sexta-feira, 15 de novembro de 2024

No espaço público

The Age of Comics








25 anos de textos no espaço público. Ao sabor das leituras, da reflexão, da inspiração ... e das irritações. Ensino Superior e Ciência. Política e Serviços públicos. Serviço público. Pensamento que procura ser crítico. Tentando ir para além da superfície. Pensamento partilhado. Como contributo para o debate. Como contraponto. Pensamento exposto. Expondo-me. 
Antecedendo este blog e continuando para além dele. Como as cartas e artigos publicados em órgãos de comunicação social. Em suporte físico ou digital. Em forma de palavra escrita ou de palavra falada. Público. Expresso. Observador. Antena 1. Como os contributos submetidos no âmbito de consultas públicas, no portal do Governo, ou numa Universidade perto de si. 
Escrita Bonsai. Aparada em função do limite imposto, em número de palavras ou de caracteres, ou em tempo que se escoa em minutos, poucos. Escolhendo palavras, reduzindo frases, removendo pormenores. Revelando a essência. 
Eis os textos, para além do Blog.
No Semanário Expresso
13/09/2024 País bipolar
No Jornal Público
No Observador
Na Antena 1
As Notas Sobre o Ensino Superior fizeram parte, de 2012 a 2016, do Click, um programa da Universidade de Aveiro então emitido aos sábados no espaço "Os Dias do Futuro". Um desafio lançado pela Catarina Lázaro, combinando informação e opinião, para um público alargado, em não mais de dois minutos por episódio (tempo que acabou por ser, quase sempre, um pouco mais!). 

21/01/2012 Há Universidades a mais?
25/02/2012 Formação e emprego
31/03/2012 Financiamento do Ensino Superior
05/05/2012 Um trekking de alta montanha
09/06/2012 O que vemos ao olhar para um telemóvel?
28/07/2012 Mitos
26/10/2012 Rankings: Manusear com cuidado!
01/12/2012 A Rede
19/01/2013 Trabalhadores não-não
23/03/2013 Estudo e relatórios
08/06/2013 Da Autonomia
20/07/2013 Desemprego e vagas: ligações perigosas
28/09/2013 Colocar em perspetiva
16/11/2013 A reforma do ensino superior
28/12/2013 2014
08/02/2014 Eu patenteio, tu patenteias, ..., nós patenteamos (pouco), eles patenteiam (muito)
29/03/2014 A ponta da cauda
25/05/2014 Um novo modelo de financiamento?
27/09/2014 Mais superior
15/11/2014 Falando de propinas
27/12/2014 Internacionalizar
21/02/2015 O tempo dos consórcios
06/06/2015 Empregabilidade
03/10/2015 O mar que sobe
12/12/2015 Um fenómeno estranho!
30/01/2016 Revolução
26/03/2016 Autonomias
28/05/2016 Cabelos brancos
23/07/2016 Binário?

Em Consultas públicas
2018 Com as mão na massa - Proposta de alteração ao Regime Jurídico dos Graus e Diplomas do Ensino Superior
2024 Consulta pública, contributo público - Projeto de alteração dos estatutos da Universidade de Aveiro

País bipolar

Texto publicado no Expresso de 13 de setembro de 2024, sobre um tema que já tinha passado nas Notas em 2018, à data da proposta do governo.

Na última edição, a propósito da concentração de estudantes universitários em Lisboa e Porto, recordava-se a proposta do ministro Manuel Heitor (2018) de reduzir vagas nestas. Invocaram-se então os exemplos da Áustria, apontado como o segundo país com maior concentração de estudantes em duas cidades (Viena e Innsbruck), com 31%, e Espanha, com 27% em Madrid e Catalunha.

Faltou, no entanto, um olhar atento sobre o território. As províncias de Viena e Tirol (onde se situa Innsbruck), representavam à data 30% da população austríaca. Peso semelhante tinham as regiões de Madrid e Catalunha. Em Portugal, as Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto acolhiam 44% da população, a que se poderia juntar aqui, residentes em Leiria e Santarém, distritos sem universidades públicas.

Sim, deste ponto de vista Portugal será o mais bipolar, em sentido literal e até figurado. Mas nestes três casos a concentração de estudantes assemelhava-se à da população. 

terça-feira, 29 de outubro de 2024

Vamos falar de propinas

 






Em versão curta, publicada no Expresso de 1 de novembro de 2024
Luís Cabral afirma, na última edição, que o principal problema económico da frequência do ensino superior não são as propinas, mas os restantes custos, diagnóstico hoje consensual. Para o resolver, preconiza o pagamento de propinas ao preço de custo, para quem pode, e a utilização dessa verba para suportar os custos de quem não pode. O contrário só será justificável por ignorância ou populismo de esquerda, diz! Há quem tenha poucas dúvidas e raramente se engane, o que não é o meu caso, mas parece ser o de alguns economistas. Olho à volta. Em Inglaterra e nos Estados-Unidos os valores substancialmente elevados são pagos, sobretudo, por quem pode recorrer ao crédito, contraindo assim uma dívida que se prolonga por décadas. Na Áustria, Alemanha, França, Finlândia, e República Checa não existem propinas ou são residuais. Ignorantes? Populistas? A discussão séria, necessária, em torno de visões diferentes, dispensa simplificações e qualificativos abusivos.
Em versão alargada
Tendo a olhar com prudência para escritos em espaço fortemente limitado, como é o caso dos jornais em espaço físico. Sei como é difícil abordar questões complexas nesses meios, com o risco inerente de simplificação excessiva. Sei que as escolhas do que fica dentro e o que fica fora, e das próprias palavras utilizadas, podem induzir diferentes leituras. Mas estou habituado a lidar com limites impostos ao número de palavras ou carateres de, a fazer escolhas, a praticar uma escrita a que chamo bonsai, procurando aparar, mantendo a forma e vitalidade. No fim, a responsabilidade primeira da mensagem, é do autor.

Vem isto a propósito de uma leitura recente e da reflexão que me suscitou. Foi no fim de semana passado que, enquanto folheava o Expresso, como habitualmente, me detive num artigo sobre o papel do ensino superior como elevador social. Da autoria de Luís Cabral, professor de Economia na Universidade de Nova Iorque, abordava as dimensões de acesso, económica e social. Chamou-me a atenção, principalmente, a vertente económica. Pelo conteúdo, pela forma, pelo tom. Pelas escolhas.
Concordo com o ponto de partida enunciado. “O problema económico é muito mais do que as propinas: entre alojamento e alimentação e livros e outras despesas, o custo pode chegar a 900 euros mensais.”. Acredito que isto é hoje consensual na generalidade dos meios. Um facto acentuado por anos de descida do valor máximos das propinas e de subida extremada, e muito superior, dos custos com a habitação, a para de um período recente de inflação elevada.
Assim, estranho a afirmação que se seguia de imediato. “A ideia de que o problema económico se resolve com propinas baixas ou nulas, por melhor intencionada que seja, não faz sentido.”. Não me parece que os defensores de propinas baixas ou nulas afirmem que tal resolve o problema económico. Não é isso que tenho ouvido. Não é por isso que continuam a ser um ponto de debate. Talvez tenha sido assim no passado, mas e, também, por uma questão de modelo de sociedade e de repartição de bens e de custos. 
Prosseguindo. “Mais importante ainda, as propinas baixas ou nulas tornam a universidade pública um subsídio aos ricos à custa do contribuinte médio. Estamos nós aqui com taxas de IRS altas e crescentes para depois desfazer a progressividade da tributação com um sistema altamente regressivo.”. O nosso modelo de impostos assenta, de facto numa tributação progressiva dos rendimentos, e não num pagamento diferenciado e progressivo em cada acesso a um serviço público, sejam eles de educação, saúde, justiça, ou de infraestruturas.  Não é para mim claro se o autor preconiza um modelo de taxação mais elevada de acesso, progressivo, em substituição ou em conjugação com os impostos sobre o rendimento. 
Daqui ao que se segue é um pequeno salto, em que o autor não se coíbe de qualificar a situação e os seus defensores, antes de avançar para “a” solução, determinística e única. "É ineficiente, é injusto, é apenas justificável ou por ignorância ou por um populismo (neste caso de esquerda) que tem de ser denunciado. Cobrando propinas a sério, pelo menos ao valor de custo, o sistema público encaixaria um bolo de receitas mais do que suficiente para apoiar os estudantes economicamente desfavorecidos, não só dispensando-os do pagamento de propinas, como também atribuindo um estipêndio condigno com a vida de estudante longe de casa (o que é frequentemente o caso)."
Há quem tenha poucas dúvidas e raramente se engane, o que não é o meu caso, mas parece ser o de alguns economistas. O que não cessa de me espantar num domínio, por excelência, de construções sociais e de interação entre indivíduos, felizmente diversos, com espírito crítico uns mais do que outros, anseios e visões diferenciadas. 
Voltemos à substância.
Olho em redor. Em Inglaterra e nos Estados-Unidos são praticados valores de propinas substancialmente elevados. Quem pode, como sempre acontecerá, paga à cabeça, a pronto. Depois, nesses países, paga quem tem acesso ao crédito, contraindo assim uma dívida que se prolonga por décadas, com óbvios custos de disponibilidade financeira e, portanto, de oportunidade. E com os riscos inerentes, bem reais, de crédito malparado, de uma bolha de dívida, ou até da transferência de carteiras de dívida para fora da esfera pública. Não consta que sejam dos países em que o valor das propinas mais reverte para o acesso de outros ao sistema de ensino superior.
Olho em redor. Na Áustria, Alemanha, França, Finlândia, e República Checa não existem propinas ou têm um valor residual. Não são, sequer, os únicos países da Europa em que tal acontece. Aliás, em quase todos as propinas estarão muito distantes do preço de custo. Ignorantes? Populistas? Ou com uma visão diferente para a sociedade? Que deve ser debatida, que importa debater, seriamente, sem simplificações e qualificativos abusivos. 
Continuemos, na tentativa de perceber o argumento. Propinas pelo menos ao valor do preço de custo. Pelo menos. Portanto, possivelmente, até mais, à laia de imposto. E quanto ao preço de custo? Aqui, será necessária uma análise que permita estimar e atualizar os preços reais do ensino universitário. Tarefa mais difícil do que possa parecer, em instituições que combinam muitas funções, com partilha e segmentação de recursos, e com uma contabilidade que pode não representar rigorosamente todos estes domínios. Um custo que será necessariamente diferente de instituição para instituição, em função do corpo docente, dos serviços de apoio, dos serviços adicionais para os estudantes, da dimensão, tipologia e idade do edificado. Um custo que, adicionalmente, variará no tempo, ano a ano, em função de recrutamentos e cessações, de evolução dos ativos, do próprio número de estudantes.
E quanto à redistribuição para quem necessita? As instituições são assimétricas em relação aos estudantes que as frequentam e, portanto, ao balanço entre deve e haver, entre quem pode pagar e quem necessita de apoio. A que se somam as assimetrias regionais em termos de custo de vida. Passarão, assim, as propinas a ser receitas do Estado, que ficará encarregue da redistribuição? 
É tempo de concluir. “Na minha opinião, tanto o problema da admissão à universidade como o pagamento económico seriam facilmente resolvidos se houvesse mais vontade política e menos demagogia.”. Não sei se os problemas seriam facilmente resolvidos. Concordo quanto à necessidade de menos demagogia, incluindo de quem tem acesso ao espaço público.

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Consulta pública, contributo público

Em 2006 e 2007 acompanhei de perto, por dever de ofício, as propostas e finalização do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior. Em 2008, apoiei os trabalhos da Assembleia Estatutária da Universidade de Aveiro, que culminaram com a aprovação da transformação da instituição em fundação pública com regime de direito privado e, subsequentemente, já em 2009, com a negociação do contrato fundacional e a aprovação dos estatutos ao abrigo do novo quadro legal. Foram tempos desafiantes, de estudo, de discussão aprofundada, de escritas partilhadas, de procura da compatibilização entre princípios, modelo e forma, do sentimento de se escolher e construir um futuro, de entre muitos possíveis. Após esse período, e durante meia dúzia de anos, lidei de perto com a implementação e a vida institucional sob o novo modelo de governo e gestão então aprovado.

Numa entrevista de 2000, pela mão de Clara Ferreira Alves, e recuperada pelo Expresso, em 2016, por coincidência ano de mudança do meu papel na instituição, João Lobo Antunes afirmava "Se há um capital de experiência e reflexão, ele tem de ser partilhado, isso é suprapartidário, é um magistério. Nunca seria um político. Primeiro, porque sou pragmático, gosto de resultados limpos. Segundo, tolero mal a crítica. E terceiro, gosto de ser eu a selecionar as situações."

Procurando seguir esta linha, às vezes com mais esforço do que noutras, partilhei, e partilho aqui também, a experiência e reflexão de anos, na forma de um contributo efetuado no âmbito da consulta pública, recentemente concluída, do Projeto de Alteração dos Estatutos da Universidade de Aveiro

Para quem tiver interesse na matéria.

Nota prévia

1. O presente contributo é apresentado no âmbito da consulta pública em curso relativa à Proposta de Alteração dos Estatutos da Universidade de Aveiro, doravante designada Proposta.

2. O contributo incide, predominantemente, sobre as opções políticas e de organização da Universidade contidas na Proposta, bem sobre algumas ausências.

3. O contributo segues uma estrutura e sequência semelhantes às da Proposta, com o intuito de facilitar a sua leitura em articulação com a Proposta e possibilitar fácil referenciação.

Do preâmbulo

4. O preâmbulo confere destaque a alguns aspetos da Proposta, como a criação de unidades transversais nos três eixos da missão da UA, o aumento da representatividade das unidades orgânicas nos Conselhos Científico e Pedagógico, a criação do Conselho de Diretores, a introdução de Comissões Científicas e Comissões Pedagógicas nas unidades orgânicas de ensino e investigação, e a alteração do processo de eleição do Diretor destas Unidades. 

5. Há ainda outros aspetos de relevo como a alteração da presidência dos Conselhos Científico e Pedagógico, autonomizando-a do cargo de Reitor.

6. Numa apreciação global, considera-se que a Proposta traduz uma apreciação negativa do atual modelo de organização e governo, preconizando uma reversão ao modelo prévio ao Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), dentro do quadro atual vigente.

7. Reversão, contudo, parcial. 

8. Parcial porque não abrange a composição do Conselho Geral, aspeto em que existe ainda capacidade de opção, como se abordará adiante.  

9. Parcial também, porque não contempla a criação de um órgão de composição alargada, com representação dos vários corpos da Universidade e competências consultivas, que permitiria um debate alargado das políticas institucionais, podendo assim fomentar o sentimento de comunidade, bem como a representatividade das pessoas, e não apenas das unidades orgânicas.

10. Teria sido relevante dispor de uma medida do impacto da Proposta, designadamente no que se refere à alteração do número de órgãos e cargos, com o inerente acréscimo de carga na dimensão da gestão institucional.

11. Tal medida seria, naturalmente, uma estimativa, até porque a dimensão de alguns dos órgãos é matéria regulamentar e não estatutária.

Estrutura orgânica

12. A proposta de alteração à estrutura orgânica, contida no artigo 8º, incide, principalmente, na inclusão de três novos Institutos na estrutura orgânica. 

13. Na alínea c) do seu número 5 são referidas, como unidades básicas de cooperação, “oficinas de transferência de tecnologia e unidades de índole similar”, unidades que não constam de outros artigos da Proposta. 

14. Não identifiquei qualquer referência a estas oficinas no Plano Estratégico vigente, no Plano de Ação para o ano em curso, no site da UA, ou através de uma pesquisa mais genérica. 

15. Não é, assim, claro a função e enquadramento organizacional de tais unidades e, designadamente, se serão adstritas a unidades orgânicas de ensino e de investigação, a unidades de investigação, ou possuirão um cariz diferenciado. 

16. Sugere-se que no ponto 9, se leia: “As unidades orgânicas de ensino e investigação”, em conformidade com a epígrafe e conteúdo da listagem contida no Anexo II.

Formação dos órgãos

17. Existindo órgãos colegiais únicos para a instituição e órgãos colegiais de unidades integrantes da estrutura orgânica, sugere-se a adaptação, em conformidade, do número 2 do artigo 13.º, uma vez que o “justo equilíbrio das diversidades unidades orgânicas” não se aplicará aos segundos.

18. Considera-se desadequada a inclusão, no mesmo número, de uma menção específica à equilibrada representatividade de docentes e investigadores, e apenas destes, desde logo quando existem outros corpos presentes em diversos órgãos colegiais, e aspetos específicos de natureza e equilíbrio de composição, como sejam os casos dos Conselhos Científico e Pedagógico. 

19. Propõe-se adicionar um princípio estruturante, condizente com o espírito de uma comunidade universitária una, relativo à condução dos processos eleitorais, consagrando que cada processo eleitoral deve ser conduzido por uma única comissão eleitoral, ao invés da prática de segregação dos processos eleitorais de membros-estudantes.

20. Tal segregação fere sobremaneira o espírito de comunidade, induzindo uma divisão em lugar de promover um sentido de pertença.

21. Adicionalmente, e numa perspetiva operacional, tal segregação prejudica a eficiência dos processos, como a experiência passada ilustra de forma abundante e nem sempre dignificante.

Conselho Geral

22. A Proposta não apresenta alterações à composição do Conselho Geral. 

23. Um dos temas de debate a propósito do RJIES e da sua eventual revisão, diz respeito à eleição do Reitor e à tomada de decisão em matérias estratégicas, ambas da competência de um número reduzido de pessoas, não superior a 35.

24. Esta matéria ganha especial acuidade no caso da Universidade de Aveiro, que, com 19 membros, tem um dos Conselhos Gerais de menor dimensão e próximo do número mínimo legalmente fixado.

25. Admite-se que a comunidade da UA partilha um sentimento de maior participação, quer no processo de eleição do Reitor, quer nas restantes matérias de competência do Conselho Geral, especialmente nas de maior pendor estratégico.

26. Considera-se que tal sentimento está alinhado com a perspetiva global que enforma esta Proposta como regresso, na dimensão possível, à situação pré-RJIES.

27. Assim, propõe-se fixar a dimensão do Conselho Geral da Universidade de Aveiro em 36 membros, dimensão máxima estabelecida no RJIES.

28. Esta alteração traduz-se num aumento de 84% dos membros do Conselho Geral.

29. Propõe-se, desde já, a seguinte composição, de acordo com os parâmetros definidos pelo RJIES e pela capacidade de decisão institucional, mormente no que se refere à inclusão de trabalhadores não docentes e não investigadores: 18 representantes dos docentes e investigadores, 5 representantes dos estudantes, 2 membros eleitos pelo pessoal não-docente e não investigador, e 10 Personalidades externas de reconhecido mérito, não pertencentes à instituição, com conhecimentos e experiência relevantes para esta.

Coadjuvação do Reitor

30. A Proposta elimina a menção vigente a propósito de coadjuvação por Pró-Reitores, “estes para o desenvolvimento de projetos específicos”. 

31. É certo que tal disposição nunca correspondeu à prática adotada pelos sucessivos Reitores. 

32. Mas, sem alguma diferenciação, haverá apenas Vice-Reitores de primeira e Vice-Reitores de segunda, ficando apenas vedado aos Pró-Reitores, nos termos dos Estatutos, a possibilidade de lhes ser delegada competência para a presidência do Conselho Geral dos Serviços de Ação Social.

33. Propõe-se a limitação do número máximo de coadjuvantes do Reitor. 

34. Este número foi aumentando em diversas universidades públicas portuguesas, em especial após a entrada em vigor do RJIES, tendo alcançado ou mesmo superado a dezena, em diversas instituições incluindo a Universidade de Aveiro. 

35. Observando o funcionamento e organização das Universidades, não se encontra justificação para tal dimensão, sobretudo com o enquadramento de permanência contido na Proposta.

36. É possível identificar em alguma literatura sobre organização e gestão universitária, e na própria experiência da UA, a sobreposição de atuação, designadamente de Pró-Reitores, em áreas que são da efetiva competência da Administração, ao nível da Direção de Serviços. 

37. Tal sobreposição acarreta prejuízos graves para a transparência, responsabilidade, e eficiência institucional.

38. Adicionalmente, nota-se que, quanto à coadjuvação dos Diretores das unidades de ensino e investigação, a Proposta contém limites mínimos e máximos.

39. Tal facto é interpretado como a conveniência de delimitação do número de coadjuvantes, atenta a dimensão da respetiva unidade, ou no caso dos coadjuvantes do Reitor, da dimensão institucional.

40. Os aspetos acima enunciados justificam a imposição de um limite máximo para o número de coadjuvantes do Reitor.

Conselho Científico

41. Chama-se a atenção para o possível conflito entre o disposto no número 3, alínea a), “(…) são automaticamente considerados membros os coordenadores dessas unidades” e o disposto no número 7, “A duração do mandato (…) é de três anos, não podendo ser exercidos mais do que dois mandatos consecutivos”.

42. Não é patente o aumento da representatividade das unidades orgânicas neste órgão, conforme enunciado no preâmbulo.

Conselho Pedagógico

43. Não é patente o aumento da representatividade das unidades orgânicas neste órgão, conforme enunciado no preâmbulo.

Da eliminação do Conselho para a Cooperação

44. A Proposta elimina o Conselho para a Cooperação, órgão consultivo consagrado originalmente no artigo 32.º dos Estatutos de 2009, e no artigo 31.º dos Estatutos de 2012.

45. Este órgão, consultivo, mas não facultativo, nunca foi criado. 

46. Assim, esta disposição estatutária não foi respeitada pelos sucessivos Reitores, desde 2019, a quem competia e compete a concretização do modelo estatutário de organização e gestão. 

47. Primeiro, foi alterada a sua natureza e composição, em 2012, sendo agora proposta a sua extinção, sem mais.

48. Não existe, pois, qualquer experiência institucional relativa às mais ou menos valias de tal órgão, ou até, no limite, à a sua inutilidade, desconhecendo-se igualmente qualquer reflexão publica ou publicada sobre esta matéria.

49. Realça-se que, após a alteração introduzida em 2012 quanto à sua composição, o Reitor goza de total liberdade para a escolha dos membros deste órgão.

50. Trata-se, deste modo, do único órgão, com natureza consultiva, com possibilidade de congregar experiências e valias externas à UA, caso fosse essa a opção do Reitor.

51. Tais experiências seriam especialmente relevantes para uma instituição que sempre se proclamou como aberta à sociedade.

52. No passado, ainda antes do RJIES e da subsequente alteração estatutária, a Universidade de Aveiro experimentou o que se poderia considerar uma estrutura embrionária deste Conselho, à data sob a designação de Conselho Estratégico.

53. Nota-se que o Instituto para a Cooperação contido na Proposta é um órgão de natureza diferente, vocacionado para coordenação interna, pelo que não existira qualquer sobreposição entre ambos.

54. Com a eventual eliminação do Conselho para a Cooperação sobrará uma nítida lacuna quanto à participação de membros externos à Universidade na sua estrutura de governo. 

Organização das Unidades Orgânicas de Ensino e Investigação

55. Considera-se desnecessária a inclusão da especificação “com uma vertente estratégica” referente ao programa do Diretor da Unidade. 

56. O referido programa deve abranger todo o mandato do Diretor, ou seja, quatro anos, o que implica, necessariamente, uma abordagem de nível estratégico de médio prazo para a unidade a que se candidata. 

57. Sendo o programa dos candidatos a Diretor, com as suas virtudes e lacunas, um dos elementos a avaliar durante o processo eleitoral correspondente. 

58. Em matéria relacionada, o artigo 39.º da Proposta dota o Conselho de Unidade com competência para “aprovar o documento de estratégia da Unidade de acordo com os parâmetros estabelecidos no plano estratégico da Universidade e em conformidade com o programa de ação apresentado pelo Diretor, aquando da respetiva candidatura”.

59. Pressupõe-se que o documento de estratégia da unidade seja diverso do programa de candidatura e que, embora tal não esteja especificado na Proposta, seja também submetido pelo Diretor.

60. Não é clara qual a articulação entre o programa de candidatura e o documento de estratégia, sendo que este último, necessariamente, será submetido tempo posterior ao primeiro, pelo que terá um tempo de vigência inferior dentro do mandato do Diretor. 

61. Não é claro, ainda que não tal seja necessariamente matéria estatutária, qual o horizontal temporal do documento de estratégia.

62. Não é claro o alcance da disposição referentes aos parâmetros estabelecidos no plano estratégico da Universidade para este efeito, concebido para um nível de organização superior ao destas unidades e, pelo menos no estado atual dos planos, sem parametrização óbvia.

63. Os prazos de vigência do programa estratégico da Universidade e dos diferentes programas estratégicos da unidade raramente estarão temporalmente alinhados, não se obtendo um eventual efeito, provavelmente não pretendido, de desenvolvimento de planos em cascata, do nível institucional para o nível das unidades.

64. Será até possível aprovar planos de estratégica de unidade em final da vigência do plano da universidade, potenciando graus de desalinhamento significativos.

65. Nota-se que as unidades orgânicas de ensino e investigação “gozam de autonomia de gestão mitigada”, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 35.º dos Estatutos, podendo a menção “vertente estratégica” agora proposta dar azo a interpretações diversas e autonómicas da competência estratégica destas unidades, designadamente em matéria dos recursos de que dispõe, incluindo os recursos humanos que lhe são afetos pela Universidade.

66. A possibilidade de interpretações diversas prejudica a capacidade de operacionalização da menção agora proposta, pelo que o seu potencial efeito será deveras incerto.

Dos Institutos

67. Propõe-se a criação de três Institutos: de Ensino e Aprendizagem, para a Investigação, e para a Cooperação.

68. Todos estes Institutos têm como objeto de atuação a coordenação integrada das atividades da UA em cada uma das respetivas áreas de intervenção, correspondentes, na essência, às três missões da universidade.

69. Talvez se afigure mais adequado, embora sendo uma questão de somenos, designar apenas como “coordenação”, em lugar de “coordenação integrada”.

70. Parece-se assim recuperar-se os antigos Institutos, como estruturas de nível intermédio entre as unidades básicas e ou transversais e nível de atuação do todo institucional.

71. O aumento do número de níveis de atuação tem o risco acrescido de potenciar zonas cinzentas onde existe potencial conflito ou indefinição das competências que residem nos diversos níveis.

72. Desta forma, considera-se desejável especificar as competências detidas por estes institutos, designadamente face às competências detidas por unidades, algumas das quais dotadas, pela Proposta, de planos estratégicos.

73. A forma proposta para cada Instituto apresenta similitudes, mas também diferenças.

74. No Instituto de Ensino e Aprendizagem não é referido o domínio da internacionalização, ao invés do que é proposto para os restantes Institutos, o que se estranha, desde logo tendo em consideração as prioridades da União Europeia nesta matéria, com especial incidência na mobilidade de alunos de primeiro e segundo ciclos, e das tendências à escala global neste campo.

75. Ainda neste Instituto, e uma vez mais ao invés do que é proposto para os restantes, não é feita menção às “novas perspetivas de intervenção, incremento de visibilidade e captação de novas oportunidades de projeção nacional e internacional da Universidade”, não se descortinando razão para o efeito, designadamente num contexto em que a Universidade efetua parcerias nacionais para estes níveis de ensino, integra redes internacionais, e é parceira no projeto de desenvolvimento de uma Universidade Europeia.

76. Um outro nível de diferenciação nas propostas referentes aos três Institutos diz respeito à sua organização. 

77. Para o Instituto de Ensino de Aprendizagem preconiza-se um conselho presidido pelo Reitor. 

78. Para o Instituto para o Ensino e Aprendizagem preconiza-se um Conselho, presidido pelo Reitor, mas que integra todos os diretores e coordenadores das unidades básicas e transversais de investigação. 

79. Aqui, deverá ser excecionado o próprio Instituto, ele próprio configurado como unidade transversal de investigação. 

80. Para o Instituto para a Cooperação preconiza-se um Conselho presidido pelo Reitor integrando necessariamente elementos internos e elementos cooptados. 

81. Caso seja essa a intenção, sugere-se precisar aqui “elementos externos cooptados”. 

82. Sendo o objeto deste instituo a coordenação integrada de atividades, não me parece que mais-valia dos externos.

83. Toda a restante organização dos Institutos é remetida para o foro regulamentar.

84. Esta diversidade e escasso aprofundamento sugere um grau de maturação diferente nos três casos e, porventura insuficiente.

Nota Final

85. A Proposta mantém as vinte unidades orgânicas de ensino e de investigação.

86. O modelo de organização destas unidades contido na Proposta, aumenta o número de órgãos que estas possuem.

87. As disposições relativas aos processos eleitorais para estes órgãos reconhecem, de forma explícita, a necessidade de métodos excecionais para unidades de menor dimensão, em particular em relação a alguns dos corpos representados.

88. Este facto é ilustrativo não só da diversidade das unidades quanto à sua dimensão, o que por si não constitui um problema, mas aos reflexos que tal acarreta em termos da própria organização interna e, mais importante ainda, de uma diferenciação quanto aos processos de representação.

89. Consultado o portal de indicadores da UA, é possível avaliar a dimensão deste problema, analisando, por exemplo, o número de docentes em “dedicação exclusiva” e “tempo integral”.

90. Esta seleção não corresponde a nenhum dos universos eleitorais, mas ilustra cabalmente a dimensão do problema.

91. Os resultados da consulta acima referida, tendo como base o ano de 2023, revelam sete unidades, num total de vinte, com vinte ou menos docentes da tipologia indicada: Departamentos de Ciências Médicas (20), Ambiente e Ordenamento (18), Ciências Sociais, Políticas e do Território (18), Engenharia Civil (16), Geociências (15), Engenharia de Materiais e Cerâmica (14), e Escola Superior de Design, Gestão e Tecnologias da Produção Aveiro-Norte (14).

92. A merecer reflexão no seio desta revisão estatutária, designadamente quanto ao número de unidades em que poderão não ser aplicáveis os métodos eleitorais preferenciais, e mais além dela.

domingo, 21 de julho de 2024

De chapéus, suspensórios e modas

Chapéus há muitos
Celso Pinto de Carvalho
CC BY-SA 3.0
, via Wikimedia Commons











O Governo quer carregar no acelerador da economia. O Governo quer mais empresas inovadoras. O Governo quer alterar o Estatuto de Carreira de Investigação Científica e do Estatuto do Docente para permitir aos investigadores e docentes em exclusividade serem membros dos órgãos sociais ou acionistas de startups que resultem dos seus projetos de investigação. Está escrito no programa Acelerar a Economia.

Antes de abordar as questões que considero fundamentais, importa aclarar o conceito de exclusividade a que esta proposta se refere. De um modo simplificado, os docentes e investigadores em instituições públicas de ensino superior podes estar enquadrados em dois regimes base, dedicação exclusiva e tempo integral. O que os distingue não é o número de horas contratuais, iguais em ambos os casos, mas a renúncia, no caso da dedicação exclusiva, ao exercício de qualquer função ou atividade remunerada, pública ou privada. E tal renúncia é acompanhada por uma compensação, que é materialmente significativa: um salário superior em 50% a um docente ou investigador em categoria equivalente mas em regime de tempo integral, ou seja que pode auferir rendimentos de outro tipo de atividades.

Examinando a exclusividade mais de perto, verifica-se que a renúncia é, afinal, parcial, e não absoluta. Diria mesmo generosa, uma vez que permite vários tipos de remunerações adicionais. É o caso da realização de conferências, palestras, cursos breves e outras. Mas também da participação em avaliações e em júris em outras instituições, prestação de serviço docente em instituição de ensino superior públicas (com algumas limitações), ou até no âmbito de projetos da própria instituição. Ainda assim, podemos considerar que, na maioria dos casos, se trata de atividades esporádicas, irregulares no tempo, e maioritariamente acessórias.

A proposta do Governo é passar incluir na lista de exceções permitidas a participação em órgãos sociais ou como acionistas de startups que resultem dos seus projetos de investigação. Que são também projetos das suas instituições, acrescento. E, na sua maioria, financiados por dinheiros públicos, acrescento ainda.

Vamos então à proposta.

A documentação que consultei no portal do Governo não continha informação de suporte a esta medida. Nada sobre as áreas, número e papel das empresas com origem em instituições de ensino superior, nada sobre o eventual papel "dissuasor" do atual regime de dedicação exclusiva, nada sobre os resultados esperados, para além de uma alteração de "contexto". Não me parece que resulte de um estudo. Poderá resultar de uma crença. Ou, no pior dos casos, da pressão de uns quantos "empreendedores" avessos ao risco. 

A proposta desvirtua o conceito de exclusividade existente. Desde logo porque a dedicação a uma empresa de criação própria, não é um compromisso esporádico, mas antes uma relação de longo prazo. Depois, porque se trada de uma relação na esfera privada, e não na esfera pública. Assim, ficam as perguntas: Porque é necessário este estatuto de proteção individual, contranatura? Porque é que os docentes-empreendedores, criadores de empresas com elevado potencial acelerador da economia, não transitam para o regime de tempo integral, podendo assim auferir outros valores com origem nas suas empresas? Porque é que, em alternativa, as instituições e os docentes-empreendedores não alienam os resultados da investigação a empresas e investidores privados?

É aqui que entram os chapéus, vários. Do docente e do empresário. Do público e do privado. Do orientador de alunos e do patrão. Do recetor de fundos e do investidor. Chapéus diferentes para a mesma cabeça e para um mesmo fato, uma vez que é a mesma investigação que se encontra de um lado e do outro. Ou pelo menos é indistinta, criando zonas cinzentas que abrangem pessoas, tempo de pessoas, recursos materiais, acesso a recursos digitais, intangíveis. Dando margem à impressão, ou não só, de gastos públicos para ganhos privados. Difíceis de separar, difíceis de escrutinar. Sobretudo porque sei, por conhecimento profissional, quanto o conceito de “conflitos de interesse” parece alheio, diria mesmo alienígena, a muitos, que não a todos, académicos e investigadores. Isso só acontece aos outros.

Mas há outros adereços, para além dos chapéus, nesta moda dos nossos dias. Cintos, coletes, redes, air bags e até paraquedas. Podem conhecê-los por outros nomes. Cursos em empreendedorismo, para várias idades e até aos doutorandos. Omnipresentes. Valorizados. Considerados quase imprescindíveis. A fazer lembrar o exemplo da formação em sustentabilidade. Do berço à idade adulta. Apoios para estágios em empresas. Apoios para doutoramentos em empresa. Apoios para a contatação de doutorados. Apoios à incubação e à aceleração. Agora apoios à criação de empresas privadas por servidores públicos em regime de dedicação exclusiva. 

Sim, são medidas diferentes com objetivos diferentes e, na origem, com destinatários diferentes. Mas em determinados “ecossistemas” torna-se possível ir navegando, durante muito tempo, durante demasiado tempo, à bolina do sopro dos estímulos. À semelhança do que se dizia da agricultura em finais do século passado. À semelhança do que se pode dizer de parte da investigação nos nossos dias.

Esta proposta insere-se nesta lógica. Transitando entre o melhor de dois mundos. Promovendo o empreendedorismo sem risco. Sem o risco de escolher.

sexta-feira, 5 de julho de 2024

A nuvem no fundo do mar

 

Querem colocar uma nuvem no fundo do mar. Li num jornal em papel, à mesa de um café, num sábado que já passou. Jornal que chega agora à sexta, em vez de chegar ao sábado da praxe. Como se tivesse pressa, num sinal de tempos apressados. 
Imagino a nuvem pousada no leito do mar. Trocando o sol e o vento, pelo escuro e pelas correntes.  Amarrada, não se desse o caso de querer flutuar em busca da liberdade perdida. Deixou de ser nuvem passageira que com o vento se vai. Deixou de ser nuvem de trovoada que passa a chuva. Deixou de poder ser observada a mudar de forma, pelo homem que observava as nuvens numa praia do Mediterrâneo, tentando adivinhar o futuro. Imagens. Músicas. Livros. Misturados num redemoinho, de ar, ou de água.
Continuo a ler o jornal. Parece que a nuvem, afinal, é nome próprio. Nome de cabos no fundo do mar, desenrolados ao longo de muitas léguas submarinas. Não chegarão às dez mil. Estendidas numa linha única, não se assemelharão a tentáculos de polvo gigante. Uma linha que amarra continentes, os quais, como se sabe, continuam à deriva, quais jangadas com náufragos. Nuvem. Nome em português para amarrações nas profundezas do mar português. Mares com fronteiras. 
Coisas privadas, de uma empresa dita tecnológica. Daquelas cujo nome agora se conjuga em forma verbal. Daquelas criadas em vésperas da mudança de século, e de milénio. Tempos apropriados para anunciar fins de uns tempos e começo de outros. Visões de futuros. Alguns são agora passados. Outros, estão por aí, presentes. Uns quantos nunca deixaram de ser visões. E outros estão ainda para vir. 
Uma outra nuvem paira por aí. Também se chama nuvem, mas em inglês. Misteriosa e invisível para o comum dos mortais. Entre o material e o imaterial. Objeto quase, escreveria o escritor. Repositório infinito. Para tudo. Do dia-a-dia, do trabalho, do lazer, dos auto-retratos. A culpa é das malditas fotografias, julgo ouvir do croata, que já foi soldado. Aqui não são campos de batalha, talvez, mas pastos de bits e bytes, a não confundir com a mordidela inglesa, nem com trocas dos bês pelos vês. Quantidades que se medem em potências de dez. Kilo, mega, tera. Depois, peta, exa, zetta, e por aí fora. Sem fim.
Ligações sem fios que precisam de ligações com fios. Lampejos de sustentabilidade, devoradores de energia. Imaterialidades feitas de matéria, do silício às terras raras, exploradas pelo mundo, explorando o mundo, explorando as pessoas. Não voltarão os homens a ser postos no lugar das coisas, diz-me o escritor. 
A nuvem do início do texto liga-se à cloud. A cloud liga-se às nossas casas. Ao computador onde este texto foi escrito. Aos computadores onde este texto está a ser lido. Passando por outras máquinas, por repartidores, multiplicadores, servidores, armazéns. Quintas onde se reúnem as alfaias desta nova agricultura. Armazenando, catalogando, classificando. Mas também analisando e aprendendo, a um passo da criação. Passos antes da capacidade de rebelião. Da revolta das máquinas.
IA. Inteligência artificial. IA. Também inseminação artificial e histórias com touros, recordava o cantautor, de sabedoria septuagenária, antes de abordar as vantagens da mesma (da primeira, note-se!) e a sua inspiração panóptica para o futuro. Há quintas e quintas. Havia uma outra em que eram sempre os porcos que formulavam as moções. Os restantes animais percebiam como é que se votava, mas nunca conseguiam formular as suas próprias propostas. Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.
Fábulas e parábolas. Utopias e Distopias.
IA. As iniciais de um escritor. As leis da robótica, bem antes da condução autónoma. O Multivac, também ele desenrolado por todo o planeta e recebendo continuamente informação, angustiado com o peso de conhecer todos os problemas do mundo, e procurando que o desliguem, libertando-o desse fardo. O AC Cósmico, que durante um tempo já sem tempo, e já sem homens, continuou à procura da reposta à última pergunta. Faça-se luz, ordenou o AC, e a luz foi feita. 
Volto à nuvem e aos cabos. Desta vez na televisão. Fala o almirante. Parece que há navios espiões. Russos. Mapeando os cabos. Equipados com submarinos que os podem cortar. Se fosse nuvens no céu, poderiam ser dirigíveis. Qual guerra fria num mundo em aquecimento. Na mesa de cabeceira, não a gente de Smiley, ou a caça ao outubro vermelho. Mas não anda longe. Twilight Struggle - A Guerra Fria, 1945-1989. Um livro de regras que não tem regras para estes tempos.
Escuto. As músicas atropelam-se. Depois vão-se tornando nítidas, emergindo do mar profundo. Ouço as palavras. Terminou o tempo, a canção chegou ao fim, julguei que teria algo mais para dizer. 
Carrego no botão. Separo-me da rede.

domingo, 14 de abril de 2024

Governo alternativo

Thomas Hawk, Flickr








O Governo disse ao que vinha e o ministro da presidência reafirmou-o em conferência de imprensa. Um governo humilde e de diálogo. O ministro que é primeiro apresentou o programa de governo e anunciou uma redução de 1 500 milhões de euros em IRS. Em relação ao valor de 2023. Um facto indesmentível. Como se defendeu o governo quando confrontado com a responsabilidade material da redução, ou da maior parte dela. 

Tão indesmentível como a tentativa deliberada de colar toda esta redução à atuação do novo governo. Tão inequívoca como o facto de o orçamento em vigor, oriundo do anterior governo, ser responsável por cerca de 90% dessa redução. E isto apesar da tentativa de clarificação, em debate parlamentar, não de um mas de dois deputados da Iniciativa Liberal. Ou dos esclarecimentos solicitados por um jornal como o Expresso que, após noticiar a duplicação da redução de IRS, sentiu a necessidade de publicar uma nota tão forte como rara, sob o título "É mais do que um embuste, É enganar os portugueses". 

Voragem dos tempos. Em que um programa de governo é apresentado e debatido quase de imediato. Em que os debates são comentados e discutidos ao vivo, tentando descortinar intenções de segunda e terceira ordem. Em que falta tempo para análise e reflexão. Para fazer contas e cruzar dados. Em que a viva voz é sobrevalorizada como construtora de realidades. Tempos de vertigem.

Mas podia não ser assim.

Imaginemos um governo alternativo. Com um primeiro ministro que anunciava que, para além da redução de IRS de 1 300 milhões proposta pelo anterior governo, aprovada pela Assembleia da República, e com a qual concordava, estaria em condições de ir ainda mais além, já, no imediato. Atingindo os 1 500 milhões. Mesmo sem necessidade de um orçamento retificativo, que pode ou não vir a existir. E sem prejuízo de incluir reduções adicionais no orçamento para 2025.

Humildade e diálogo. Como prática. Se for essa a intenção. 

Por mim, desconfio de quem apregoa virtudes próprias.

segunda-feira, 1 de abril de 2024

Crónicas da (inefi)ciência







Esta é uma crónica do que aconteceu e não devia ter acontecido. Em fragmentos. Tendo por referência uma linha de tempo traçada a partir da documentação pública. Para memória. Para as memórias. Para quem quiser ter memória.

22/12/2023. É publicado o aviso para apresentação de candidaturas de Projetos de Investigação Científica e Desenvolvimento Tecnológico. 

Uma primeira nota sobre o tempo. Sobre tempos. Tempo de candidatura, entre este dia vinte e dois de dezembro e o dia dezasseis de fevereiro. Em forma de letra no aviso. No papel. Mas só mesmo no papel. E porquê? Porque não está ainda disponível a plataforma de candidatura. Porque não está ainda disponível o guião de candidatura. Porque... Encolhendo o tempo. Encolhendo o tempo efetivo de candidatura. Estranho, não é? Também o tempo de publicação é estranho. Em vésperas de Natal, altura em que muitas instituições científicas têm uma atividade reduzida, senão nula. Encolhendo duplamente o tempo. Mas porquê, então? Qual a urgência? Não descortino muitas explicações plausíveis. Só uma, mesmo. Era preciso que o concurso "abrisse" em 2023, ainda que só entreaberto, ou até fechado. Era preciso proclamar a sua abertura. Era preciso colocar um visto num quadro de medidas políticas do ano que acabava. Cumprir metas. Cumprir calendário. Não cumprindo. Tempo real e ficcional. Tempo real e político. Da política como ficção. Da realidade fabricada. Para quem acreditar. No fundo, até parece não importar. Não despertou grande reação. Há fundos no horizonte. 

Uma segunda nota sobre os temas. Este costuma ser o principal concurso nacional de financiamento aberto a projetos em todos os domínios científicos. Mas desta vez são todos, todos?  

No texto que importa ler, são todos, desde que. São "(...) todos, desde que alinhados com as Estratégias de Investigação e Inovação para uma Especialização Inteligente (RIS3), que se proponham estimular uma economia de elevado valor acrescentado, bem como a excelência, a cooperação e a internacionalização, visando processos de inovação com finalidade de mercado e o aumento da criação de conhecimento para resposta a desafios empresariais e societais". É preciso fôlego para ler a frase. E estômago para a digerir. Questões de alinhamentos, propósitos e finalidades. Economia. Valor acrescentado. Mercado. Desafios empresariais e societais. 

Então os desalinhados ficam excluídos? Não! Também lá estão. Importa continuar a ler. Os alinhados beneficiarão de apoio através do FEDER. E os desalinhados de apoio de fundos nacionais inscritos no orçamento da FCT. Menos mal, que não ficam de fora. Mas mais complicado. 

Um concurso com financiamento através do COMPETE, PR Norte, PR Centro, PR Lisboa, PR Alentejo, PR Algarve, FCT. Cada um com a sua própria dotação inicial. Cada um, exceto a FCT, com estratégias próprias de especialização, a que chamam inteligente. Cada um com literatura associada para investigador decifrar no tempo que escorre. 

Uma terceira nota sobre fundamentos. Investigação. Investigação que se aplica. Investigação que se aplicará. Investigação que poderá vir a ser aplicada. Investigação que não se sabe se ou quando se aplicará. Futuros.

Nos termos do aviso, só "são elegíveis a financiamento FEDER as operações que apoiam projetos de investigação aplicada e inovação (...); de modo auxiliar e acessório, devidamente justificado, podem ser incluídas atividades de investigação a montante quando indispensáveis para a prossecução do projeto de modo integrado, não podendo ultrapassar 10% do investimento elegível". A que se segue uma outra alínea, dispondo que os projetos que não satisfaçam esta condição "serão passíveis de apoio ao abrigo do Regulamento de Projetos FCT.". 

Venha de lá a calculadora. Para dissecar o projeto a bisturi. Pesar percentagem de investigação disto ou daquilo.  Menos do que dez, mais do que dez. Seria normal que, num concurso desta natureza, fosse grande a porção de projetos com muito significativa de "investigação fundamental". O que, afinal tiraria todo o financiamento correspondente para a FCT. E retiraria execução aos outros fundos. Antevejo divisões imaginativas e percentagens criativas. Terei mais hipótese de financiamento por aqui ou por ali? Como será a concorrência? Antevejo avaliação e enquadramento à medida. Ainda há fundos desse lado? Seria melhor considerar esta como não fundamental? Antevejo dores de cabeça.

Teria que ser assim? Certamente que não. Seria possível ter um concurso financiado exclusivamente através do orçamento da FCT. Como habitual. Não sei é se tal tinha sido previsto, ou sequer equacionado. Não sei se tal constava do orçamento da FCT para 2023. Não sei se isto é apenas de um estratagema para mobilizar fundos de diferentes sacos. Para aumentar taxas de execução. Para maximizar o uso de fundos europeus. Para minimizar o uso de fundos nacionais. Para rapar fundos. Como medida de simplificação administrativa não foi, com toda a certeza. Como medida de agilização de processos, também não.   

05/01/2024. Duas semanas após a abertura.

Republicação do aviso de abertura. Já? Quinze dias depois da publicação original do aviso de abertura do concurso que, materialmente, continua por abrir? Pois é verdade. Para efetuar um "Ajustamento da redação do ponto “Consequências do incumprimento dos indicadores”" . Ficamos informados.

08/01/2024. Dezassete dias após a publicação do aviso.

Data que consta das Orientações sobre o funcionamento do Balcão dos Fundos, Utilizadores, Perfis e Unidades Organizacionais. Entidades beneficiárias. Super-utilizadores. Utilizadores internos. Perfis. Convites. Registos certos. Registos duplos. Registos incorretos. Registos impossíveis. A multiplicar por centenas. A multiplicar por milhares.

26/01/2024. Vinte dias para o prazo limite para apresentação de candidaturas.

Segunda republicação do aviso de abertura. Mais de um mês depois do primeiro aviso. Vinte e um dias depois da primeira republicação. A vinte dias do prazo limite para apresentação de candidaturas. Alterando desde logo o período de candidaturas. Dilatando o prazo. Data limite a 21 de março. Um adiamento não só previsível, como exigível, considerando todos os problemas existentes e que vinham sendo relatos. Plataforma. Balcão dos fundos ,m fundo. Falta de adaptação à natureza do concurso. Remendos. Dúvidas pertinentes por esclarecer.

Talvez por isso as alterações desta republicação são mais abrangentes, incidindo também sobre os pontos Legislação nacional, Condições específicas ou normas técnicas a observar pelas operações e pelos beneficiários – alíneas p), s), t), v) e w), Consequências do incumprimento dos indicadores, Legislação e regulamentação aplicáveis e Anexo A – 4. Regras e condições de elegibilidade das despesas

É exemplo a remoção das restrições que afastavam investigadores com processos anteriormente aprovados em "concursos da Fundação La Caixa com cofinanciamento e/ou patrocínio da FCT", de 2022 ou 2023. Limitações com efeitos retroativos. Duvidosas, à partida e à chegada. Lançando dúvidas sobre o efeito de outros concursos em curso. Envolvendo um financiador e financiamento privado. Agora eliminadas. Deve ter dado origem a conversas interessantes! E ainda uma nova versão das consequências de incumprimento. Outra do próprio quadro legal e regulamentar aplicável (!). Mais uma sobre a elegibilidade das despesas. Não é voltar ao início, mas quase! Revelador do processo em curso.

22/02/2024. Um mês para o final do prazo. 

Um documento com Questões Frequentes. Procurando responder às dúvidas que assolam mentes e entopem serviços e canais de atendimento. Vinte e duas páginas. Cento e sete questões. Um sinal sobre um aviso, já com duas republicações, e margem extensas para dúvidas. De leitura obrigatória. Com interpretações diferentes. Suscitando dúvidas entre o texto do aviso e o texto das respostas. Quando as questões frequentes se parecem substituir às normas.

12/03/2024. Nove dias para o final do prazo.

Terceira republicação do aviso de abertura! Com "Introdução do Organismo Intermédio e ajustamento na redação do Anexo A – 1. Documentos necessários para apresentar uma candidatura, no que se refere às condições da Minuta do Contrato de Consórcio". Ainda a alterar a lista de documentos exigidos. Sob pressão da comunidade. Passando a minuta de contrato de consórcio em projetos conjuntos, a ser facultativa, em lugar de obrigatória, ainda que "sem prejuízo do previsto na alínea n) das Condições específicas ou normas técnicas a observar pelas operações e pelos beneficiários". Em regulamentês profundo. 

15/03/2024. Seis dias para o fim. 

Sai uma versão modificada do documento com questões frequentes. Desta vez com novos elementos sobre sobre os indicadores a usar para os projetos! Indicadores como empregos criados (em projetos desta natureza...), número de organizações de investigação que participam (já inserido em campos da candidatura...), patentes e publicações. Procurando clarificar como se determinam. No início do fim. Serão reais? E se a candidatura já tiver sido submetida? 

21/03/2024. Fim do período de submissão de candidaturas. 

A lista final de documentos do concurso, na página respetiva do sítio da FCT, é a seguinte: 

  • Aviso de Abertura do Concurso - republicação 12/03/2024
  • Aviso de Abertura do Concurso - republicação 26/01/2024
  • Aviso de Abertura do Concurso - republicação 05/01/2024
  • Aviso de Abertura do Concurso
  • Regulamento Específico da Área Temática Inovação e Transição Digital (REITD)
  • Regulamento de Projetos Financiados Exclusivamente por Fundos Nacionais da FCT
  • Guia - Equivalente a Tempo Integral (ETI)
  • Documento Metodológico OCS
  • Timeline
  • Validação Enquadramento ENESII
  • Orientações sobre o funcionamento do Balcão dos Fundos, Utilizadores, Perfis e Unidades Organizacionais
  • Apresentação da sessão de esclarecimento
  • Guião de Candidatura
  • Guide for Peer Reviewers
  • FAQ
  • FAQ - atualizadas as 15/03/2024.

Post-mortem. Um processo que começou mal. E que decorreu mal. E que não se sabe como acabará. Agora com a verificação de elegibilidade das propostas. Eventualmente com reafetação de propostas entre programas de financiamento, à medida das medidas de investigação fundamental, ou da adequação inteligente que tiver sido efetuada, com mais ou menos criatividade. Só depois a avaliação, a lista de resultados, os eventuais recursos, a lista final e a concessão de financiamento. Episódios de uma temporada.

Duvido que se avalie o que correu mal, porque correu mal, e os custos de tudo isto. Duvido que se queira. Ainda que fosse no mesmo ciclo político. Menos ainda na conjuntura atual. Um caso sem lições para o futuro. Um caso com custos elevados.

Custos em tempo, de cada um, não renovável, irrecuperável. Difícil de quantificar. Mas imaginemos que foi desperdiçada uma manhã em cada candidatura submetida, devido ao relatado e mais. Não me parece exagerado, entre as tentativas de decifrar as instruções do concurso, problemas de registo, problemas com a plataforma, dúvidas e incertezas, informações contraditórias, começar e recomeçar. Não estou sequer a contabilizar os gabinetes de apoio das instituições de investigação, das várias entidades envolvidas na gestão dos fundos, e dos apoios informáticos. Nem as candidaturas que ficaram pelo caminho. Ainda não sabemos quantas candidaturas foram submetidas, o que não deixa de ser estranho. Mas admitamos que foi apresentado o mesmo número que no concurso anterior, ou seja, 2695. Meio dia de trabalho por cada uma corresponde a 1347 dias de trabalho perdidos. Concentrando este tempo numa pessoa são, a 220 dias de trabalho por ano, são mais de 6 anos perdidos! 

Este, ou qualquer outro número que se apurasse num exercício de avalição de políticas públicas, seria o custo direto. A que se soma o custo de oportunidade. Com o que deixou de poder ser feito. Com o que deixou de poder ser pensado. Com o que passou a ser feito sobre pressão acrescido. Agravado pelo desgaste e pela sensação da falta de razoabilidade e de sentido em tanto disto.

A abordagem desastrosa e desastrada não se resolve, simplesmente, com uma reorganização da FCT, como a que pontuou os recentes programas eleitorais dos principais partidos. Simplesmente, ainda que nem esteja seja simples. A questão está a um nível superior. Em decisões sobre fundos e financiamentos. Objetivos e critérios. Na opção entre investigação com qualidade de investigação de nível internacional ou uma investigação regionalizada. Em decisões sobre os tempos necessários para preparar os processos. Em fazer de conta que se abriu um concurso ou abri-lo de facto. Em decisões sobre os recursos necessários. Em compreender a realidade. 

Imagino. Um pouco mais. Um concurso anual. Com uma orientação estratégica e uma calendarização estável. Com planeamento da execução dos fundos disponíveis. Com regras e procedimentos conhecidos em tempo útil, bem antes de o mesmo abrir. Imagino. Quem em 2024 saberemos as regras dos concursos para 2025 e 2026. Possibilitando o planeamento da atividade de milhares de pessoas. Com plataformas de candidatura testadas, envolvendo a comunidade se necessário. Eliminando remendos e improvisos. Ganhando tempo.

quinta-feira, 7 de março de 2024

Políticas para o Ensino Superior e Ciência - CHEGA

Imagem do jogo Alma Mater, Eggert Spieler

 






Última entrada. É o fim. CHEGA.
A área do ensino está num capítulo designado "Libertar o Ensino de Ideologias. Como?". A ideologia da não ideologia como ponto de partida. A neutralidade, aqui não carbónica, mas ideológica. Talvez asséptica. E como, então? No ensino superior são sete as medidas. Vejamos.
Avaliar o número de instituições e cursos, assim como o número de alunos em cada curso e as saídas profissionais dos mesmos, em coordenação com a A3ES e sendo essa informação pública. A informação sobre os números existe, e é de fácil consulta pública. Restará então a avaliação do número. Com que critérios? A introdução dá uma pista, ao falar do sobredimensionamento leia-se em instituições e cursos, do ensino superior português. Uma posição de partida. Ideológica? Não estou certo. Mas recorda-me outros mitos em redor de números mágicos. Que me faz recuar a uma entrevista e a mais outra entrevista, na transição de 2011 para 2012.
Combater o subfinanciamento crónico nas instituições de Ensino Superior e cursos considerados estratégicos, devendo cada universidade, politécnico ou instituto universitário elaborar e cumprir, no decurso da própria legislatura (...) o seu próprio plano de reequilíbrio estrutural em termos de gestão de recursos humanos e financeiros. Não percebi! Combater o subfinanciamento implicará aumentar o financiamento. Seria uma forma de equilibrar as coisas. Mas competirá às instituições efetuar um reequilíbrio estrutural. Para se adaptar ao financiamento insuficiente? Ou para se adaptar à abundância? Ou o novo financiamento será fruto do novo equilíbrio apresentado por cada instituição. Confuso. 
Valorizar cada vez mais o critério da qualidade científica, académica, técnica e empregabilidade das formações ministradas. Quem valoriza? Para que fim? Como? 
Mais duas medidas. "Isentar totalmente do pagamento de propinas para alunos a frequentar estágios profissionais obrigatórios em cursos do Ensino Superior transversal a todas as áreas de estudo" [sic] e acabar com as taxas de admissão e emolumentos para prestação de provas de doutoramento. Medidas que parecem relativamente consensuais, embora com algumas nuances, entre as várias forças partidárias.
"Obrigatoriedade de canais de denúncia de assédio moral e sexual nas instituições de ensino superior" e "informação sobre acesso a apoio psicológico e/ou jurídico".
Vão seis das sete medidas. Libertadoras de ideologias? Até agora não. Mas há mais uma! "Introduzir o princípio da despolitização e despartidarização das instituições de ensino superior para garantir a sua autonomia, liberdade intelectual, qualidade e prestígio". Mas o que quer isto dizer? Especialmente, uma vez mais, quando lido em conjunto com a introdução, onde se escreve "Existem instituições do ensino superior que todos sabem que são conotadas com uma identidade partidária identificável. Continuando, após exemplificar, "Pode um jovem ser intelectual e verdadeiramente livre em contextos de condicionamento partidário tão evidente". Partindo de uma conotação, conhecida aparentemente de "todos", passamos para o perigo terrível sobre os "jovens", vítimas de condicionamento partidário.
Despolitizar e despartidarizar no mesmo saco. A política com má conotação. Vindo de um partido... político. E, contudo, sem qualquer proposta de medidas "libertadoras" das ideologias. Naturalmente! Pois quais seriam elas? Censurar programas onde se detete qual grão ideológico? Vigiar as aulas? Vedar cargos de gestão académica por se ter filiação partidária? Vedar cargos políticos a académicos para separar os mundos? Ajuizar do caráter em entrevistas de seleção para o emprego? Cercear outras liberdades, como as da livre escolha dos órgãos no seio da academia? 
Fantasmas e assombrações. Esqueletos e espantalhos. Agitados ao vento. Sem concretizar como se resolveria problema tão gravoso.
Leio um dicionário online. Discurso ou ação que visa manipular as paixões e os sentimentos do eleitorado para conquista fácil de poder político. A palavra assim definida é Demagogia.
Fim.

quarta-feira, 6 de março de 2024

Políticas para o Ensino Superior e Ciência - PAN

Imagem do jogo Alma Mater, Eggert Spieler

 






Penúltima entrada. O PAN.
O programa nesta área não é muito extenso. E também não é concreto.
"Garantir atempadamente dotações adequadas para as necessidades de funcionamento e desenvolvimento das Instituições de Ensino Superior". Dotações adequadas. Atempadamente. Necessidades. Desenvolvimento. Tudo em aberto.
Quanto a propinas, "concretizar progressivamente a gratuitidade do 1.º Ciclo de estudos no Ensino Superior". Progressivamente. Na legislatura? E aqui fica mais aquém da maioria das propostas similares que, no mínimo, abrangem também os Mestrados Integrados, essa originalidade híbrida. Também advoga, como outros, a eliminação de taxas e emolumentos, mas também aqui de um modo mais restrito, apenas para a admissão a provas de doutoramento.
Em matéria de residências, há pontos em comum com outros programas, embora sem metas ou quantificação. Aumentar o número de residências, acordos com o poder local, reabilitação de edifícios vazios.
Quanto ao acesso, "Rever o modelo de acesso ao Ensino Superior, não o centrando exclusivamente em resultados académicos". Pois. A IL também o defende. Mas apresentando sugestões do que este descentramento poderia significar. Ainda que discutíveis. Aqui, nada mais. Ficará para depois.
Em relação aos docentes, defende a abertura de concursos para docentes convidados cujo serviço letivo corresponda a necessidades permanentes. Parece-me bem. Também propõe a eliminação da precariedade dos vínculos laborais do ensino superior, mas sem desenvolver o conceito. E ainda, "clarificar os critérios de progressão remuneratória mínima dos/das docentes do ensino superior público, eliminando as situações de injustiça criadas por aplicação díspar entre instituições". Incidindo apenas sobre a progressão remuneratória, e não abordando as questões da carreira, ou melhor, das carreiras.
Em relação às bolsas, preconiza a substituição de bolsas de pós-doutoramento por contratos de trabalho. Mais cirúrgico do que outras propostas. Mais fácil de alcançar no curto prazo. Talvez de impacto mais reduzido, mas a fazer sentido, sobretudo quanto tantos apregoam a importância da inserção dos doutorados no mercado de trabalho.  
Quanto a ciência, mais medidas apenas se parece encontrar em áreas temáticas. Apoiar a investigação de novas fontes de energia, fomentar projetos no domínio da conservação da biodiversidade, criar um centro de investigação com recursos alternativos aos animais utilizados para fins científicos, promover a investigação na área da inteligência artificial e da ciência de dados na saúde. Pouco.
Na reta final, com apenas um pela frente.

terça-feira, 5 de março de 2024

Políticas para o Ensino Superior e Ciência - CDU

Imagem do jogo Alma Mater, Eggert Spieler

 






Episódio seis. Em Coligação Unitária.
Apesar da coligação unitária ser dual em termos de programas, apresentado o programa eleitoral do PCP e o manifesto ecologista do PEV, na prática, e pelo menos para esta matéria, é suficiente ler o programa do PCP.
Começando pelos dinheiros do ensino superior. Uma "Lei de Bases do Financiamento que inclua a componente I&D e assegure às IES as condições humanas e materiais adequadas ao seu financiamento". Demasiado vago, exceto quanto à inclusão da componente de I&D, e não apontando qualquer caminho. Condições adequadas. Subjetivo. Quer quanto às condições, quer quanto ao que se qualifica como adequado. Eliminar o pagamento de propinas, taxas e emolumentos. Concreto, e como vem defendendo há muito.
"Defender o caráter unitário do Sistema de Ensino Superior Público. Presume-se que eliminando o cariz binário do mesmo. Talvez tendo todas as instituições como Universidades. Não sendo claro o que se pretende alcançar ou que problema se pretende resolver. Talvez a noção de uma certa hierarquia, pelo menos de prestígio, entre universidades e politécnicos. No âmbito da revisão do RJIES, que parece não satisfazer ninguém, revogar o regime fundacional.
"Criar incentivos e mecanismos para fomentar a interação entre as IES, os Centros de Investigação, os docentes e os investigadores com diferentes áreas e sectores da sociedade, suscitando o livre debate e esclarecimento sobre as questões cruciais que hoje se colocam à prossecução do progresso e equidade social". Incentivos e mecanismos. Não me parece que haja falta de debate, ou de espaços para o mesmo, nos mais variados setores e com as mais variadas geometrias. Acolhidos dentro, e sobretudo fora, das academias. Em projetos conjuntos, também. Não me parece que seja um questão de inventivos. Não me parece que seja uma questão de esclarecimento. Há visões de futuro diferentes. Há caminhos distintos, até opostos, para fazer face aos problemas. 
Combater a precariedade. Integrar falsos docentes convidados e outros precários que respondem a necessidades permanentes. De acordo. São abusos. Espera-se que tal não se defenda para os verdadeiros docentes convidados e situações temporárias, que não correspondem, de todo, a necessidades permanentes e têm o seu papel próprio.
Na ciência, "criar um Fundo para a Inovação Tecnológica Empresarial, financiado pelas empresas, de acordo com uma métrica já definida. Aumentar o financiamento de base dos Centros de Investigação. Volto atrás para reler. Mas nos casos do financiamento do ensino superior, este já incluiria a componente de I&D... Em que ficamos? 
Duplicar a despesa em Investigação e Desenvolvimento Experimental per capita de investigador ETI no setor público e adequar as normas da contratação pública". E esta, é por que via? Projetos, embora se pretenda reduzir a dependência dos concursos? Diretamente às instituições? Através das unidades de investigação? Falta definição, com o risco de parecer incoerente.
E ainda reforçar a rede de centros de investigação, criando as condições necessárias para a plena integração dos institutos politécnicos no SCTN". É este o significado do reforço da rede? E não ficaria resolvida com o caráter unitário do sistema de ensino superior?
Aumentar também o número de doutorados no setor público, incluindo as empresas públicas, e nas empresas a nacionalizar. Aumentar o número de doutorados porque sim, porque isso reduz o desemprego dos doutorados, porque se traduz numa mais valia, porque é uma necessidade efetiva de um conhecimento especializado e de um modo específico de produzir conhecimento? É que nem todas estes motivos se aplicarão a todas as empresas e a todos os setores.
Também aqui se preconiza a clarificação da missão dos Laboratórios de Estado e a "reavaliação" da estrutura e modo de funcionamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Ou o fim dos contratos de bolsa e a sua substituição por contatos de trabalho. Continuo a achar que há lugar para verdadeiras bolsas, limitadas no seu âmbito e duração. E que dependendo da natureza de outras tarefas, subordinadas ou não, pode ser adequado um contrato de trabalho ou uma verdadeira prestação de serviços. 
Também aqui se fala de mais carreiras, mas apenas "eventualmente a criar, nomeadamente os gestores e comunicadores de ciência e tecnologia, os técnicos de apoio à investigação, os operários especializados e prototipistas.".
Tudo isto num quadro de uma "Política de Ciência e Tecnologia que atenda às necessidades e especificidades da economia nacional, valorize a investigação fundamental livre (...) e que garanta um financiamento base, estrutural e de desenvolvimento da Ciência não dependente em exclusivo de concursos competitivos".
Só mais dois.

segunda-feira, 4 de março de 2024

Políticas para o Ensino Superior e Ciência - LIVRE

Imagem do jogo Alma Mater, Eggert Spieler

 






Quinto texto. Em roda Livre.
O programa apresentado para o Conhecimento, Ciência e Ensino Superior contém 36 medidas, na sua grande maioria com maior grau de pormenor em relação aos outros programas. Agrupadas em torno de três eixos, Estabilidade do Sistema Científico e Tecnológico, Ensino Superior, e Ciência e Sociedade, contém ampla matéria para reflexão, concordância, e discordância!
Sobre o Ensino Superior, começa por preconizar o fim das propinas do 1.º ciclo e parte curricular do 2.º ciclo, regulando as restantes, para as quis propõe "um processo de redução progressiva do seu montante, de acordo com padrões europeus". Bem, o plural é bem empregue, porque há situações muito diversas na Europa, o que deixa aqui alguma ambiguidade, apesar de se entender que o caminho é descendente.
Em matéria de alojamento é mais vago. Rever o Plano, envolver os vários agentes da área. Também aqui se menciona a "conversão de edificado público em Residências Estudantis" e o reforço da dotação orçamental para Autarquias e Universidades, com esta finalidade.
Numa vertente que tem ganho expressão nos programas e nas políticas, defende a "existência obrigatória de Gabinetes de Apoio Psicológico em todas as unidades orgânicas com autonomia administrativa e financeira das Instituição de Ensino Superior". Tenho sempre dúvidas da virtude destas medidas administrativas, tendo aqui por critério o estatuto das unidades, e impedindo soluções integradas e de geometria variável.
O tema da designação das instituições de ensino politécnico ganha visibilidade neste programa, inserido num parágrafo sobre a internacionalização. A questão aqui parece ser de nome. E não tenho a certeza de isto estar articulado com uma outra medida, dissonante, mas que merece ser discutida, "a revogação do artigo (...) que estabelece a natureza binária do ensino superior". É que em termos de instituições, há muito que o sistema deixou de ser binário, com universidades integrando escolas politécnicas. 
As carreiras estão no centro de várias medidas, de forma explícita. Fusão das Carreiras Docentes do Universitário e do Politécnico. Integração de carreiras docentes e de investigação num mesmo estatuto, de forma a facilitar a mobilidade entre carreiras e instituições, e uma gestão mais integrada das atividades e cargas de docência e de investigação. 
Criar a carreira de Gestor de Ciência e Tecnologia. Muitas em relação a esta última, que, exercendo atualmente funções de gestão e de ciência e tecnologia, enquanto técnico superior, já exprimi em sede própria. A questão não é da carreira em si, mas das carreiras em si. Iremos ter também carreiras de contabilistas, juristas, engenheiros, arquitetos, etc., etc., nas instituições de ensino superior? Cada uma com as suas especificidades? Ou estas seriam carreiras destinadas apenas a doutorados, como forma de reduzir a pressão em termos de emprego? É que doutorados não fazem necessariamente bons gestores... A carecer de detalhe. 
Uma menção à endogamia. Mas uma medida que não convence. "Incentivos à contratação de docentes convidados com formação noutras Instituições (...) e à mobilidade docente.". A questão de fundo não é dos convidados, nem se resolve com convidados. 
Rever o Estatuto do Bolseiro de Investigação, impondo limites, e não uma revogação, como proposto pelo BE. Mas aqui os limites são temporais. Não mais do que dois anos. Sendo que para programas de maior duração, como os de doutoramento, seriam objeto de contrato de trabalho. Uma proposta significativamente diferente.
Financiar as instituições do ensino superior de forma estável e permanente. através de financiamento público (...) através de contratos programa. (...) fórmula baseada em indicadores de estrutura e de desempenho, destinada a suportar as despesas de funcionamento e infraestruturas, com dotações atribuídas por concurso, destinado a implementar projetos e estratégias locais alinhadas com o perfil institucional e com as necessidades de desenvolvimento do país e da região". E mais à frente "Financiar a contratação permanente de pessoal."
Confesso que estou confuso. Pode ser da redação. Será uma fórmula para as despesas fixas e concursos para os projetos e estratégias? Para a contratação permanente de pessoal seria um programa específico, que depois se converteria, mais à frente, em despesa de funcionamento? E este cariz local/regional, quando o conhecimento e a mobilidade são globais, não limita o desenvolvimento, em vez de o promover?
A revisão do RJIES é um dos temas que parece ser consensual. Aqui visando a "democracia plena nestas instituições, designadamente através da obrigatoriedade de eleição direta pela Comunidade Académica dos órgãos de natureza deliberativa, fiscalizadora da atividade executiva, e pedagógica, da paridade entre docentes e discentes na composição destes órgãos, e da representação obrigatória dos docentes, estudantes e trabalhadores em todo os órgãos". Muito para discutir. Começando pelo fim, uma distinção entre docentes e trabalhadores, que continua por ultrapassar. Sinais. Eleição direta como em 1 pessoa, 1 voto? Comunidade académica como em estudantes e trabalhadores? Paridade entre docentes e discentes basicamente em todos os órgãos? 
Uma outra preocupação manifestada, num elevado número de ações, é a atratividade e oferta formativa na área do ensino. Incluindo bolsas de mestrado em ensino, introduzindo a possibilidade de estudantes finais de licenciatura possam frequentar seminários dos mestrado em ensino, bolsas de doutoramento, ou aspetos mais contraditórios como incluir indicadores associados a estes mestrado nas avaliações das unidades de investigação associadas a instituições universitárias. A situação é crítica, a imaginação é fértil, mas ponderação é precisa.
Quanto à FCT vai mais longe do que as críticas e intenções gerais, apresentando uma estrutura com algum pormenor para a organização da mesma. 
E há mais, porque 36 medidas explicadas são muitas. Como um gabinete de apoio científico à atividade legislativa da Assembleia da República. Ou a criação de uma Agência Nacional para a Inteligência Artificial. Talvez precise de reler.
Ainda faltam mais três.

domingo, 3 de março de 2024

Políticas para o Ensino Superior e Ciência - IL

Imagem do jogo Alma Mater, Eggert Spieler

 






Quarto episódio. Agora com Iniciativas Liberais. 
Desta vez não figura a meta de 3% do PIB para o investimento em ciência. A IL também defende o aumento do investimento público, aqui em conjugação com a potencial relevância do mecenato científico. Curiosamente, e para além do mecenato, que tem a atratividade dos benefícios fiscais associados, não se refere ao investimento privado, das empresas e da economia "real", numa estratégia própria e necessária de desenvolvimento e competitividade. 
Sobre a autonomia, um tema que por vezes paira nas agendas, mas que até agora não tinha ainda encontrado tão claramente num programa. Permitir que as Instituições de Ensino Superior definam os seus métodos de admissão, por exemplo ao "complementar os Exames Nacionais e as notas médias de fim de ciclo com outros formatos de avaliação como testes de aptidão, testes vocacionais, cartas de motivação e/ou cartas de recomendação, portfólio do aluno, eliminando a obrigatoriedade da dependência única das avaliações do Ensino Secundário." Aparentemente, será sempre um complemento e não uma substituição integral. A requerer uma mudança profunda das instituições que não estão dotadas de capacidade de seleção, da articulação entre calendários do secundário, de candidatura e do ensino superior, dos candidatos e da sua envolvência, desdobrando-se em candidaturas múltiplas com critérios distintos. Introduzindo novas variáveis suscetíveis de provocar novos desiquilíbrios, como as cartas de recomendação. A requerer uma proposta integrada que clarifique mais. Sim, em conjunto com a criação de cursos, este é uma das dimensões em que a autonomia em Portugal é escassa. Fica por referir qual o objetivo fundamental a alcançar por este alargamento da autonomia.
Um financiamento do estado com critérios "baseados no crescimento das instituições, nomeadamente o número de alunos". Parece um daqueles mitos, o do crescimento eterno, isento de limites. Um dos problemas de fórmulas de financiamento anteriores foi, precisamente, que elas não se encontravam preparadas para diminuições, seja de orçamentos globais, seja institucionais. Mais à frente parece emendar a mão, referindo-se um financiamento "tendo em conta o número de estudantes servidos por cada  instituição, entre outros fatores". 
Em relação à habitação estudantil, uma reforma dos licenciamentos, lógicas de PPP em que os privados constroem e operam em terrenos detidos pelas instituições de ensino superior, concessão para a gestão das residências dos Serviços de Ação Social, e a possibilidade de uso de vouchers por estudantes com menor capacidade financeira. 
Quando à governação a IL preconiza que "O modelo de Governo deve ser liberalizado", uma vez que as "instituições de ensino superior são obrigadas a seguir o mesmo modelo de Governo, independentemente da contribuição do Estado para o seu orçamento". Nada mais se adianta, ficando por esclarecer qual a ligação ente financiamento e modelo de governo, não se tratando aqui de acionistas, qual o significado da amplitude da dita liberalização, a quem compete a definição do mesmo, dadas as características e populações de uma organização peculiar como são as universidades.
Também uma nota sobre a burocracia e a necessidade de reformar a Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Salvo lapso de leitura, não identifiquei referência explícita ao papel do ensino superior privado. Nada sobre propinas, nem num sentido nem noutro. Nada também sobre carreiras docentes ou de investigação. 
Ao longo do programa, há outras referências ao ensino e investigação, como a independência orgânica e jurídica das escolas de negócios, ou interfaces com o tecido empresarial articuladas com, mas sem estar na dependência das, universidades. Talvez valha a pena discutir o conceito de Universidade, e de Escola, qual o uso próprio destas figuras, onde estão os recursos que as fizeram e fazem, se devem estar integradas ou se são criaturas distintas, para todos os efeitos e não apenas para alguns.
4 lidos, 4 por ler.