é das que me dá mais trabalho. Anda agora nos 170 Candidatos. Acho que ainda é capaz de subir. Mas isto às vezes é por modas. Como aconteceu há anos com a Civil. Subiu e depois desceu, desceu, desceu. Agora está outra vez a subir.
- Então a Criminologia não é a que a tem mais Candidatos.
- Não, nem de longe. Há outros. Vários.
- Ai, sim? Isso é muito vago. Preciso de nomes!! Nomes que possa verificar.
- Calma ... calma ... não é difícil. Assim de repente, daqueles que estão aí para cima de quatrocentos, lembro-me de várias medicinas, direitos, gestão ...
- Espera aí. Deixe-me apontar. E olhe que vou confirmar. Um a um. Por isso é bom que a informação esteja correta!
- ... gestão, engenharia informática, enfermagem.
- Portanto, Criminologia não é das mais procuradas?
- Criminologia ?! Claro que não!! Sei muito bem o trabalho que tenho!
- Diz-se por aí que é quem tem menos Satisfação da Procura.
- Disso não sei nada. Eu sei quantos procuram. Conheço-os a todos. De onde vêm, com que média, para onde querem ir. O que preferem. Olhe, até dava para lhes fazer aparecer uns anúncios da internet, daqueles à medida! Vender-lhes umas coisitas. Para fazer uns dinheirinhos extra.
- Muito engraçado, sem dúvida ... Olhe ... e quanto a candidatos à porta?
- Nada sei sobre isso. Está a perguntar à pessoa errada. O que lhe digo é que em Direito, em Lisboa, são mais de 800. Acha que me ia esquecer de números assim?
- Sabe quem me poderá dizer alguma coisa sobre isso, sobre os que ficam à porta?
- Assim de repente, nem por isso ... a não ser que ...
- A não ser que?
- A não ser que fale com as Vagas. Mas essas são muito constantes. Parece que não envelhecem, quase iguais de ano para ano.
Vagas, registei, para usar em caso de necessidade. Candidatos. 170, muito menos que 800. Sim, pensei, alguns daqueles nomes são mais credíveis para os mais procurados. Desenhei um ponto de interrogação. Dois pontos de interrogação. Candidatos igual a Procura? Procura diferente de Satisfação da Procura?
- Então, Chefe? Vamos ao último?
- Espera. Falta-nos perceber a relação disto tudo com as Vagas.
- Quer que a vá procurar?
- Não, não. Talvez não seja preciso. Dizem que variam pouco. Tens aquelas listas, com a identificação das Vagas?
- Sim, estão aqui Chefe.
- Hum.... Direito, Lisboa, 560 vagas. Candidatos eram, escrevi aqui, mais de 800. São quase 250 que ficam de fora.
- São muitos, Chefe.
- Pois, isso. Criminologia, 25 vagas. Candidatos eram 170. Menos de 150 de fora. E há mais assim. Realmente tem a ver com Candidatos e Vagas.
- Não percebo.
- Procura, Satisfação de Procura, Candidatos que ficam de fora.
- Não estou a perceber ... E o que acontece à Criminologia?
- Vamos falar com a Média.
As peças começam a encaixar. Preciso de obter as informações que me faltam. Venha a Média. Terei de a pressionar. Sei que não gosta que façam juízos sobre ela. Irrita-se quando dizem que é injusta e que causa problemas a muita gente. É um ponto de partida. E depois de começar a falar ...
- Média. Ou devo dizer Dificuldade?
- Dificuldade?
- Sim, não é outro dos seus nomes? Dificuldade? Dificuldade de entrada? Média exigida? Barreira? Empecilho?
- N...n....n...não ....
- Não?! Não quer pensar melhor?! Não é quem decide quem entra e quem fica de fora?
- Não, não, não ... não faço nada disso!
- Assusta muitos Candidatos! Sabe que sim! Vamos lá ...
- Isso não é justo! Eu só apareço depois, no fim, no fim de tudo, quando está tudo decidido, não tenho nada a ver com o que se passa. Não tenho nada a ver com as entradas.
- Não acredito! Tenho aqui um elemento de prova que diz "Engenharia aeroespacial - nota do último colocado 188". 188! Parece-lhe bem?
- Mas ... mas ...
- Diga-me: como se faz isto?
- Estou farta de ser olhada de lado! As pessoas não percebem! Eu não apareço no início. Não digo a ninguém: "para entrares aí tens de ter esta média". É ao contrário. Primeiro entram todos, ordenados, pelas médias, claro. E quando entra o último eu pergunto: qual é a tua? Ele diz e pronto. É assim que apareço. Sou a nota do último colocado. Não é ao contrário! Não é como se o Governo decidisse o meu valor! Nem podia. Já me informei dos meus direitos! Mas também não é como se as Universidades decidissem o meu valor. Até podiam, que eu sei. Mas não costumam. Nada que seja muito acima da positiva. E ...
- Mais devagar, quer dizer ...
- Perguntou e eu estou a responder! Estou a dizer a verdade! Não sou eu que tenho a culpa. As pessoas olham para o meu passado, para o que fiz no outro Verão, e dizem que quem tiver menos já não entra, que é preciso ter aquela nota, que só assim ...
- Espere aí! Deixe-me tomar nota. Portanto, só aparece depois.
Média aparece no fim, escrevo. Declina qualquer responsabilidade.
- Sim, já disse isso. Não me está a ouvir? É sempre a mesma coisa. E depois sou eu ..
- Indicadores ... sempre mais difíceis ...
- Também não é preciso insultar. Sim sou um Indicador! Mas comigo é a mesma como quando vai aos bancos. Aqueles anúncios em letras pequeninas. Rendimentos passados não garantem rendimentos futuros! Aqui é a mesma coisa. Médias passadas não impõem médias futuras. Tudo depende das notas dos Candidatos, dos exames, das escolhas, das Vagas, etc, etc. Só não depende de mim! Porque eu ...
- Sim. Já sei: só aparece no fim.
- Exatamente! Finalmente está a perceber!
- Hmmmm. Então porque é que lhe chamam também Dificuldade?
- Acham mais simples assim, imagino.
- Então 188 a Aeroespacial não quer dizer que é difícil?
- É 188 porque quem tinha essas medidas quis ir para lá.
- Mas ter 188 é difícil.
- Lá está outra vez com a mesma ideia fixa! É difícil, pois. Mas olhe, há gente que chegou lá. E até há quem chegue aos 200. E pronto, quando um grupo assim procura uma licenciatura ... em algum lado a Média vai ser alta. Já lhe falei das Vagas? Sabe, é que reparei que se as Vagas não forem muitas é mais fácil eu ser mais alta. Engraçado, não é?
- Mas Criminologia, não é a mais difícil?
- Criminologia? Essa miúda? Acho que ficou pelos 160. Mas não sei se é mais difícil ou mais fácil. Olhe, se os Aeroespaciais, todos, procurassem entrar para o Crime até acho que me davam um valor mais elevado. Era capaz de chegar aos 195, digo eu. Era bonito, não? E se o Crime fosse para o espaço podiam trocar as Médias, quer dizer, trocarem-me a mim. Ai! Já estou a ficar baralhada.
- Então tudo depende da Procura, e da Satisfação da procura.
- Isso já não sei. Não me dou bem com essa gente. Mas de mim não é. Eu só ...
- Aparece no fim, já sei. Agradeço o seu depoimento. Foi muito útil.
- Mas não acha que as Universidades podiam fixar um número mais engraçado, sei lá 12, ou 14, ou até um número ímpar?
- Se quer que lhe diga, isso não me interessa. Não faz parte deste caso.
Tudo se tornava agora claro na minha mente.
- Então, Chefe? Terminamos?
- Sim. Criminologia não é a licenciatura mais procurada. Nem a que mais Candidatos deixa à porta. Nem a mais difícil de entrar, se prestarmos atenção ao que nos disse a Média.
- Inocente? Em tudo?
- Vê bem. Direito tem muito mais Candidatos. Direito e outros. E também esses deixam mais candidatos à porta, se olharmos bem para as Vagas. E não tem a Média mais elevada embora aí seja mais complicado porque ...
- Porque a Média só aparece no fim, quando as escolhas já foram feitas e ... e .... também tem a ver com as Vagas.
- Isso mesmo! Ainda vais chegar a Detetive.
- Mas, então, como se explica que tenha sido a Criminologia a ser identificada?
- Identidades trocadas. Satisfação da Procura e Procura. Apenas têm o apelido em comum. Mas são muito, mesmo muito diferentes. Se vires bem, Procura e Candidatos são um e o mesmo. Números, percebes. Absolutos, de leitura direta. Já a Satisfação é um Indicador, tens de ter muita atenção ao que diz e, mais ainda, ao que pode querer dizer.
- Lá muito para dizer tinha ela ...
- Pois ... assim que começa a falar ... gosta de ter audiência.
- Ainda assim, custa-me a perceber como é que ninguém duvidou...
- A Criminologia deu nas vistas, assim que chegou. Essa miúda tornou-se um alvo, atraente. Fica bem nas fotografias e nos cabeçalhos. Mas não foi ela, e isso é que importa.
Caso resolvido. Visto a gabardina e pego no chapéu.
- Chefe?
- Sim?
- Acha que a Criminologia, alguma vez ... alguma vez será a mais procurada?
- Talvez ... quem sabe?
Fecho a porta do escritório. Faço ranger os degraus da escada de madeira. Saio para a rua mal iluminada. O poste inclinado parece olhar para mim. A luz pálida estremece. Números e Indicadores. É preciso pensar como eles. Pelo menos, hoje, não irei sonhar com o sistema de equações impossível de resolver.
quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018
Mais do que uma questão de status
"(...) non-academic professional positions (...) in Portuguese tertiary education institutions tend to have a lower status and fewer resources attached to them than equivalent positions in tertiary education institutions in many OECD countries. As qualified professional staff with adequate authority and resources are crucial to the development and implementation of effective institutional strategies, this comparative under-resourcing is problematic."
em "OECD Review of the Tertiary Education , Research and Innovation System in Portugal - Summary document", for offical use, 5 fevereiro 2018.
Outras escritas "invisíveis" em http://notasdasuperficie.blogspot.pt/2017/04/os-invisiveis.html.
sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018
And the winner is ...
Competição.
Vencedores.
Vencidos.
Táticas.
Um modo de estar.
Um modo de pensar.
Uma cultura que se cria.
Uma prática que se espalha.
A todas as escalas.
A todas as áreas.
Leituras para refletir.
"The “European Excellence Initiative” has been proposed by the German Rectors’ Conference (HRK) and the Conference of Rectors of Academic Schools in Poland (...). Several sectors across the world have used excellence initiatives to pump huge amounts of funding into a select number of institutions with the aim of turbocharging their research performance."
"The HRK added that “a great deal of support was expressed for the concept”, which would be the first initiative to provide institution-level funding for universities from the EU, at the strategy event."
"Horst Hippler, president of the HRK, told Times Higher Education that the scheme would be aimed in particular at “those member states that want to catch up and increase the competitiveness of their higher education systems”."
Em: "University leaders push for Europe-wide excellence initiative"
https://www.timeshighereducation.com/news/university-leaders-push-europe-wide-excellence-initiative
"(...) higher education can be seen to be caught up in a kind of magical thinking which fetishes competition. There appears to be a modern-day magical belief that competition in higher education will provide the solution to all the unsolved problems of higher education (...). Competition is perceived as an independent force that is viewed as a ‘natural’ phenomenon which appears of its own accord. The invisible hand of competition appears to provide the means by which no-one is responsible at the same time as veiling social processes and negative consequences."
"The authors observe that while the discourse appears to create a global meritocracy, the war for talent embroils universities in intensifying competition for status, in which social justice and broader purposes of education suffer."
"The ‘naturalisation’ of competition has become a ‘doxa’ or an unquestionable orthodoxy that operates at all levels of society, from individual perceptions and practices to state policy, as if it was the natural order of things."
"It would also be important to develop research that investigates the conditions under which innovation in higher education occurs in order to investigate and perhaps challenge the imputed link between innovation and market-based competition. The entire history of publicly funded higher education across the world stands against this argument."
Rajani Naidoo (2016) The competition fetish in higher education: varieties, animators and consequences, British Journal of Sociology of Education, 37:1, 1-10, DOI: 10.1080/01425692.2015.1116209
segunda-feira, 22 de janeiro de 2018
Welcome to the machine
Organizações e pessoas. Dicotomias.
"O capital humano de qualquer organização constitui, sem dúvida, o seu ativo mais valioso, pelo que se afigura necessário otimizar o seu aproveitamento, pondo em relevo o talento das pessoas e racionalizando a funcionalidade das estruturas e os modelos de gestão de recursos humanos."
Gestão e estruturas. Criaturas autónomas. Para além das pessoas. Sem criador. Sem ator.
Lido por aí, num plano de atividades, numa secção que podia ser sobre pessoas, mas que é sobre "recursos" que revestem forma humana, ou um qualquer seu derivado, descrito em economês: capital humano; ativo; otimizar; aproveitar; racionalizar; funcionalidade; estruturas; modelos.
Lido por aí, num plano de atividades de uma instituição de ensino superior.
Welcome to the machine.
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