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Dia 11.
Um ensaio sobre informação, comunicação, literacia, hierarquias, modas, cabeçalhos.
A propósito da procura de cursos de ensino superior.
Num estilo diferente, ficcionado.
"Crime!" - disse ele.
8 de março de 2018
Esta é uma história em atmosfera de policial negro, série B. Daquelas com um detetive, de meia-idade indefinida, barba por fazer, rosto sério, voz cava. Um escritório pequeno, em permanente penumbra, para onde a luz se esgueira, com esforço, através das estreitas frinchas da persiana. Luz cinza-amarelada do dia, isto quando não chove. Luz cinza-amarelada, mais esbatida, escorrendo do poste de iluminação, ligeiramente debruçado sobre a calçada estreita, vendo quem passa. O ar espesso, fumo em movimento, empurrado por uma ventoinha a um canto, sobre o soalho gasto. Um bengaleiro com uma gabardine escura, encimada por um chapéu de abas. Uma secretária coberta de papéis, um par de cadeiras, uma mesa redonda, um cesto de papéis, estantes com capas de cor indistinta. Uma garrafa e um copo, sempre mais meio vazio do que meio cheio.
Aviso a passar em rodapé, em letras apropriadamente mais pequenas: qualquer parecença com a realidade pode não ser apenas mera coincidência.
Era um fim de tarde. Mais um, pensei. Estava escuro. Chovia lá fora. O candeeiro desenhava um círculo de luz sobre a secretária. Um círculo de luz sobre as letras do jornal. Nada de especial. As notícias de sempre. A cabeça doía, a reclamar descanso. Meio copo e está na hora de fechar. E de trocar o escritório vazio pela casa, também ela vazia. De longe, de mais longe do que o habitual, chega o ruído da porta da rua, batendo com força. Ouço a escada de madeira a ranger, sob o peso de passos que se aproximam, rapidamente. A sombra assoma, por detrás do vidro fosco. A porta abre-se de supetão. O silêncio é bruscamente interrompido. Logo agora que ia sair.
- Chefe! Chefe! Encontraram-na!
- Hã...?
- Encontraram-na!
- Hmmm ...? O quê ...? Quem ...?
Resmungo entre dentes. A dor de cabeça parece tornar-se mais intensa. O nevoeiro que não se dissipa. Logo agora que ia sair, penso novamente.
- Encontraram-na: a mais procurada no País, a mais difícil de alcançar!
- Quem ...?
- A licenciatura mais procurada do País!!
- Sim ...? E então ...?
Nada que não pudesse, certamente, esperar por amanhã. Nada que não pudesse esperar pela luz de um novo dia. Mesmo de um novo dia de chuva. Nada que me possa causar surpresa, penso. A mente continua a vaguear, perdida. É só esperar mais uns segundos. Depois a notícia. E depois posso ir para casa.
- Encontraram-na: é a Criminologia!
As palavras atravessaram o ar espesso, como se este tivesse, subitamente, parado. Entraram na minha cabeça. Começaram a formar um turbilhão. Agitaram-me, de dentro para fora. Pressenti o que vinha a seguir. Conheço demasiado bem os sintomas. Voltam sempre que algo está desalinhado na ordem das coisas. Sempre que surge um novo caso.
- Tens a certeza? A Criminologia ... Por essa não esperava.
Digo, tentando ainda fazer parar o turbilhão, que começara a rodar. Em vão.
- Está em todos os jornais!
- Em todos?
- Bem, pelo menos em alguns ... diários, aqueles de economia, e até ... até ... em semanários!
- Hmmmm ....
- Parece sólido, Chefe. Há testemunhos. Todos no mesmo sentido.
- ...
O turbilhão roda cada vez mais depressa. Não era nenhum dos suspeitos habituais que me vinham à cabeça: medicina, engenharia especial ou espacial, biotecs ou techies, direitos ou tortos, gestão. Estranho. Algo não fazia sentido.
- Está muito calado, Chefe. Acha que pode não ser ela?
- Não sei ... ainda.
- Mas fazemos alguma coisa?
- Recolhe os jornais. Todos. E deixa-os na minha secretária. Para amanhã. Preciso pensar.
- Ok, Chefe. Até amanhã.
Visto a gabardina. Coloco o chapéu, enquanto desço as escadas de madeira, em direção à rua. Entro na chuva fria. Criminologia ... sim ... uma licenciatura jovem, sexy, com um certo ar, com uma certa pose, assim de estrela de cinema, ou de televisão por cabo. Não tenho dúvida de que sabe suscitar o interesse. Ainda assim ... criminologia, a mais procurada, não me parece. Suspiro. Amanhã veremos.
...
Foi uma noite difícil, como sempre quando me embrenho num novo caso. O turbilhão que gira. E voltou o pesadelo. Quase sempre o mesmo, com pequenas variações. Casos abertos. Ou melhor, "o" caso nunca fechado. Quando me defrontei com um bando de equações, que se multiplicavam, membros por todos os lados. Um sistema de resolução impossível. A angústia de não encontrar solução. Sucumbindo.
...
Entro no escritório. Sirvo-me de café, sem reparar se é de ontem ou do dia. Em cima da secretária os jornais, como combinado. Já marcados. Círculos vermelhos à volta dos indícios. "A licenciatura de Criminologia e Justiça Criminal da Universidade do Minho foi a de mais difícil entrada no ano letivo 2017/2018 no ensino superior público português", "o mais procurado em todo o país", "o que mais alunos deixou à porta", "a de mais difícil acesso". Todos apontam no mesmo sentido. Todos referem uma mesma testemunha: a Satisfação. Satisfação da Procura, de seu nome completo. Teremos de a ouvir, sem dúvida. Um Indicador ...
- Bom dia, Chefe. Deixei os jornais em cima da sua secretária.
- ... dia ... sim ... já vi ...
- E então? Que lhe parece? Temos caso?
- Vamos ter de os ouvir.
- A quem?
- Números e Indicadores. Números e Indicadores. Quem mais poderia ser? Desde logo a Satisfação.
- Essa parece ser a fonte de todos os jornalistas.
- Pois ... por agora é a ligação mais óbvia à Criminologia. Mas quero ouvir os outros. Não podemos deixar pontas soltas.
- Vou procurá-los?
- Sim. Sabes como é. Conheces a rotina. Nestas ocasiões costumam andar por aquele bairro ... a DGES. Andam por lá, tenho a certeza. Escondidos nos Estudos, nos Relatórios ou nas Bases. Mudando de sítio. Ou de aspeto. Ou de nome. Tens de ter cuidado. Às vezes andam em grupo. Mas sempre os encontrámos, no passado. E não costumam ser difíceis de convencer a falar. De certa forma gosta de atenção.
- Certo, Chefe! Voltarei o mais depressa possível!
Números e indicadores. Outra vez. Difíceis de ler. Problemáticos. Perigosos mesmo. Mas no fim ... são apenas mais uns. Número e Indicadores. Não me posso ligar a eles. E esta chuva, sempre. Entranhando-se. Tornando o ar mais pesado. Bafiento. Número e Indicadores. E se também eu não for mais do que isso? Números e Indicadores. Pareço o Blade Runner, pensei, abanando a cabeça para afastar estes pensamentos.
Volto ao café, ainda mais frio se tal for possível. Volto às notícias dos jornais, em busca de outros indícios. Há mais, de facto. Pequenas subtilezas perdidas, longe dos cabeçalhos, que gritam "Criminologia". Apontando noutras direções. "estes cursos [direito] são dos que mais procura reúnem", os dois cursos que exigiram as médias de entrada mais alta - Engenharia aerosespacial e Engenharia Física e Tecnológica". Mas depois voltam à tónica. À Criminologia. E à Satisfação como prova provada.
- Chefe, já estão aqui, todos os que encontrei.
- Muito bem! Vamos a isto!
Números e indicadores. Mais diretos os primeiros. Mais propensos a incendiar discussões, os segundos. Personalidades mais complexas. Comecemos então pela Satisfação. Satisfação da Procura. Senhora do seu nariz. Provocadora de conversas alheias.
- Portanto é a Satisfação da Procura?
- Sim, sou.
- Um Indicador ...
- Que mal tem ser um Indicador? É proibido, Sr. Detetive? Faz-me suspeita? A mim?
- Não, não é proibido. Mas se andar a enganar as pessoas ...
- Euuuuu? A enganar ...? Vê-se que não me conhece! Sou séria!
- Bem, vamos por partes. O que faz?
- Olhe, é assim. Conhece o Candidatos, não conhece? Não precisa responder. É uma pergunta ... como se diz ... teórica.
- Retórica. Pergunta retórica.
- Ou isso. Não importa. Onde é que eu ia? Ah, pois, o Candidatos. Sempre a contar, a contar, a contar. A arrumar tudo, muito direitinho, em tabelas. Parece uma vida aborrecida, pouco interessante, pouco útil ... Vida dos Números, está a ver?
- E ...?
- E ... e ...., pronto, gosto de o juntar com as Vagas. É muito mais divertido!
- Não estou a perceber.
- Então Sr. Detetive? Olhe, é assim. Vagas sobre Candidatos. Candidatos sobre Vagas. É como quiserem. Não acha divertido? Veja. Temos 20 Vagas. Faça de conta que há 100 candidatos. Pronto, só satisfaz 1 em cada 5, poucochinho não acha, só 0,2. Os outros 4 não ficam nada satisfeitos. Ficam Insatisfeitos.
- Mas é satisfação ou insatisfação, aquilo com que estamos a lidar?
- Se for comigo é Satisfação. Insatisfação é com a minha irmã gémea! Não a quer entrevistar também?
- Não, não quero. Pelo menos por agora. Só me faltava ter que lidar com gémeas... Então e Criminologia?
- Ah ... Criminologia ... Isso é mais com a minha irmã.
- Como?
- Tem pouca Satisfação da Procura. Portanto, tem muita Insatisfação, está a ver?!
- Sim, sim, já percebi o esquema! Então mantém que Criminologia é o curso com maior procura?
- Mantenho? Mas eu nunca disse isso, Detetive! Comigo é uma questão de Satisfação, compreende do que estou a falar, não é verdade?
- Mas é o que vem nos jornais. Em vários. Todos a apontam como testemunha. A testemunha que mostra que Criminologia é a Licenciatura mais procurada!
- Nunca disse tal coisa! Não me podem meter nesta embrulhada. Era o que faltava!
- Mas então o que foi que disse, mesmo, sobre ela?
- Oh! Coitadita. Só disse que a Satisfação era muito baixa. Muito baixa mesmo. A menor. E pronto, já contei tudo. Agora quero voltar para a DGES!
Registei: Criminologia. A menor Satisfação da Procura.
- Ainda não acabei. Mas isso não é o mesmo que dizer que é a mais procurada, jogando com as palavras?
- Não, Sr. Detetive. Procura e Satisfação de Procura não é a mesma coisa.
- Mas sabe que também a chamam Procura?
- Não me importo que me chamem. Não é por mal. Mas o meu nome próprio é Satisfação. Faz toda a diferença, não acha? Agora quero mesmo ir embora.
- Só mais uma pergunta.
- Sim?
- Quantos Candidatos ficam à porta?
- Como quer que eu saiba? Eu divido. Vagas e Candidatos. Não subtraio. Candidatos e vagas. Isso não é comigo. Gosto de os juntar, às Vagas e Candidatos. Mas com a operação certa. Percebe?
- Obrigado. Não se afaste muito. Posso precisar de voltar a interrogá-la.
- Nome?
- Candidatos.
- O que faz?
- Conto quem procura uma licenciatura.
- Conta? Apenas?
- Sim. Só conto. Sabe como é: tantos para aqui ... tantos para ali.
- Conta ... Sempre da mesma maneira?
- Pois, com certeza. Temos que ser rigorosos. Não podemos falhar. Agora o que me pedem mais são os candidatos em 1ª opção. Mas às vezes querem outras coisas. Contar por fases, primeira, segunda, terceira. Ou por região. Coisas assim.
- O que me pode dizer sobre a Criminologia?
- Criminologia? Essa é nova na zona. Só anda por aqui há um par de anos.
- E então?
- Então ... Já deu nas vistas, isso é certo, mas não é das que me dá mais trabalho. Anda agora nos 170 Candidatos. Acho que ainda é capaz de subir. Mas isto às vezes é por modas. Como aconteceu há anos com a Civil. Subiu e depois desceu, desceu, desceu. Agora está outra vez a subir.
- Então a Criminologia não é a que a tem mais Candidatos.
- Não, nem de longe. Há outros. Vários.
- Ai, sim? Isso é muito vago. Preciso de nomes!! Nomes que possa verificar.
- Calma ... calma ... não é difícil. Assim de repente, daqueles que estão aí para cima de quatrocentos, lembro-me de várias medicinas, direitos, gestão ...
- Espera aí. Deixe-me apontar. E olhe que vou confirmar. Um a um. Por isso é bom que a informação esteja correta!
- ... gestão, engenharia informática, enfermagem.
- Portanto, Criminologia não é das mais procuradas?
- Criminologia ?! Claro que não!! Sei muito bem o trabalho que tenho!
- Diz-se por aí que é quem tem menos Satisfação da Procura.
- Disso não sei nada. Eu sei quantos procuram. Conheço-os a todos. De onde vêm, com que média, para onde querem ir. O que preferem. Olhe, até dava para lhes fazer aparecer uns anúncios da internet, daqueles à medida! Vender-lhes umas coisitas. Para fazer uns dinheirinhos extra.
- Muito engraçado, sem dúvida ... Olhe ... e quanto a candidatos à porta?
- Nada sei sobre isso. Está a perguntar à pessoa errada. O que lhe digo é que em Direito, em Lisboa, são mais de 800. Acha que me ia esquecer de números assim?
- Sabe quem me poderá dizer alguma coisa sobre isso, sobre os que ficam à porta?
- Assim de repente, nem por isso ... a não ser que ...
- A não ser que?
- A não ser que fale com as Vagas. Mas essas são muito constantes. Parece que não envelhecem, quase iguais de ano para ano.
Vagas, registei, para usar em caso de necessidade. Candidatos. 170, muito menos que 800. Sim, pensei, alguns daqueles nomes são mais credíveis para os mais procurados. Desenhei um ponto de interrogação. Dois pontos de interrogação. Candidatos igual a Procura? Procura diferente de Satisfação da Procura?
- Então, Chefe? Vamos ao último?
- Espera. Falta-nos perceber a relação disto tudo com as Vagas.
- Quer que a vá procurar?
- Não, não. Talvez não seja preciso. Dizem que variam pouco. Tens aquelas listas, com a identificação das Vagas?
- Sim, estão aqui Chefe.
- Hum.... Direito, Lisboa, 560 vagas. Candidatos eram, escrevi aqui, mais de 800. São quase 250 que ficam de fora.
- São muitos, Chefe.
- Pois, isso. Criminologia, 25 vagas. Candidatos eram 170. Menos de 150 de fora. E há mais assim. Realmente tem a ver com Candidatos e Vagas.
- Não percebo.
- Procura, Satisfação de Procura, Candidatos que ficam de fora.
- Não estou a perceber ... E o que acontece à Criminologia?
- Vamos falar com a Média.
As peças começam a encaixar. Preciso de obter as informações que me faltam. Venha a Média. Terei de a pressionar. Sei que não gosta que façam juízos sobre ela. Irrita-se quando dizem que é injusta e que causa problemas a muita gente. É um ponto de partida. E depois de começar a falar ...
- Média. Ou devo dizer Dificuldade?
- Dificuldade?
- Sim, não é outro dos seus nomes? Dificuldade? Dificuldade de entrada? Média exigida? Barreira? Empecilho?
- N...n....n...não ....
- Não?! Não quer pensar melhor?! Não é quem decide quem entra e quem fica de fora?
- Não, não, não ... não faço nada disso!
- Assusta muitos Candidatos! Sabe que sim! Vamos lá ...
- Isso não é justo! Eu só apareço depois, no fim, no fim de tudo, quando está tudo decidido, não tenho nada a ver com o que se passa. Não tenho nada a ver com as entradas.
- Não acredito! Tenho aqui um elemento de prova que diz "Engenharia aeroespacial - nota do último colocado 188". 188! Parece-lhe bem?
- Mas ... mas ...
- Diga-me: como se faz isto?
- Estou farta de ser olhada de lado! As pessoas não percebem! Eu não apareço no início. Não digo a ninguém: "para entrares aí tens de ter esta média". É ao contrário. Primeiro entram todos, ordenados, pelas médias, claro. E quando entra o último eu pergunto: qual é a tua? Ele diz e pronto. É assim que apareço. Sou a nota do último colocado. Não é ao contrário! Não é como se o Governo decidisse o meu valor! Nem podia. Já me informei dos meus direitos! Mas também não é como se as Universidades decidissem o meu valor. Até podiam, que eu sei. Mas não costumam. Nada que seja muito acima da positiva. E ...
- Mais devagar, quer dizer ...
- Perguntou e eu estou a responder! Estou a dizer a verdade! Não sou eu que tenho a culpa. As pessoas olham para o meu passado, para o que fiz no outro Verão, e dizem que quem tiver menos já não entra, que é preciso ter aquela nota, que só assim ...
- Espere aí! Deixe-me tomar nota. Portanto, só aparece depois.
Média aparece no fim, escrevo. Declina qualquer responsabilidade.
- Sim, já disse isso. Não me está a ouvir? É sempre a mesma coisa. E depois sou eu ..
- Indicadores ... sempre mais difíceis ...
- Também não é preciso insultar. Sim sou um Indicador! Mas comigo é a mesma como quando vai aos bancos. Aqueles anúncios em letras pequeninas. Rendimentos passados não garantem rendimentos futuros! Aqui é a mesma coisa. Médias passadas não impõem médias futuras. Tudo depende das notas dos Candidatos, dos exames, das escolhas, das Vagas, etc, etc. Só não depende de mim! Porque eu ...
- Sim. Já sei: só aparece no fim.
- Exatamente! Finalmente está a perceber!
- Hmmmm. Então porque é que lhe chamam também Dificuldade?
- Acham mais simples assim, imagino.
- Então 188 a Aeroespacial não quer dizer que é difícil?
- É 188 porque quem tinha essas medidas quis ir para lá.
- Mas ter 188 é difícil.
- Lá está outra vez com a mesma ideia fixa! É difícil, pois. Mas olhe, há gente que chegou lá. E até há quem chegue aos 200. E pronto, quando um grupo assim procura uma licenciatura ... em algum lado a Média vai ser alta. Já lhe falei das Vagas? Sabe, é que reparei que se as Vagas não forem muitas é mais fácil eu ser mais alta. Engraçado, não é?
- Mas Criminologia, não é a mais difícil?
- Criminologia? Essa miúda? Acho que ficou pelos 160. Mas não sei se é mais difícil ou mais fácil. Olhe, se os Aeroespaciais, todos, procurassem entrar para o Crime até acho que me davam um valor mais elevado. Era capaz de chegar aos 195, digo eu. Era bonito, não? E se o Crime fosse para o espaço podiam trocar as Médias, quer dizer, trocarem-me a mim. Ai! Já estou a ficar baralhada.
- Então tudo depende da Procura, e da Satisfação da procura.
- Isso já não sei. Não me dou bem com essa gente. Mas de mim não é. Eu só ...
- Aparece no fim, já sei. Agradeço o seu depoimento. Foi muito útil.
- Mas não acha que as Universidades podiam fixar um número mais engraçado, sei lá 12, ou 14, ou até um número ímpar?
- Se quer que lhe diga, isso não me interessa. Não faz parte deste caso.
Tudo se tornava agora claro na minha mente.
- Então, Chefe? Terminamos?
- Sim. Criminologia não é a licenciatura mais procurada. Nem a que mais Candidatos deixa à porta. Nem a mais difícil de entrar, se prestarmos atenção ao que nos disse a Média.
- Inocente? Em tudo?
- Vê bem. Direito tem muito mais Candidatos. Direito e outros. E também esses deixam mais candidatos à porta, se olharmos bem para as Vagas. E não tem a Média mais elevada embora aí seja mais complicado porque ...
- Porque a Média só aparece no fim, quando as escolhas já foram feitas e ... e .... também tem a ver com as Vagas.
- Isso mesmo! Ainda vais chegar a Detetive.
- Mas, então, como se explica que tenha sido a Criminologia a ser identificada?
- Identidades trocadas. Satisfação da Procura e Procura. Apenas têm o apelido em comum. Mas são muito, mesmo muito diferentes. Se vires bem, Procura e Candidatos são um e o mesmo. Números, percebes. Absolutos, de leitura direta. Já a Satisfação é um Indicador, tens de ter muita atenção ao que diz e, mais ainda, ao que pode querer dizer.
- Lá muito para dizer tinha ela ...
- Pois ... assim que começa a falar ... gosta de ter audiência.
- Ainda assim, custa-me a perceber como é que ninguém duvidou...
- A Criminologia deu nas vistas, assim que chegou. Essa miúda tornou-se um alvo, atraente. Fica bem nas fotografias e nos cabeçalhos. Mas não foi ela, e isso é que importa.
Caso resolvido. Visto a gabardina e pego no chapéu.
- Chefe?
- Sim?
- Acha que a Criminologia, alguma vez ... alguma vez será a mais procurada?
- Talvez ... quem sabe?
Fecho a porta do escritório. Faço ranger os degraus da escada de madeira. Saio para a rua mal iluminada. O poste inclinado parece olhar para mim. A luz pálida estremece. Números e Indicadores. É preciso pensar como eles. Pelo menos, hoje, não irei sonhar com o sistema de equações impossível de resolver.
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